Apesar das grandes mudanças nos consumidores, nos mercados e na formatação de muitos negócios, as principais fórmulas de marketing e propaganda continuam sendo as mais eficazes.

A intenção desta coluna, que agora se inicia, é a de ajudar a restabelecer a crença e a confiança em muitas das fórmulas e recursos do marketing e da propaganda que permanecem válidas como eram na maior parte do século 20, mas que sofrem descrédito e têm sido vistas como obsoletas e na iminência de perder toda sua utilidade e validade – razão pela qual elas têm sido desconsideradas sem maiores reflexões e, em muitos casos, tendem a ser substituídas por novas soluções que não entregam resultados com a mesma eficiência e eficácia.

No centro dessa crença na total revolução está o chamado universo digital, virtual, e seu potencial de substituir, com vantagens, grande parte do mundo físico, real. Algumas funções e tarefas, inclusive de marketing e propaganda, foram, de fato, trocadas em boa extensão, mas, na maioria dos casos, essa troca não deu certo: ou funciona parcialmente ou atua apenas como elemento modernizador e indutor de eficiência para práticas tradicionais mais eficazes.

Alguns exemplos de sucesso real da prática digital – não muitos, é importante ressaltar – foram promovidos como a comprovação de que tudo no marketing e na comunicação estaria se movendo inexoravelmente em direção a uma nova ordem e um novo mundo.

Essa, no entanto, é uma situação de ilusão coletiva, que resulta em uma imensa dose de miopia em relação ao “novo” digital, que funcionaria melhor, e ao “velho” tradicional, que perderia validade a cada dia.

Essa miopia não ocorreu e não está ocorrendo do nada, pois foi resultado de um processo. Além da natural crença no novo e nas suas possibilidades, houve uma razão prática para essa aposta na mudança radical: os novos profissionais e empresários, assim como alguns mais antigos, viram nessa perspectiva de revolução a possibilidade de melhorar suas oportunidades de trabalho e de negócios, inclusive no campo das publicações, da consultoria, das palestras e correlatos. Formou-se, de modo quase que espontâneo, uma corrente que vem promovendo e repromovendo, sem doses razoáveis de crítica, as maravilhas do digital e das mudanças radicais nos negócios, no marketing e na propaganda.

Uma observação mais atenta da realidade, porém, revela que não é bem assim, que muito do que é novo não funciona ou funciona pouco e boa parte do que é tradicional continua entregando de modo mais eficaz – inclusive porque o digital pode efetivamente modernizar e tornar mais eficiente o que sempre se fez. O digital tem maior potencial de mudar a forma de se fazer alguma coisa do que mudar sua essência e a razão pela qual se faz.

No centro dessa crença de que tudo que é novo funciona melhor do que aquilo que é tradicional está a ilusão de que o digital trouxe uma extraordinária capacidade de personalização e de precisão, sendo capaz de mensurar, em tempo real, os efeitos do que se faz sobre o mercado. A realidade porém, não é bem essa, começando pelo fato de que o marketing e a comunicação estão longe de ter a capacidade de atuar de modo tão pessoal e preciso. Além disso, a alegada mensuração do digital tem se mostrado bastante imprecisa, em vários aspectos, chegando mesmo a registrar doses importantes de equívocos e fraudes.

O objetivo desta coluna é justamente indicar como separar o joio do trigo, ajudar a resgatar uma reflexão mais racional sobre o que teve sentido mudar, o que deve ser mantido e até o que precisa ser resgatado do passado – modernizado em sua forma, mas mantido em sua essência. Porque, apesar das grandes mudanças nos consumidores, nos mercados e na formatação de muitos negócios, as principais fórmulas de marketing e propaganda continuam sendo as mais eficazes.

Rafael Sampaio é consultor em propaganda (rafael.sampaio@uol.com.br)