Outro dia, me perguntei quando foi a última vez em que tomei uma iniciativa de consumo influenciado pela propaganda. Para os padrões brasileiros, acredito que pertenço a uma faixa de cidadãos favorecidos por serem dotados de alguma cultura e por ter a oportunidade de trabalhar o bastante para se dizer estáveis e em condições de tomar iniciativas de consumo num espectro razoável.

Ou seja, acho que sou interessante para as marcas. Colocando-me do outro lado do balcão – o do anunciante – a primeira questão que me ocorre é “onde encontro esse sujeito?”.

Pode parecer bobagem, mas, se pensar bem, não será por causa desse desconhecimento que o meu carro é o mesmo há mais de nove anos? É fato que não sou um aficionado por carros, mas, desde que pude pagar por um, nunca mais deixei de ter, pagando, aliás, cada vez mais, pelo seguinte. Isso é bom para o negócios de carros ou não é?

Mas, então, por que não tenho cruzado com eles nos meus hábitos de consumo de comunicação? Aliás, tenho, sim, nos anúncios-paisagem dos jornais de domingo e nos comerciais-paisagem dos intervalos dos telejornais.

Lembrei-me de outro “cruzamento”: no Facebook, uma série de vídeos em que alguma das chamadas celebridades discorre sobre a experiência de dirigir uma marca francesa, se não me engano. Assisti a um inteiro e pareceu que não era comigo. Talvez, não fosse mesmo, embora, como se sabe, a faixa etária da rede social teria subido, o que me incluiria como target da marca. Mas, por onde mais eu ando, perguntaria, como gestor de marcas, além dos telejornais, da leitura domingueira dos jornais e do Facebook, meios, aliás, em que, na forma, nenhum anúncio me tem feito avaliar uma possibilidade de consumo?

E pensaria: por que não pegar esse sujeito num ambiente mais exclusivo e a que ele atribua prestígio? Ajudo: ando também no Netflix, no Spotify e no Vicenews, de um lado e, de outro, na Piauí, no Le Monde Diplomatique, na Quatro Cinco Um e na Scientific American, por exemplo. Se nos meios, digamos, mais óbvios, nenhuma marca parece querer falar comigo do “jeito certo”, nesses últimos, então, parecem não quererem falar com ninguém de jeito nenhum.

Anos ou décadas atrás seria normal eu cruzar, por exemplo, com um anúncio do uísque preferido nos meus hábitos de leitura. Era agradável, fazia sentido. Inclusive, quando a marca concorrente se atravessava por lá também para me tentar para uma experiência.

Ou alguma marca de carro resolvendo lhes fazer companhia, como que compondo uma mesma “família”, cujo traço comum era reconhecer e valorizar o meu padrão de consumo de cultura. Onde foi parar essa inteligência da mídia?

Aparentemente, foi dispensada e substituída por algoritmos. Talvez a razão para que, viajante frequente, eu seja “punido” diariamente com uma avalanche de e-mails das companhias aéreas carregados do mais ordinário varejo ou tenha a minha timeline frequentemente invadida por postagens miseravelmente inconvenientes.

Enquanto isso, os meios que me dão mais prazer padecem de falta de anúncios.

Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing (stalimircom@gmail.com)

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