Álvaro Rodrigues, CEO da Fullpack, será jurado em Cannes pela terceira vez, a segunda na área de Rádio. Antes, avaliou outdoors, e a experiência lhe ensinou que fazer parte do júri é contexto, é explicar o que não está dito com alguma competência. A experiência dele no festival começou como Young Creative, em 1998. Para ele, é rico o debate em torno do que é premiável. Ele compara a experiência a fazer parte da ONU, só que, nesse caso, as nações unidas defendem a criatividade. Veja a seguir principais trechos da entrevista.

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Contexto
Uma peça com potencial para concorrer em Cannes e festivais internacionais sabe que vai passar por um critério altíssimo de avaliação. Criatividade, inovação, craft, pertinência ao meio e à categoria, tudo isso é levado em consideração. O que será avaliado não é propriamente a questão de ser popular ou não. Mas se a ideia feita e pensada para rádio é boa ou não. A peça pode ser local. O importante é que ela venha com uma nota, uma referência para o júri, explicando o seu contexto ou uma característica particular da sua regionalização. Isso pode fazer a diferença entre a short-list e um Leão.

Áudio
O uso da tecnologia deu um novo fôlego ao rádio, dando possibilidades infinitas de inovação. Hoje, um texto pensado para o meio compete com uma ação que usa o GPS do carro, a sua geolocalização para ativar uma mensagem. O RDS. A frequência. Tudo é levado em consideração para a criação de um projeto transgressor e absolutamente pertinente ao rádio. Este ano, a categoria somou o “áudio”. Será no mínimo interessante julgar não só spots e cases como a atuação de um ator em um comercial tomando como base a sua locução.

Competitivo
O Brasil é um país musical. Isso é um ativo inegável. Resta saber se esse ativo será usado de maneira competitiva em Cannes. O Brasil vem crescendo a sua performance na categoria. No ano passado, foram sete Leões. Em 2015 e 2016, quatro. O que demonstra que o país tem pensado, criado e produzido material cada vez melhor para o meio.

Relação
Tenho uma relação de longa data com o festival. Meio que um ciclo profissional com ele. Comecei a minha experiência em Cannes da melhor forma possível: sendo um Young Creative. Fiz parte da delegação carioca (junto com o Andre Kassu e o Rodrigo Mendonça) em 1998. De lá para cá, foram 26 Leões conquistados, com uma subida ao palco inesquecível pelo Leão de ouro com o Ursinho Elo (DM9Rio). Essa é a minha terceira participação como jurado. Duas em rádio e uma em outdoor. Cada uma dessas idas a Cannes teve um objetivo, recompensa e aprendizado.

Responsabilidade
É uma honra e uma responsabilidade tremendas. A experiência é obviamente única. Conecta você com trabalhos e pessoas de todos os lugares. Gosto de fazer parte do júri. Fui duas vezes jurado no D&AD. Presidente do júri no Fiap no México. Cada um com a sua característica, particularidade. É interessante poder rever os “amigos de júri” a cada ciclo de festival. Conexões que você leva para a vida, além daquela semana de trabalho intenso. Ser jurado em Cannes pelo Brasil tem um peso muito grande. Historicamente, nós somos grandes ganhadores de Leões. O país espera que nós, jurados, possamos ajudar nessa performance vencedora. Para você discordar ou defender uma peça, é preciso retórica. Para isso, tem de dominar a língua inglesa. É sempre rico participar desses debates. É como fazer parte da ONU. Neste caso, as nações unidas defendem a criatividade.

Critério
Escolher o melhor. Daquele ano. Daquela categoria. Esse deve ser o critério de um jurado. Simples assim. Geralmente, o presidente do júri envia uma carta para os jurados dividindo as suas expectativas, o “norte” para o nosso trabalho, o que devemos buscar. Estive em um júri que o presidente nos disse: “Elejam o trabalho que daqui a 20 anos ele seja realmente um referencial de inovação e criatividade no meio, que daqui a 20 anos, as próximas gerações de criativos se orgulhem do que era feito”. Fazer parte do júri é poder ajudar o seu país. Isso é óbvio. Ajudar com a retórica local, dando contexto, explicando o que não está dito, isso faz a diferença.

Especial
Ser jurado em Cannes 2018 tem um significado especial: vamos fazer parte do Cannes que mudou, do festival que se reinventou, mudou categorias, ficou mais curto, enfim, mudou para continuar sexy. Nós ainda somos muito fortes no craft de press e outdoor. Nossa direção de arte criou uma escola onde o mundo entrou para estudar. Não podemos comparar o volume e o nível de produção de filmes com outros países. A discussão em mobile e digital também ocorre em um nível altíssimo. A boa notícia é que, mesmo assim, conquistamos 99 Leões no ano passado, em categorias diferentes.

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