Depois de atuar como “cliente” numa grande empresa, fui convidado a trabalhar numa agência. Não era qualquer agência, era “a” agência da época. Isso foi lá no início da minha carreira profissional e eu tinha um grande interesse em trabalhar num ambiente criativo, numa empresa que tinha criatividade como produto final.

E lá estava eu, com todos os meus sentidos aguçados, cheio de vontade de participar. Aí pinta um grande job, de um dos clientes do meu conjunto de contas. E eu, ainda sem os bloqueios, sem estar impregnado pela liturgia e o modus operandi típicos de uma agência da época, tive a ousadia de questionar abertamente a linha criativa proposta pelo diretor de criação.

Diga-se de passagem que o tal diretor de criação era uma das grandes estrelas do mercado, detentor de reluzentes Leões de Cannes. A reação quase me fez perder o emprego.

Em síntese, o recado que me foi dado foi: “Fica na suinha, atendimento! Sua função é levar os layouts e amaciar o cliente para aprovar a ideia. E só! Onde já se viu dar pitaco na ideia fantástica, maravilhosa, inatacável da prima-dona da criação?!”.

Um pouco frustrado e atordoado, só me restou engolir o sapo e encontrar um território de atuação que fosse relevante e interessante, ainda que não tivesse o direito de participar do processo criativo.

Mais de duas décadas depois, quis o destino que eu me tornasse um especialista em design thinking, que tem como princípios a empatia, a colaboração e a experimentação. E o mais importante: uma atividade que se sustenta no pluralismo das ideias, na participação coletiva.

Os resultados decorrentes de um processo coletivo, como esse, demonstram com sobras o valor da ação colaborativa, participativa. Num processo como esse, quem tem as ideias não são seres iluminados, providos de uma capacidade ímpar de criar.

São pessoas comuns, sintonizadas num problema ou numa oportunidade compartilhado por todos. Tenho tido a sorte de liderar processos como esse e ver resultados surpreendentes no final. E quis o destino também que tais processos coletivos ganhassem seu valor e preponderassem nas agências.

Nada mais antigo do que a atitude daqueles que se encastelam nas suas salas e rechaçam qualquer tentativa de colaboração de pares ou subordinados.

O moderno é o coletivo, o colaborativo.

Hoje, é valorizado o diretor de criação que mantém a sua porta aberta ou, melhor ainda, estimula a opinião de todos os stakeholders.

Aquele que não tem medo de perder a autoria da ideia. Aquele que sabe que orquestrar, ordenar e “empacotar” ideias é mais importante do que tê-las.

Aquele que sabe identificar o potencial de um insight gerado por qualquer profissional da agência ou mesmo pelo cliente.

Afinal, uma ideia bruta nem sempre está pronta para ser aplicada. É preciso gente muito competente para lapidá-la e adequá-la a um plano maior, que faça sentido para os objetivos estabelecidos. Não é menor esse trabalho.

Ao contrário, é tão nobre quanto aquele de ter “sacadas” geniais. Se na sua agência ou empresa anunciante ainda existem essas primas-donas, que insistem em se isolar em suas salas de vidro, com uma plaquinha na porta “gênio pensando”, cuidado!

Esses profissionais até serão capazes de gerar boas ideias, mas certamente estão desprezando um potencial enorme do processo coletivo. Está na hora de quebrar portas e muros e dirigir antenas para todos os lados. Para os lados dos clientes finais, dos parceiros, dos fornecedores, da mídia, dos provedores de ferramentas e, principalmente, para o público interno.

E, o mais importante, criar mecanismos para captar esses insights e dar vazão a eles. Parece simples, mas não é. Há vaidades em jogo, além do despreparo em organizar essas ideias que chegam brutas e desordenadas.

Mas não tem mais volta: a criação é cada vez mais coletiva e colaborativa.

Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional de Agências de Propaganda) (alexis@fenapro.org.br)