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Se antes era raro o negro se ver representado na publicidade, pouco a pouco, a diversidade de cor começa a aparecer na comunicação. No entanto, ainda há um longo caminho para que as campanhas tragam uma amostra real da população brasileira. Dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua 2016, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mostram que, dos 205,5 milhões de brasileiros, 46,7% se autodeclaram pardos e 8,2%, pretos. Entre os profissionais de publicidade, a parcela de negros e pardos ainda é pouco representativa e não está nem perto desses quase 55%.

“É necessário mudar dos dois lados: primeiro, do cliente, que precisa aceitar que é fundamental eles se verem representados na comunicação da marca e, número dois, a gente precisa conseguir, de fato, inserir os negros nas agências. Para isso, precisa um novo código, um programa. Não adianta dar chances iguais porque alguém saiu muito lá de trás. Provavelmente, a universidade foi pior, ele mora mais longe etc.. É necessária uma política que pensa em todas essas diferenças”, fala Joanna Monteiro, CCO da FCB.

Joanna chama a atenção para o fato de a diferença de oportunidades ser um problema histórico, que não atinge apenas a comunicação. “O negócio é mais embaixo, não só na publicidade. Se você não der a possibilidade de (o negro) ascender socialmente, você não vai querer sua marca associada (a ele). É cíclico. Mas, em algum momento, tem de abrir espaço e ser obrigatório”, afirma.

A Samsung faz questão de ter mais representatividade em sua comunicação. “Temos trabalhado localmente e globalmente para incluir nas campanhas. Nós temos um grande volume de consumidores de smartphones de baixo preço no Brasil e trabalha muito o conceito para tirar o preconceito do julgamento. São pessoas pelas quais você passa despercebido na rua, mas, na verdade, se você conhecer esta pessoa, vai ver que ela pode oferecer muito mais do que parece. A gente vem trabalhando pilares que refletem a cultura interna. Essa atualização é muito importante e é um esforço global”, conta a diretora sênior de marketing da divisão de dispositivos móveis da Samsung Brasil, Loredana Sarcinella.

A executiva cita a nova campanha do Galaxy A, assinada pela Cheil, que traz o slogan: Fotos com o Melhor de Você. O filme, que recria um estudo feito pela youtuber Shea Glover, traz a reação das pessoas ao serem fotografadas depois de um elogio. “A gente mostra as mais diferentes pessoas, nem todo mundo é bonito dentro do estereótipo, mas o filme mostra o que tem de melhor em você. A gente vem fazendo esse trabalho com bastante consistência globalmente”, explica.

Na J. Walter Thompson, as ações para mudar a realidade do mercado publicitário em relação à presença do negro já estão sendo colocadas em prática. Foi instaurado o programa 20/20, no ano passado, com a meta de ter, até 2020, 20 negros em áreas estruturais da agência (criação, planejamento, atendimento e mídia). A iniciativa tem a assessoria de diversos especialistas, como a consultora de RH Patrícia Santos, fundadora da EmpregueAfro.

“Quando eu falei que isso tinha de ser um projeto e não pode ser uma aventura, eu me referia a fazer isso com a EmpregueAfro, que é uma consultoria com a função de recrutar profissionais negros para empresas. Eles nos ajudaram muito no processo de seleção. No ponto de partida, precisa ter cota, sim. A gente sempre tem 20 estagiários negros e, em cada área, tem um mentor”, conta John.

De acordo com o presidente da agência, a qualidade das vivências desses grupos é muito rica. “No planejamento, por exemplo, fizeram um grupo de leitura. Porque, como a Joanna bem disse, existe um gap entre a qualidade do ensino que eu tive versus a qualidade de ensino que um estudante negro, na maioria das vezes, tem. Se não tem um sistema, a coisa não vai para a frente”, fala. John defende que o projeto seja ampliado para o mercado como um todo e não fique apenas em ações pontuais da agência na qual ele trabalha. “Eu tenho 20 estagiários negros sendo muito bem treinados, mas eu não vou conseguir absorver todos. Outras agências deveriam entrar nisso. Deveria ser um programa perpétuo. Tornar as agências mais diversas vai levar anos. Mas se os primeiros passos forem mais mercadológicos a gente tem uma chance maior”, afirma.

A P&G, por exemplo, apoia a educação de base, por meio de uma parceria com o Instituto Ayrton Senna, mas ainda enfrenta muitos desafios para conseguir contratar um público mais diversificado. “Um dos desafios é que a empresa só contrata de universidades. Ela não pega um profissional do mercado. As pessoas são treinadas lá dentro. Então, para diversificar o público, a gente começou a expandir as faculdades das quais contratávamos”, conta diretora de comunicação e marketing da P&G, Poliana Sousa.

A executiva também citou que o programa Jovem Aprendiz tem ajudado a trazer esses jovens mais cedo para a empresa. “A gente multiplicou por dez nos últimos anos para começar muito atrás. Lá tem curso, mentoria, e muitos depois conseguem passar no processo seletivo. É um desafio claro para a gente”, fala a diretora da P&G.

Outro problema apontado pela executiva é que empresas globais têm campanhas que vêm de fora e, muitas vezes, elas não representam o brasileiro. “A gente trabalha com muitas campanhas globais, com o loirinho de olho azul, com cara de alemão, e não reflete a nossa realidade”, fala. Como exemplo ela falou de Pantene, que começou com Gisele Bündchen como garota-propaganda. “Não tinha uma negra na campanha. A gente deu a volta por cima e agora a gente viu o sucesso que foi o lançamento de cachos”, afirma.

“As pessoas querem se ver, mas, muitas vezes, só colocar um negro ou uma negra na comunicação não é a questão. Você ouve que as pessoas não se sentem representadas. ‘Isso não fala comigo e você não está entendendo nada do que acontece aqui’, elas falam. As verdades da marca vão ter de ser buscadas mesmo. Não dá para fazer qualquer coisa”, completa Joanna.

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