Praticamente todas as estratégias de campanha nesta corrida pela Presidência do país devem sofrer mudanças após o atentado sofrido pelo candidato Jair Bolsonaro, do PSL, no  último dia 6 de setembro. Mas, certamente, a que deve sofrer o maior ajuste de rota é a campanha de Geraldo Alckmin, do PSDB, que teve a sua estratégia centrada em desconstruir o polêmico adversário do PSL desde a estreia no horário eleitoral, em 31 de agosto.

A linha de trabalho ficou clara com a veiculação de um filme inspirado em um conhecido comercial inglês contra o armamento, intitulado “Kill the gun”. Uma sequencia de imagens quase igual ao filme original foi usada para defender o conceito “Não é na bala que se resolve”, enquanto um projétil destrói, em câmera lenta, objetos que representam problemas do país, ao som de um trecho da ópera Norma, de Bellini. A ideia foi de seu time de marketing, liderado pelo criativo Átila Francucci. 

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Logo depois, outro filme criticou abertamente o lado machista de Bolsonaro, com a assinatura “Quem não respeita as mulheres, não merece o seu voto”, num claro movimento para capitalizar o voto feminino. Esta é uma das grandes bandeiras de sua candidatura, apoiada pela escolha de uma vice-presidende mulher, Ana Amélia e pelo slogan “Geraldo é cabeça e coração.”

Em uma terceira ofensiva, Bolsonaro é citado verbalmente em um comercial que aborda a opinião de candidato de que mulheres não devem ganhar mais que homens somente por serem mulheres.

No dia do atentado a Bolsonaro, a campanha se manteve no mesmo tom, pois o material foi entregue ao TSE antes do atentado, e sem possibilidade de substituição. Na noite do dia 6, por exemplo, foi ao ar um programa em que Bolsonaro aparecia xingando a deputada Maria do Rosário (PT-RS), além do comercial que critica a opinião do candidato sobre (não) equiparação salarial entre homens e mulheres. Na quarta-feira anterior (5), Alckmin fez críticas diretas ao oponente chamando-o de despreparado e dizendo que faria o possível para não deixá-lo chegar à presidência.

Já na sexta-feira passada, feriado de 7 de setembro e pós atentado, Alckmin suspendeu sua agenda, segundo comunicado,  “Em respeito ao deputado Jair Bolsonaro, que se recupera do atentado sofrido”.   

Já no dia 8, o tema da campanha de Geraldo Alckmin foi a violência e um convite a uma reflexão sobre a agressividade que tomou conta do ambiente. “Mais do que tudo, o país precisa de pacificação”, declarou. “Não é na bala, e nem na faca que vamos construir esta nação”, disse o candidato em outro momento.

O publicitário Lula Vieira, que já participou de diversas corridas políticas, diz que a campanha presidencial era uma antes do atentado em Juíz de Fora – quando tinha contornos razoavelmente definidos e permitia uma análise mais acertiva – e é outra agora. O jogo mudou.

Lula diz que o candidato do PSDB, dono de um imenso espaço na televisão e de uma rede bastante grande de apoiadores, tinha boas chances de ser a aposta do segundo turno.

“Ele poderia representar junto a um grupo bastante significativo de eleitores o bom senso, a solução advinda da capacidade de negociar,  da experiência como administrador e de uma postura conservadora, mais confiável, num momento que seus adversários poderiam ser diferentemente rotulados como radicais, ou frágeis (caso Marina), ou temerários como o PT se mostrava diante de sua indefinição interna quanto a quem seria o verdadeiro candidato do partido”, comenta.

Para ele, o candidato acertou na escolha de apresentar suas realizações como Governador de São Paulo e eleger Bolsonaro como antagonista, tentando alertar o eleitorado que além do problema da segurança, todas as outras questões estruturais não se resolveriam a bala.

A continuidade, no seu ponto de vista, – se não houvesse atentado algum no meio do caminho -, seria continuar explorando a imagem do político sensato, sem grandes arroubos de oratória, mas confiável do ponto de vista de conseguir uma aliança nacional, capaz de combater a radicalização.

Alckmin tem a seu favor, sim, o maior tempo de TV entre todos os candidatos: seis minutos e três segundos.

“Ainda que as pesquisas revelem que a população diz dar pouca importância ao horário eleitoral e às inserções avulsas, não podemos esquecer que é absolutamente impossível que as mensagens passem desapercebidas. E outro detalhe: o poder de influência de quem acompanha a propaganda eleitoral em relação ao seu círculo de amigos e conhecidos é muito grande”, observa.

Depois do atentado a Bolsonaro, o cenário muda porque, segundo Lula Vieira, o eleitor vota com o coração.

“O que aquela facada pode significar é uma incógnita. Se eu fosse o Alckmin, ou estivesse na sua equipe, aguardaria um pouco. Mas isso é quase impossível em equipes políticas”, diz.

Pouco carisma e bom mocismo

Um quadro complexo, para não dizer caótico, é como descreve o cenário eleitoral o professor Luiz Fernando Garcia, diretor nacional de pós-graduação e educação continuada da ESPM. Para ele, o momento mundial de polarização e de radicalização ajudou a moldar o cenário atual. Quem está mais para o centro  do “pêndulo”, tem dificuldades para se posicionar. 

“Vivemos um momento atípico, radical, polarizado. Pelo que se vê nas prévias, destacam-se os de propostas radicais que fazem discursos mais esperados pela população. De todo modo, os institutos de pesquisa, nas principais eleições no mundo ocidental (leia-se Trump, Brexit, Alemanha…), na maior parte das vezes não estão conseguindo acertar o real termômetro de tendências. Muitos dizem que eles não estão conseguindo colocar seus sensores nos locais certos (por exemplo, nas redes sociais). Outros afirmam que a população está mais volátil e tende a mudar de opinião com maior facilidade. Um fenômeno a se estudar.”, diz Garcia.

Segundo ele,  a primeira fase da campanha costuma funcionar de diversas formas: para reforçar a visão dos eleitores convictos, buscar os indecisos e tentar abalar convicções dos não convictos. Sua análise é que embora Geraldo Alckmin seja um nome relativamente conhecido no Brasil e se posicione claramente como a alternativa ideal para enfrentar o radical que eventualmente passar para o segundo turno, há contra ele alguns pontos importantes como pertencer ao partido que esteve colado ao Governo anterior, ter feito coligações “no mínimo contraditórias” e não ter sido unanimidade nem no seu partido.

“Para muitos ele é apenas o retrato da ‘velha política e pactos e recompensas’. Ao mesmo tempo, sua performance midiática é fraca. Ele tem cara daquele ‘bondoso e pacato professor do ginásio da escola do interior’, o que lhe valeu o apelido de ‘picolé de chuchu’. Sabemos que parte das escolhas, principalmente dos indecisos, se dá diante da performance de campanha e debate, e neste quesito ele não tem um ponto forte”, analisa Garcia.

O professor destaca a opção do candidato por virar Geraldo na campanha eleitoral, deixando de lado o sobrenome Alckmin, para não complicar o eleitor, especialmente no nordeste, onde Haddad virou Andrade para muitos. O candidato é, na visão de Garcia, a imagem do conservadorismo, o realizador conciliador de valores conservadores como educação e família, defendendo “viver a vida em paz”. E por outro lado, contraditoriamente,  tenta desmontar as propostas do adversário radical. Este pode ser um erro estratégico, incapaz de atrair votos. Para quem simpatiza com Bolsonaro, a linguagem do filme da bala, por exemplo, não diz muito. Afinal, para eles  “bandido bom é bandido morto” e  “política de direitos humanos só funciona para bandido”.

“Se só falar de si e seus projetos pode fazê-lo parecer um ‘sem carisma’,  ‘sem sabor’, atacar os outros pode fazê-lo parecer um desesperado.”, pondera.

Debates são shows midiáticos

Avaliar a performance em debates é avaliar a atuação dos candidatos em verdadeiros programas de auditório, onde deve haver vencedores e perdedores.

“Não temos debates. Temos shows midiáticos na TV. E só participam os que contam com a maior representatividade atual na área legislativa, o que não é democrático, no sentido da renovação”, opina Garcia.

Segundo ele, é sempre mais do mesmo: todos os candidatos afirmando que resolverão os principais problemas do país em um mandato.

“Geraldo Alckmin está melhor do que nas campanhas anteriores, mais direto e incisivo, mas não é o gladiador mais forte nesta arena.”, analisa.

Na TV e no rádio o candidato leva vantagem mas corre o risco de cansar pelo excesso. “Quem fala muito, pode cansar a plateia”, observa.

Na internet, funcionam bem os filmes, especialmente os dois primeiros  de Geraldo Alckmin – “Bala” e “Quem não respeita as mulheres não merece o seu respeito” – bastante compartilhados.

“Falta acesso e letramento digital a boa parte dos brasileiros. O brasil de tantos brasis, onde falta água, energia elétrica e saneamento básico, não pode ser tratado como um só. Por isso as ações em redes sociais são o maior desafio para todos, hoje. Todos estamos aprendendo a lidar com elas. Se as marcas comerciais, que estão atuando fortemente nas redes, afirmam que ainda engatinham, imagine a maioria dos candidatos e suas equipes, que só estão presentes nas redes em período de eleição.”, opina.

Pulso Firme pode ser o caminho

Se Bolsonaro é presença certa no segundo turno, Garcia apostaria em Ciro ou Geraldo Alckmin como possíveis adversários. Mas para crescer e ter chances, Alckmin deveria ser mais claro nas propostas concretas e buscar captar os indecisos com propostas claras e firmes, no lugar de levantar bandeiras contra quem estiver na frente.

“Se as radicalidades estão prevalecendo, é porque demonstram pulso firme”, conclui.

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