Diversas agências estão rediscutindo as formas de atuação do setor de planejamento em um mercado que é bastante diferente daquele de alguns anos atrás. Como parte de uma série especial de reportagens sobre as transformações dos principais departamentos das agências, a reportagem de PROPMARK foi entender com profissionais do setor os fatores que estão impactando o futuro do planejamento. 

A tecnologia e o digital trouxeram novas necessidades, uma delas a da comunicação com capacidade de responder rapidamente às circustâncias que, definitivamente, saíram do controle de quem cria uma campanha para as mãos dos consumidores. Em paralelo, o advento de players como consultorias e empresas de tendências faz com que o diferencial do planejamento da agência se consolide na visão estratégica e integradora.

Um dos movimentos nesse sentido é da Leo Burnett Tailor Made, que, após dois anos de busca pelo modelo ideal, apresenta sua solução, ajudando a explicar em parte a transformação do setor. O planejamento da agência está unificando as áreas de estratégia e business intelligence, esta, atrelada à mídia anteriormente. Com as mudanças, o departamento de estratégia vai, além de agrupar informações dos clientes e mercado, passar a fomentar diariamente o trabalho de todas as áreas da agência, sob o comando de Tiago Lara, vice-presidente de data&strategy.

“Acredito que os líderes da geração atual começaram a entender que o planejamento tradicional, que organiza e gerencia a comunicação, dá espaço a uma área mais ácida e provocadora que busca dar sentido, razão, base e justificativa a tudo. Num cenário com muitos concorrentes como as consultorias, um dos diferenciais é ter uma visão estratégica e integradora. Ser ‘problem hunters’ (‘caçador de problemas’) e não apenas ‘problem solvers’ (‘resolvedor de problemas’). Se não formos incômodos, entendo que não temos papel”, analisa Lara.

A convergência entre BI e planejamento é uma tendência natural do mercado, para integrar processos racionais e resultados concretos. Hoje, segundo os entrevistados, o perfil valorizado para o planejador é o daquele capaz de pensar a gestão da marca e a estratégia de comunicação num contexto mais amplo de negócios. E esse profissional tem encontrado espaço até mesmo fora das agências, nas consultorias, anunciantes e veículos. As competências, da mesma forma, também estão mudando. “O planejador de hoje precisa entender profundamente de novas mídias, de tecnologia e as possibilidades de conexão que ela pode favorecer. Tem de estudar UX (user experience) e se aprofundar na usabilidade do produto e serviço. O planejador deve também ter metodologias de trabalho colaborativas e ágeis, de maneira que possa definir o longo prazo, mas ser rápido e eficiente para propor mudanças de rota o tempo todo. E avançar no entendimento das possibilidades que o big data oferece no entendimento do negócio, insights e business intelligence”, reflete Gabriela Soares, diretora-geral de planejamento da Talent Marcel.

Divulgação

Além do insight
O escopo de trabalho do planejamento está crescendo e o trabalho que antes terminava na criação de um insight poderoso, hoje, tem nessa etapa o começo de uma longa estratégia que pode desembocar em campanhas, mas também conteúdos em redes sociais, criação de serviços e experiências interativas. “Os dados, pesquisas, estudos que antes eram usados apenas no início da construção do pensamento estratégico agora são ferramentas fundamentais para o acompanhamento de toda a execução criativa da estratégia e para retroalimentar novas diretrizes, correções de rota e aperfeiçoamento em tempo real”, afirma Sumara Osório, vice-presidente de estratégia da VML. “Precisamos nos mover em uma velocidade muito maior, com grande embasamento de dados, entender de múltiplas e variadas plataformas de comunicação, aplicar todo nossa inteligência emocional para gerir equipes tão diversas e, acima de tudo, estar sempre aberto a aprender e corrigir, estimulando a equipe a manter um pensamento inovador”, avalia a executiva.

“O planejamento amadureceu e sua função está dividida entre desenhar a estratégia, ser um hub de tendências, antecipar novos comportamentos, defender ideias, oferecer propostas de consultoria e atender aos prazos cada vez mais desafiadores dos jobs do dia a dia. O grande desafio é se manter relevante, e isso ocorre, em primeiro lugar, a partir de um escopo mais dinâmico. O planejamento se tornou um fomentador de ideias, mas também um facilitador, a engrenagem do processo”, acredita Paula Queiroz, diretora de planejamento da Cheil Brasil, para quem análise de dados e entendimento de negócios são os conhecimentos fundamentais no setor. “Acredito que os jovens têm perdido um pouco essa construção mais clássica de marcas, e muitas vezes ficam seduzidos pela aplicação prática do canal em que a comunicação irá ser realizada. Plano tático digital é planejamento sim, mas ele tem de vir da estratégia da marca, faz parte de uma arquitetura de comunicação que constrói a mensagem mãe”, assegura.

Divulgação

Para Cleber Paradela, vice-presidente de planejamento da Sunset, o maior desafio do setor hoje é liderar estratégias em cenários cada vez mais líquidos e tortuosos. As mudanças constantes nas formas de comunicar exigem que profissionais estejam na crista da onda o tempo inteiro. “Uma estratégia para uma marca hoje pode não fazer mais sentido nenhum um ano depois. Logo, é crucial se manter ainda mais atualizado sobre tecnologia, pautas sociais, economia e política”, analisa. “Os profissionais que até então lideravam áreas de planejamento precisavam ter muito repertório e capacidade de direcionar a aplicação das estratégias. Os novos líderes precisam também ter o repertório, mas com uma capacidade constante de desaprender para aprender de novo e reinventar. E por isso as agências estão em busca de profissionais mais híbridos e menos viciados nos mesmos formatos”, avisa.

Divulgação

É consenso entre os profissionais entrevistados que, nesse contexto novo de mercado, quem deseja trabalhar com planejamento tem muito mais oportunidades para exercer sua função. “O primeiro passo é reconhecer que o pensamento estratégico, que antes focava principalmente na mensagem, precisa agora ser trabalhado de forma mais ampla. Ser capaz, por exemplo, de recomendar um novo modelo de negócio para o cliente caso o produto dele esteja virando um commodity ou se seu serviço não esteja mais sendo usado porque as pessoas adotaram um novo comportamento digital. E dar passos para frente, sendo capaz de fomentar discussões sobre tipos de plataformas, ecossistema digital, data intelligence, pesquisas focadas em usabilidade e muito mais”, acredita Marcia Aguirre, head de estratégia da R/GA. “Data Intelligence, User Experience, UX Research, Experience Mapping, Persona, Jornada, Pain Point, Mapa de Navegação e Ecossistema Digital, entre outros, são práticas e conceitos que não podem deixar de fazer parte do novo dia a dia de um estrategista. A evolução tecnológica não vai parar nunca mais”, finaliza.

Divulgação

“A nova geração de planejadores vem mais conectada com duas importantes questões. A primeira é a lógica da diversidade e da aceitação, o que é muito bom. A outra é a questão das métricas, com uma leitura mais ‘hard data’ das plataformas digitais. Está tudo um pouco mais direto e a cobrança vem também de coordenação das áreas de inteligência e BI, afinal, temos muito mais acesso a ferramentas de aferição”, avalia Rodrigo Cerveira, CSO da Z515. Por outro lado, diz Cerveira, o planejador tem de evitar o risco de se tornar muito técnico e cartesiano. “Pensar com o coração e a mente, sua ou do robô, ainda é o melhor caminho para o sucesso”, receita.

Divulgação

Leia mais
Entenda por que o novo mídia precisa ser um animal tecnológico
Dentsu tem novos diretores de mídia e planejamento