Éimpossível viver sem emoções. É da natureza dos seres humanos. Somos assim. E, passado o momento, é um tal de esconder as merdas derramadas durante a catarse. Acho que no meu caso foi uma catarse mesmo. Tal como Édipo, fiz-me cegar e exilei-me da realidade. Tal como Romeu e Julieta, fiz-me matar pelo quase amor proibido… aos livros.

Mas, no desempenho de determinadas missões, é prudente apartar-se das emoções e deixar-se conduzir mais pela razão.

Anos atrás, de certa forma, decretei a morte do livro. Eu e milhões de açodados. Só que na minha profissão – consultor de empresas –, mesmo sendo humano, isso é inaceitável, inadmissível, catastrófico. Mas, I’m sorry, acontece. E assim, aqui e agora, estou para reconhecer a merda que fiz, dizer, berrar “errei” e tentar, coberto de felicidade, reparar meu erro.

O livro não vai morrer! Viva!

Quem já morreu foram seus possíveis e supostos substitutos. Kindle, todos os demais livros eletrônicos, e a ilusão alimentada por muitos que os X, Y, Z iriam ler Ulisses e/ou Em Busca do Tempo Perdido em seus smartphones. Não vão nem por um cacete. E, muitos deles, o farão sabe onde? Isso mesmo, no velho, bom e insuperável livro. Isso mesmo, o de papel.

Por favor, para purgar minha culpa com requinte, confiram o absurdo que escrevi em fevereiro de 2008: “Um ano após seu lançamento o Kindle – livro eletrônico de Jeff Bezos e sua Amazon – está definitivamente consagrado. É o livro eletrônico, assim como o iPOD, é o tocador de MP3, e o WII é o videogame. Venceu, é a referência”. Teria eu naquele momento cometido 3 “pós-verdades”? Acho que sim, mas já tomando todo o cuidado, cada vez mais cuidado, por não ir usando indiscriminadamente essa palavra que na próxima segunda-feira pode não fazer mais o menor sentido.

Nesse meu pedido de perdão, as evidências que me levaram a tentações irresistíveis – era uma quase unanimidade (a tal da burra) – e não tinha como não acontecer: “Hoje, para se conseguir um Kindle nos EUA/Amazon, a fila é de no mínimo 3 meses. Os apressadinhos podem comprar os seus em sites de leilões na internet. Na configuração original, armazena, em 300 gramas de peso, até 200 livros. Mas, e se o comprador o desejar, pode utilizar um cartão SD e aí, nos mesmos 300 gramas de peso, cabem 40 mil livros. Isso mesmo, 40 mil livros, o que a maioria das bibliotecas do Brasil e no mundo não tem e jamais terá…”. E terminava afirmando, “Em janeiro de 2009 e no Amazon, a nova versão do Kindle e o fim dos livros de papel mais próximo…”.

Pois é, quem, economicamente, morreu foi o Kindle. Assim como todos os seus compatíveis. Os velhos e bons livros de papel, ainda que com tiragens menores, multiplicaram-se. E novos autores revelam-se aos borbotões, todos os dias, na tal da Content Era, a era do conteúdo. No papel, mesmo.

No Brasil, em 2016, vendeu-se menos livros que em 2015. Uma queda de mais de 10%. Mas, e assim mesmo, quase 35 milhões de livros. Nada mal para um suposto paciente terminal que eu, um leitor compulsivo e apaixonado, sob forte e injustificável emoção, quase no desespero, acabei matando.

Errei! E, com humildade e arrependimento, peço perdão aos meus leitores, assim como ao meu melhor e inseparável amigo, o velho e bom livro de papel.

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing (famadia@madiamm.com.br)