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Trabalhar gerindo as contas de pessoas públicas nas redes sociais é um desafio enorme, e me ensinou muita coisa ao longo dos anos. Já trabalhei produzindo conteúdo para grandes marcas e sei o que se espera de influenciadores, mas trabalhando do outro lado aprendi os dramas, as dificuldades e uma importante lição: cada passo precisa ser dado de maneira estratégica para ganhar um novo público, não decepcionar o antigo e flertar com as marcas certas.

Conhecendo mais sobre esse universo dos influenciadores, vi erros sendo cometidos quase que em slowmotion, acertos ocorrerem quase sem querer, atitudes desesperadas e impensadas. Fato é que até os grandes influenciadores não valorizam a mão de obra especializada do marketing, e é com essa falsa autossuficiência que vemos imagens como a do Youtuber Cocielo se desfazendo na frente das marcas e dos seguidores mais conscientes (saiba mais aqui).

Marcas querem ter sua imagem ligada a pessoas comprometidas

com um mundo melhor

 Cocielo errou feio. Pouco mais de 100 anos após a abolição da escravatura, 3 ou 4 gerações nos separam do regime escravocrata, sem praticamente nenhum sistema de reparação, num país dominado por uma elite branca, dona dos meios de comunicação e com vontade nula de justiça social. Vivemos ainda numa sociedade de racismo enraizado nas mais profundas tradições e mentes.

Ele errou, e todos nós conhecemos pelo menos uma dúzia de pessoas que errariam igual. Ele poderia reverter esse erro? Talvez. Mas com uma boa gestão de crise esses danos poderiam ser ao menos reduzidos, e talvez em algum tempo a sua imagem estivesse recuperada de novo. A escolha dele, contudo, foi bem parecida à da sua esposa, Tata Estaniecki quando envolvida em outro escândalo racista:

 1. Pedir desculpas publicamente, deixando sempre claro que foi mal interpretado.

2. Tirar férias das redes sociais até a situação esfriar.

3. Desativar os comentários das redes sociais, para que quem entre lá ache que nada aconteceu.

 Funcionou com a Tata? Algumas pessoas vão dizer que sim, sua vida voltou ao normal depois de uma dúzia de dias. Eu, que bato na porta de marcas e agências para tentar incluir meus influenciadores em campanhas ou vender publiposts posso afirmar com toda certeza: nenhum escândalo vai ser deixado pra trás. Algumas marcas vão passar por cima, oferecer menos, mas as equipes de marketing mais atentas ficarão receosas.

Ele perdeu a oportunidade de reconhecer o erro, de abrir um parênteses na sua carreira humorística e falar sério. Mostrar que nunca é tarde pra aprender a ser solidário e generoso com uma causa que pode não ser a dele, mas que com certeza vai de encontro a um mundo mais justo.

Ele perdeu a oportunidade de conversar com Spartakus, ativista negro e influenciador que o marcou em um post, falando queeles precisavam conversar. Ele perdeu a oportunidade de falar que, há menos de um mês, um menino negro foi morto com uniforme escolar numa operação policial na favela da maré. Provavelmente porque estava correndo.

Ele perdeu a oportunidade de dar voz para o humorista negro Paulo Vieira falar sobre os limites de humor, que não deve ser usado para reforçar preconceitos que matam pessoas todos os dias.

 1. Peça desculpas sinceras. Não rodeie, não se justifique. Não dê margem para os que zombam da luta de quem é ativista contra racismo, machismo, direitos humanos e injustiças sociais.

 2. Chame pessoas para conversar: grave um vídeo chamando pessoas que entendem do assunto. Dê voz às pessoas que lutam pela causa.

3. Se comprometa a fazer a mudança. Fale que aprendeu com o erro e que além de estar comprometido a mudar a sua vida, quer mudar a vida de quem está a sua volta.

Mari Ramos é sócia da Agência Doissete