Tenho 50 anos de profissão, o equivalente a mais de 15 mil dias criando, escrevendo e produzindo peças de propaganda. Por mais preguiçoso que eu seja, e já tirando a média a partir de minha baixíssima produção, acredito que tenha feito mais de 5 mil anúncios, filmes, spots, malas diretas, textos para internet, cartões de natal, outdoors etc. etc. e mais etc..

De vez em quando, no final de palestras, as pessoas me pedem para dizer qual foi o anúncio inesquecível que eu tenha criado. É uma tarefa difícil até porque a propaganda, a mais efêmera de todas as atividades, raramente consegue extrapolar sua humilde função de vender ou convencer para se tornar algo que possa merecer um lugar permanente na cabeça das pessoas.

Para minha tristeza, também não fui eu quem criou nenhuma daquelas peças que atravessaram décadas e hoje fazem parte do inconsciente coletivo. No máximo, fiz alguma coisa que pode ser lembrada com orgulho, como o Abra a Boca é Royal, o filme de Natal do Banco Nacional (música do Passarinho) e outras coisinhas, de cigarro a carro, de sutiã a furadeira. Mas alguns anúncios ficaram na minha memória, alguns por motivos pouco nobres, como um para os Móveis Bergamo, que por um erro de datilografia (na época não se digitava) e de revisão, dizia que a cama modelo tal da Bergamo se adaptava perfeitamente a qualquer “colhão”.

Apesar de não ter sido aprovada, Toninho Lima e eu uma vez criamos uma campanha para uma emissora de rádio, que tinha o estilo da antiga Rádio Fluminense, cujo slogan era “a maldita”, e propusemos para uma concorrente o slogan: “Rádio Tal… a escrota!” A rádio era tão punk que odiava o ouvinte. Um dos textos dizia: “Se você está gostando, nós já estamos mudando!” ou esta pérola de serviço público: “Rádio tal anuncia a hora certa… pensando bem, pra que você quer saber a hora, ô vagabundo?”

Paulo Costa e eu, certa vez, fizemos um anúncio para uma excursão da Aerolineas Argentinas à Terra do Fogo com o título: Antártica estupidamente gelada por 1.000 dólares. Também acho bonito, honesto, ético um anúncio para uma imobiliária que dizia “Este é um apartamento pelo qual vale a pena você se endividar”.

Outra vez criamos um anúncio para Jacuzzi. Era de uma coluna por toda altura do jornal. O título lá em cima e no meio uma pessoa mergulhando. Em baixo, um rodapé. O título dizia: “Coloque equipamento Jacuzzi na sua piscina…” e o rodapé concluía: “… e caia n’água!”. Pensando bem, nada muito genial, mas – digamos – eficiente. Fizemos um rafe para o ilustrador e fomos embora. O resultado final ficou: “Coloque equipamento Jacuzzi na sua piscina… e caixa d’água!” O cliente quase me afogou.

Numa outra ocasião, descobri que uma boate no Rio de Janeiro, muito famosa, era a maior compradora de um uísque nacional e aconselhei o cliente a fazer um superanúncio agradecendo essa preferência. Ao sair da agência, resolvi dar uma passadinha na tal boate, até mesmo para conseguir a autorização para fazer uma foto da fachada para ilustrar a peça. Quando me aproximei do bar, pedi o tal uísque, meu cliente. Resposta do barman: “Desculpe, mas não trabalhamos com uísque nacional!” Pedi qualquer um, com a absoluta certeza de que iria tomar o produto do cliente.

No standup que Maurício Menezes e eu fazemos no teatro, a gente toca um spot das Casas Sendas que o locutor leu errado e ninguém percebeu. Dizia: “Hoje na Sendas Guaraná Antarctica por tantos reais. Você paga três e leva dois!” Estranhamente ninguém foi lá aproveitar a oferta. Mas se puxar muito pela memória eu vou me lembrar de um anúncio para a Krupp que foi publicado em parte da Edição Especial da Manchete pelo assassinato do presidente Kennedy. Uma página dupla central. No desespero de fechar a edição, o pessoal da gráfica em vez de fotografar a arte final para fazer o fotolito, fotografou o leiaute. Até o erro ser descoberto, alguns exemplares foram distribuídos com um texto interessantíssimo: “monomonomonomonomono” que era como muito antigamente a gente indicava a massa de texto. Esse não é um anúncio inesquecível. É ilembrável.

Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor (lulavieira@grupomesa.com.br)