Farei uma avaliação dos fatos em dois períodos: até o ano de 2014 e de 2015 até junho de 2019. Acontecimentos marcantes até 2014: a internet vitimou a indústria fonográfica e decretou o início do fim da mídia impressa. Até 2014, a TV aberta, com exceção da Rede Globo e SBT, já vivia uma situação difícil cujas verbas das igrejas evangélicas e de concessionários mantinham a grande maioria delas, no modelo de arrendamento de espaços.

Acontecimentos marcantes de 2015 até junho de 2019: a partir de 2015, os veículos impressos foram atingidos e vimos o fim da Editora Abril. Os demais jornais e revistas atravessam grandes dificuldades. Também a partir de 2015, junto com o início da crise econômica, a TV aberta assiste uma queda significativa das receitas. Até o fim de 2018, houve redução de 35% se comparado ao ano de 2014. Os efeitos da queda foram muito sentidos, principalmente, nos anos 2017 e 2018. Para a análise é preciso dividir as famílias em duas classes econômicas: as de renda familiar de até R$ 3 mil mensal (classes C, D e E), que representa 75% da população, e aquelas cuja renda familiar mensal é superior a R$ 3 mil (classes A e B). Os novos veículos de comunicação, os meios digitais, já ocupam importante espaço, tendo a adesão de 25% dos mais ricos da população. Para estes a TV deixou de ser o meio mais importante de informação e entretenimento.

A TV aberta, naturalmente, continua sendo muito importante e vai continuar atendendo aos 75% da população. A relação dos ricos e dos pobres pode ser exemplificada com dados da realidade. No Brasil, temos um total aproximado de 69 milhões de domicílios. Deste total, apenas 17 milhões pagam pela TV, ou seja, menos de 25% têm capacidade de ter TV a cabo.

Naturalmente que o dinheiro de publicidade, principal motor da TV aberta, está em queda. Entre os anos 2015 e 2018, a queda das receitas foi de 35% real e deve chegar ao fim de 2019 a 40% em relação ao ano de 2014. O meio é composto basicamente por Globo, SBT e Record. Estas três, juntas, tiveram uma receita de publicidade de R$ 13,5 bilhões em 2018 e realizaram mais de R$ 1 bilhão de prejuízos. A Globo perdeu R$ 500 milhões e a Record, sem contar com a receita da igreja, outros R$ 500 milhões. O SBT empatou, o que não a torna sustentável. Considerando que os telespectadores da TV aberta são basicamente os 75% mais pobres da população, a qualificação das audiências de todas as redes já é a mesma. O que vai mudar é a quantidade de público atingido por cada rede. Somente vai valer a audiência. A conversa da qualificação vai morrer! Como sabemos a Globo tem 55% da audiência e 80% das verbas. O SBT e a Record, juntas, têm 45% da audiência e apenas 20% das verbas. Injusto!

A Globo, mesmo tendo faturado 80% das verbas nos anos 2017 e 2018, realizou prejuízos. Provavelmente este ano não será diferente. Para ajustar seu orçamento, está reduzindo custos e ainda vai precisar aumentar suas receitas. Essas medidas, que são realmente necessárias, podem implicar em perda de audiência e possíveis complicações comerciais, como por exemplo, um cliente como a Coca-Cola, que tenha 80% de sua verba na Globo e goze de um desconto comercial de 10%. Para que a verba possa chegar aos 100% emissora terá de oferecer à Coca-Cola um desconto de 20%. Se esse novo percentual de desconto for aplicado sobre toda a verba, a conta não fecha. O exemplo é apenas ilustrativo.

Vejam que situação interessante e verdadeira. Para um anunciante programar um comercial numa novela da Globo e conseguir 30 pontos de audiência, ele vai desembolsar R$ 800 mil. Se esse mesmo anunciante optasse por uma novela do SBT + Record + Band, pelos mesmos 30 pontos de audiência, iria gastar R$ 250 mil. Diferença absurda. Para que um anunciante tenha sucesso na sua campanha, precisa ter cobertura e isso a Globo faz bem, mas também precisa de frequência, e isso o SBT e a Record fazem muito bem. Quem financia o custo alto da cobertura da Globo é o baixo custo da frequência do SBT e Record. Isso não é justo! Para concluir, em muito pouco tempo o anunciante e sua agência vão se dar conta de que o ROI do SBT e Record é bem melhor do que o da Globo e certamente o mercado vai ficar diferente do que tem sido até então. Enquanto a Globo pretende repetir a Netflix e o Google, entendo que o SBT e a Record devam continuar fazendo TV aberta de boa qualidade.

Guilherme Stoliar é CEO do Grupo Silvio Santos (guilherme.stoliar@gruposilviosantos.com.br)