Com a economia em estado de atenção nos últimos três anos, o mercado publicitário assimilou o golpe de forma sintomática. Os principais sinais são diminuição de faturamento, corte de pessoal, comprometimento da rentabilidade, investimentos adiados e baixa retenção de talentos, por exemplo. Se não bastasse, as agências ainda convivem com a adaptação às novas demandas de comunicação, caudatárias da era digital, novos comportamentos de consumo de mídia, pé no freio de alguns anunciantes e rejeição ao jeito vigente de fazer publicidade. 

O consenso é que o ano de 2017 não está sendo nada fácil e a contaminação da economia pelo ambiente político potencializa o clima desfavorável. Anunciantes mais ativos, porém, estão tendo retorno sobre seus investimentos (ROI) e garantindo fôlego à operação das suas agências. Projetos especiais também estão na pauta, como tática de sobrevivência e adequação a uma nova realidade de gestão de negócios. 

Na avaliação do empresário Bob Vieira da Costa, sócio da nova/sb, este é o pior ano dos 14 anos de atividades da agência. “Houve uma redução drástica de investimentos em publicidade e essa verba não foi redirecionada para outras disciplinas de comunicação. Nunca vivemos um momento com essa intensidade. É uma ducha de água fria, porque a publicidade é uma atividade que requer investimentos constantes, principalmente em tecnologia e recursos humanos. Reduzimos 12% do quadro e o projeto Comunica que Muda caiu 50%. O faturamento teve redução de 18%. Tivemos a conquista da conta do Ministério da Saúde, uma verba de R$ 220 milhões dividida com CCP, Calia/Y2 e Fields. Nossa fortaleza é fazer uma entrega criativa diferenciada. Não podemos nos descuidar do produto”, explicou Bob.

O ambiente inóspito para a publicidade, a indústria que movimenta as outras indústrias, tem impacto no branding das agências. Para exibir diferenciação em um momento de transição, adotam vários discursos para mostrar que estão antenadas. Os principais são tecnologia, inovação e aderência ao digital. “O Brasil não conheceu uma crise tão violenta como essa. O mercado vive o que chamo de tempestade perfeita. Muita gente recolheu os flaps para esperar a crise passar. A vantagem da SalveTribal é que ela é já nasceu como fruto dessa transformação que o mercado vive e ela é maior do que a cautela que a crise econômica provoca. Sentimos a crise, mas estamos dando nosso jeito. Um deles é buscar novos negócios dentro dos atuais. Acabamos de ganhar a conta da GetNet, a maquininha de crédito e débito do Santander”, diz Alcir Gomes Leite, presidente da agência.

O primeiro semestre poderia ter sido uma ponte para um segundo melhor, mas os imbróglios institucionais trouxeram de volta a incerteza. Mas, na avaliação de Eduardo Simon, CEO da DPZ&T, as empresas que investiram em mídia tiveram retorno. “Há ajustes, mas quem anunciou colheu bons resultados”, resume ele, acrescentando: “Setores que dependem de crédito para girar não tiveram boa performance, mas bancos, varejo de alimentos e beleza, por exemplo, capturaram share. Estamos buscando novas formas de remuneração através de projetos especiais”.

Interferência

Conquistar contas é antídoto para qualquer crise. Fernanda Antonelli, CCO da mcgarrybowen, que acaba de ganhar a área de consultoria de beleza da Natura, tem motivos para comemorar, mas reconhece que mudar de rumo a cada nova notícia interfere na operação. “Outro fator importante é que o nosso negócio é movido por ideias. Acreditamos no poder delas para ajudar nossos clientes a atingir seus objetivos de negócio. Hoje há uma grande descrença por parte de profissionais mais jovens, que querem sair do país”, observa Fernanda. 

“O acontecimento mais marcante para a Propeg neste primeiro semestre foi a vitória na licitação da Petrobras. A chegada da conta vai ampliar nossa atuação no Rio de Janeiro, onde já atendemos a Prefeitura e o Governo do Estado. Novos profissionais se juntarão ao time, o que vai nos permitir também buscar mais clientes”, disse Vitor Barros, vice-presidente de atendimento e gestão da Propeg, reforçando que novos negócios ativam o ambiente positivo da agência.

Depois de um 2016 “morno”, nas palavras de Aurélio Lopes, presidente da FCB Brasil e chairman da rede na América Latina, houve retomada este ano. A conquista mais recente é a da incorporadora Brooksfield e há um novo conceito estratégico para a agência: We are makers. “Estamos fechando o primeiro semestre com números acima das previsões. Ganhamos seis clientes novos e tivemos surpresas positivas com aumento de investimento em alguns importantes clientes da agência. Constância e consistência são duas palavras que aprendemos a transformar em atitudes. Aprendemos também a acreditar que das ameaças podem surgir novas oportunidades. Os indicadores econômicos hoje estão melhores do que o cenário político do país. O Brasil tem um grande mercado consumidor. Portanto, muitas oportunidades. Tentamos diminuir a interferência da política nos negócios dos nosso clientes”, enfatiza Lopes.

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Rodolfo Medina, presidente da Artplan, recomenda atenção às demandas internas, gestão de pessoas e foco nos clientes. “Em um momento de transição de mercado, como agência, temos o desafio de liderar estas conversas e pensar em soluções que vão além da comunicação, as quais possam estar cada vez mais próximas dos clientes, de forma que estes nos enxerguem como um parceiro integrador e entendedor de seus negócios”, relata Medina. “Em 2013, junto com nossa equipe, traçamos metas claras de pensamento de como a Artplan estaria em 2018. Isso fez com que estivéssemos mais preparados e maduros para lidar com o atual cenário, que requer muito aprendizado, trabalho e inovação. Este cenário macroeconômico bastante desafiador apresenta oportunidades para empresas mais consolidadas e, neste sentido, tem permitido que possamos passar por este período confiantes e dando continuidade aos planos traçados”, prosseguiu Medina.

A Ogilvy incorporou ao seu portfólio de negócios as marcas Méliuz, CCAA, Leão (Coca-Cola Brasil), Telhanorte, Printi e Vale. Há motivos para comemoração do ponto de vista de negócios? Fernando Musa, presidente do Grupo Ogilvy Brasil, responde: “Estamos trabalhando bem com os clientes, apesar dos desafios econômicos, políticos e sociais do país. Ganhamos novos clientes, tivemos uma performance excelente em Cannes com trabalhos grandes e emblemáticos como Meninas fortes, de Nescau, que trouxe o primeiro Glass Lion para o Brasil. Lançamos e implementamos os Content Studios aqui na agência e também dentro do cliente. E temos ainda, pelo visto, mais seis meses de muito trabalho e muita emoção. Rentabilidade não é só um desafio da nossa indústria, mas de praticamente todos que trabalham e têm uma operação de qualquer coisa num país ultrapassado em infraestrutura, legislação, carga tributária, corrupção e o etc. que quisermos colocar aqui”.

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Feliz

Ainda sobre rentabilidade, Fernando Figueiredo, sócio e CEO da Bullet, é suscinto: “Quando implantamos a nossa mesa de compras, conseguimos buscar os objetivos de saving do cliente, sem machucar a nossa margem. Assim, todo mundo fica feliz”. Gal Barradas, sócia e co-CEO da Betc/Havas, complementa: “Precisamos, nós e os clientes, repensar a questão da remuneração do nosso mercado. Somos de uma indústria criativa e não do mercado de commodities. No mercado de commodities, os produtos são bem definidos e comparáveis, e o valor no mercado pode ser definido por pressão de oferta e demanda. Para nós, é o contrário: o que direciona o valor no nosso negócio são ativos intangíveis, que precisam ter alto índice de diferenciação, lidando com um número muito maior de hipóteses”.

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A Leo Burnett Tailor Made equilibrou-se no cenário caótico brasileiro com conquistas de contas como Bradesco, Fiat, Extra e Bayer Animal, por exemplo. “A entrada de novos players e as novas demandas dos clientes requerem transformações. Isso traz desafios e oportunidades de negócios que as agências precisam estar preparadas para explorar”, relata o co-CEO Marcio Toscani.

A Lew’LaraTBWA, segundo o CCO Felipe Luchi, se empenhou na busca por soluções. “Temos a pressão natural de uma época de crise, mas também os desafios que a indústria vem enfrentando globalmente. Algumas empresas de tecnologia oscilam em tratar as agências ora como parceiros, ora como atravessadores, o que é absurdo, dada a quantidade dos nossos investimentos em ferramentas de pesquisa, criatividade e em talento humano. As concorrências focadas em preço não foram poucas, o que também impacta no nosso trabalho. Se olharmos para as redes varejistas, nos últimos quatro anos foram feitas seguidas concorrências, muitas vezes mais de uma para a mesma rede. Isso é resultado de relações insustentáveis, quando os preços praticados não cobrem a entrega exigida para a marca continuar competitiva”, pondera Luchi.

Ranking

O retorno de Nizan Guanaes à DM9 foi elemento de ativação à operação, que saltou do 24º lugar para o 14º lugar no ranking do Kantar Ibope Media neste primeiro semestre, além de conquistar Ambev Institucional, Veja, Hoteis.com, Subaru, Lipton Chá Quente e Sempre Livre Global.

“Temos visto dados recentes do aumento da poupança no Brasil, isso indica que o consumidor está cauteloso, preferindo guardar dinheiro a consumir. E o papel da propaganda é mover a economia. Ficamos felizes em ver dados positivos da indústria, que logo vão impactar o varejo. É essa dinâmica econômica, da qual estamos inseridos, que mais impacta na operação de qualquer empresa brasileira. Dentro do nosso negócio, fatores internos se resumem na animação das pessoas”, diz Paulo Cesar Queiroz, presidente da DM9.

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Derrubar muros e investir em integração é binômio essencial para Eduardo Lorenzi, vice-presidente de planejamento da Publicis. “Além disso, trouxemos novas competências para dentro da Publicis, como Conteúdo, BI, UX, SEO e Desenvolvimento de Tecnologia”, destaca Lorenzi. “Nos últimos dois anos, estivemos em uma constante de crescimento em todos os nossos KPIs.

Chegamos agora em uma nova fase do nosso plano de negócios, que é mexer em time que está ganhando. Tendo alcançado um patamar interessante de receita, vamos agora abordar todas as nossas oportunidades de melhorias internas em todos os sentidos. Começamos, na semana passada, um trabalho com uma consultoria, que foi planejado durante cinco meses. Esse trabalho vai nos ajudar a avaliar e otimizar os nossos processos internos e de estrutura, visando melhorar a nossa entrega para os clientes, por um lado, e aumentar a produtividade do tempo dos nossos profissionais, por outro. Um espírito muito forte, que é um valor pessoal do presidente Hugo Rodrigues e se reflete na nossa cultura organizacional, é que nunca estamos satisfeitos e, muito menos, acomodados”, disse mais Lorenzi.

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Para Guga Valente, chairman do Grupo ABC, após a estagnação de 2016, o primeiro semestre deste ano tinha tudo para ser temerário. “Apesar da instabilidade, sentimos que os clientes entendem que precisam continuar e o mercado está se estabilizando depois da maior recessão do país. Estamos avançando e crescendo”, diz.

Sergio Gordilho, co-CEO e CCO da Africa, do Grupo ABC, afirma que uma das soluções é buscar novos negócios. “Com Natura, por exemplo, só neste ano, conquistamos oito novos produtos. Alem disso, ganhamos a conta de Itaucard, Mac&Cheese, da Kraft Heinz, e Chama. Apresentamos a nova área da Africa, o Pulse Data Moment, que marca uma transformação cultural na agência e já está trazendo excelentes resultados junto a nossos clientes. Há a situação que o país vive, de instabilidade e incertezas. Isso interfere não só na nossa indústria, mas em todos os setores”, finaliza Gordilho.