Há apenas cinco meses à frente da Wunderman no Brasil, Pedro Reiss afirma que está animado com o desafio. O publicitário, que tem toda uma carreira ligada à tecnologia – era co-CEO da F.biz, onde ficou por 17 anos –, pontua que uma agência tem de atuar para além da comunicação. “Hoje, a Wunderman pode atuar em um monte de coisas que têm a ver com transformação digital, que não têm necessariamente a ver com marketing”, diz o novo CEO da agência, que atende marcas como Vivo, Cielo, Dell, Shell, Audi e Via Varejo. Ele destaca que, embora esteja mais seletivo para entrar em processos de concorrência, a Wunderman participa de algumas disputas e em breve deve anunciar novas contas. Nesta entrevista, Reiss também fala sobre temas como valor das agências, modelos de remuneração e gestão de talentos. Confira os principais trechos a seguir.

Marçal Neto/Divulgação

REVOLUÇÃO
Estou muito animado. Passados quatro meses, eu entendo mais da operação, conheço mais as pessoas e os clientes. Eu tenho muita segurança na proposta de valor que a Wunderman está construindo. O nosso CEO global, Mark Reed, já era meu chefe na F.biz. O Mark está fazendo uma revolução. Ele está construindo a maior rede digital do mundo, com foco nas coisas digitais, mas sem ser tático. Acho que a maior dificuldade das agências digitais é que ficaram táticas demais e o Mark tem uma proposta de valor muito clara. Agora ela está traduzida em torno de um posicionamento que eu gosto muito, que é o Are you future ready? Esse questionamento, Você está pronto para o futuro?, vale para mim, para meu time e clientes. Acho que é uma atitude muito boa, de estar tentando se preparar para uma coisa que não sabe o que é.

PRÁTICA
A gente está descobrindo na prática o que isso tudo significa. Eu tenho uma visão muito clara de como a gente tem de organizar isso aqui. Acho que no passado as agências organizaram todo o seu trabalho em torno de campanhas. E o input principal da campanha era o briefing do cliente. Eu acho que, por princípio, essa orientação à campanha faz com que as agências estejam sempre muito atrás dos seus clientes. Acredito que cada vez mais essa orientação é em torno da experiência do cliente. A campanha é um pedaço. A experiência de um aplicativo ou serviço é outro. O relacionamento é outro. Acho que isso muda tudo. Aqui, o que a gente está tentando fazer é sair de trás do briefing, tentando desenvolver um trabalho em que o consumer experience seja o centro da nossa proposta de valor. Em vez de trabalhar sempre atrás de um briefing, a gente está trabalhando em cima de um diagnóstico.

DESAFIO
O desafio é você estar no passo do seu cliente, estar atuando naquilo que é importante para ele, de verdade. Nem atrasado, nem muito adiantado. Para mim, estar pronto para o futuro é de fato colocar essa experiência do consumidor no centro. Mas há ainda um milhão de pratos. Toda estrutura comercial de uma agência está ligada a campanhas. Se você fala que a campanha não é mais o centro do que você faz, tem de mudar a forma que você vende, a forma que você cobra, que contrata. Os clientes falam que querem coisas diferentes, mas as concorrências são todas para a mesma coisa. Ou ele fala que quer uma coisa diferente e está disposto, mas quando chega num departamento de compras, volta para as campanhas, comissionamento de mídia, time sheet. Tem um ecossistema todo que força as agências. Meu desafio é sair disso. Essa é a proposta de valor da Wunderman que eu estou muito encantado de colocar de pé. Fora do Brasil, a Wunderman tem muitas coisas de dados, de analytics, comércio eletrônico, enfim, tem muitos recursos além da campanha. São 450 funcionários no Brasil.

PROSPECÇÃO
Esse é um momento novo aqui. Temos uma carteira boa de clientes. Acho que nas próximas semanas devo anunciar uma ou duas contas novas. Tenho muitos negócios para desenvolver dentro dos nossos clientes. Olho para todos os meus clientes hoje e em vários deles há oportunidades de crescimento. Estamos olhando para fora, mas estamos olhando para dentro também.

TRANSFORMAÇÃO DIGITAL
Hoje, a Wunderman pode atuar em um monte de coisas que têm a ver com transformação digital, que não têm necessariamente relação com marketing. A gente tem projetos ligados a automação, autosserviço e transformação de processos dentro dos nossos clientes, que não são necessariamente projetos de marketing. O comércio eletrônico está transformando tanto as empresas e esses projetos não são verbas de marketing. Tem um monte de verba, TI, marketing, operação. Eu rejeito um pouco esse olhar de que o cliente é tão grande quanto a sua verba de mídia. Acho que já foi esse tempo. As disciplinas pra mim estão ligadas à comunicação, mas estão ligadas também a tecnologia, dados, analytics, automações de todos os tipos e à criatividade para além da comunicação. Talvez outro equívoco das agências é entender a criatividade como uma disciplina de comunicação. Eu acho que o que as agências sabem fazer, da forma criativa, tem um valor muito maior que só a comunicação. Digo até que talvez por só ter entregue isso na forma de mídia no passado, as agências deixaram de valorizar aquilo que elas têm de mais especial e hoje faz falta nesse mundo que a tecnologia dá acesso igual para todo mundo, que é saber contar uma história diferente.

CAPACIDADE
A capacidade de aporte que uma agência tem para os clientes é muito grande. Se a gente não se limitar a olhar só para a comunicação e olhar para todos os problemas desses clientes, as agências podem aportar em muitos lugares. É que ainda não achamos modelos para isso. Aqui eu acho que estou encontrando. É o momento de o mercado descobrir quais são os modelos para poder atuar além da comunicação.

MÍDIA
Se a mídia é uma forma de ganhar dinheiro, não significa que eu só preciso fazer mídia. Posso ganhar dinheiro com mídia, através de comissionamento. Posso ganhar dinheiro com projetos, com fee, revenue share. Esses são formatos comerciais. O que eu entrego pode ser muitas outras coisas. Eu acho, por exemplo, que tem pouca gente olhando para coisas cross canais. É um lugar que as consultorias estão tentando entrar. E entram muitas vezes. Mas os consultores não têm a entrega concreta que resolve boa parte dos problemas, as agências têm. Nesse sentido acredito que a gente se limitando perde um pouco a chance de impactar os clientes com modelos mais interessantes. Hoje estou testando muitos modelos diferentes aqui. Existiu um tempo em que o cliente que não chegasse com uma verba de veiculação grande não interessaria. Para mim, não é mais isso. O cliente que tem um problema claro que a gente consiga atuar nesse problema e definir o quanto vale o nosso trabalho para ele por conta dessa solução é um bom cliente.

VALOR
Nós trabalhamos, o nosso trabalho gera valor e temos de ser remunerados por isso. O modelo para isso? Tanto faz. Muito ainda é comunicação, a mídia tem um papel grande e vai continuar tendo. Mas eu não quero ser uma agência só de comunicação. Acho que esse é o ponto. A gente faz muita mídia online, bastante mídia offline. Por meio de parceiros, também fazemos eventos, várias coisas de ativação. A gente tem tecnologia aqui dentro com muito trabalho de dados, pesquisas, mapeamento de jornadas, design de serviços, um monte de coisa. Existe um mundo de comunicação tradicional de agência, mas tem um universo de tecnologia de dados e de novos serviços ligados à transformação digital que eu acho que é um e negócio maior até futuramente. Mundialmente, a Wunderman tem mais de novo mil pessoas. É a maior rede digital dentro do Grupo WPP, que é o maior grupo de comunicação do mundo. É um negócio que sempre foi muito ligado à tecnologia. De 25% a 30% das pessoas que trabalham na Wunderman são especialistas em tecnologias e trabalham com Adobe, Salesforce, Google e Oracle. É um formato diferente de agência, sendo a comunicação e a mídia, um pedaço.

TALENTOS
Elenquei prioridades quando cheguei aqui e minha prioridade número um é a retenção de talentos. Acredito muito em gestão de carreira. Quando ouço pessoas falando que querem sair de agência para trabalhar em empresa, tenho vontade de morrer. Agência é uma empresa. Eu não conheço outro mercado em que pessoas sejam tão importantes para o negócio quanto o mercado de agências. E, por algum motivo, as agências cuidam muito mal desse assunto. Quero que as pessoas cresçam e se desenvolvam aqui dentro. E, como consequência, vão ficar. O turnover aqui está muito mais alto do que eu gostaria. Fiz uma meta de redução de turnover para a metade no primeiro ano. Estou superfeliz, porque em janeiro a gente teve o menor turnover dos últimos três anos. Acho que estamos no caminho certo.

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