A notícia surpreendente da semana passada foi a compra da revista Time pela gigante do setor de tecnologia Salesforce. Não é a primeira vez que uma empresa do mundo digital põe os pés no tradicional universo da mídia impressa. Já em 2013, o CEO e cofundador da Amazon, Jeff Bezos, havia comprado o Washington Post.

E no ano passado, Laurene Powell Jobs, a viúva do lendário fundador da Apple, Steve Jobs, fez sua incursão no universo da mídia tradicional, com a compra de participação majoritária na revista Atlantic, por intermédio da sua organização filantrópica Emerson Collective. E aí vem o questionamento: por que essa atração dos bilionários do setor digital, tecnológico, pela mídia tradicional?

Sabemos que tais títulos de jornais e revistas são superprestigiosos e influentes, mas como negócio estão numa fase crítica, se equilibrando entre a tradição do impresso, em franco declínio, e a versão digital.

Uma equação difícil, ainda sem solução clara. Alguns desses veículos tradicionais já tentaram migrar definitivamente para o mundo digital, abandonando a versão física, mas, para a maioria, a conta não fechou e houve um retorno ao impresso, convivendo com o digital.

De fato, o mercado vê com certo desdém o futuro do veículo impresso, mas faz uso dele quando quer passar uma mensagem de maior peso institucional. O preto no branco, palpável, permanente, marcado numa folha de papel, ainda é a forma mais cabal de se posicionar perante o público, de forma marcante.

Isso porque, num mundo repleto de fake news, o maior asset desses títulos históricos é sua credibilidade e o seu “peso” na sociedade. Esse interesse, portanto, pode ser uma forma dessas megaempresas, que fazem fortunas no mundo digital, se mostrarem mais críveis e relevantes perante a sociedade, atrelando sua imagem a veículos de respeito.

Mas essa corda bamba entre o mundo físico e o digital está presente também no universo do varejo. Enquanto muitos apregoam o fim do ponto de venda físico, perante o inquestionável aumento do
e-commerce, a Amazon surpreende e adquire o Wholefoods, rede de supermercado com posicionamento fortemente plantado no comércio tradicional, principalmente de alimentos, privilegiando os fornecedores locais, em detrimento dos grandes produtores. Essa dualidade parece permear nossas vidas, fazendo-nos equilibrar na onda avassaladora digital, sem perder os pés no universo físico.

Um bom exemplo vem de um case da Apple, vencedor de Grand Prix no Cannes Lions 2018. Refiro-me ao case Today at Apple, quando a empresa apresenta uma estratégia de ações dentro de suas mais de 500 lojas físicas em todo o mundo.

Os consumidores que lotam suas lojas todos os dias têm a oportunidade de aprender mais sobre a utilização de produtos
Apple, desde o simples uso de iPhones até processos mais sofisticados de edição de vídeos e programação. Cada loja Apple, mais do que vender produtos, se tornou um centro de experiência.

Como diz a VP da empresa, que apresenta o case, “a loja física, com sua arquitetura e tijolos, é o hardware. As atividades organizadas dentro dela são o software. É preciso a conjunção dos dois para uma experiência completa”.

E talvez esteja aí um ensinamento importante. Caberá ao varejo físico se transformar em um ponto de experiência, mais do que um simples ponto de venda. Temos visto o crescimento do modelo híbrido, que faz uma ponte eficiente entre o mundo digital e físico. O mais promissor é: compre online, mas retire na loja.

Já há experiências também de fazer do ponto de venda apenas um showroom, onde se compram produtos em quiosques, por meio do e-commerce, recebendo depois sua compra em casa, ou retirando em um ponto estabelecido apenas para completar a logística.

A verdade é que estamos definitivamente mergulhados no universo digital, mas ainda não queremos nos livrar totalmente do way of life analógico. O futuro parece híbrido, com harmonia e equilíbrio entre esses dois universos. Quem viver, verá!

Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional de Agências de Propaganda) (alexis@fenapro.org.br)