Justin Trudeau é um dos líderes políticos mais brilhantes que conheci. Aliás, terá puxado ao avô, o saudoso Pierre Trudeau que, em plena ditadura brasileira, desembarcou em Brasília e foi recebido por milicos de alto coturno calçando um prosaico par de tênis. O que num político convencional soaria como marketing, nos Trudeau parece natural.

Seja quando Justin Trudeau usa meias divertidas numa entrevista de TV, seja em questões mais graves como acolher, prontamente, a jovem saudita que fugiu da opressão machista de seu país, mesmo correndo todos os riscos. Isso é a cara do Canadá. Aqui, certas coisas não se discutem mais: inclusão social e aceitação da diversidade, por exemplo. São questões óbvias.

O que faz a vida muito mais confortável para a inteligência. Certamente, há racistas, homofóbicos, machistas e xenófobos no Canadá. Só que a gente não ouve falar neles. Diferentemente dos Estados Unidos (ou do Brasil), no Canadá, aparentemente, não pega bem pagar de fascista, não forma fã-clube na internet, não viabiliza candidatura vitoriosa em eleições.

Dos lugares que visitei no mundo – cidades de uns 26 países – foi em Vancouver que, pela primeira vez, senti “no ar” o conceito de empatia absolutamente integrado à vida cotidiana. Não significa dizer que por aqui não haja quem viva em “piores condições”.

A diferença, porém, é que esse tipo de assunto nunca é varrido para debaixo do tapete nem as pessoas ficam à mercê da caridade. Leio jornal todos os dias (desculpem, preciso de uma fonte de informações razoavelmente intelectualizada e minimamente confiável) e acompanho as narrativas das deliberações dos conselhos dos bairros, dos distritos, das cidades, sobre providências para corrigir desequilíbrios mais graves. Ou seja, há uma permanente fiscalização para que o país não se perca na falta de empatia.

Semana passada, a manchete da capa da edição de domingo de um dos principais jornais de Vancouver “denunciava” que muita gente anda sofrendo de dor de dente por deficiência do serviço público de saúde. Não imagino qual a dimensão dessa “epidemia” de dor de dente, mas seja ela qual for é suficiente para merecer o clamor de uma sociedade que não aceita que se negligencie o sofrimento alheio.

Dá para perceber que há uma linha de coerência, unindo fatos que são aparentemente díspares, como a preocupação com a dor de dente de uma parcela da população e a pronta acolhida da jovem saudita. Ou seja, é um país que não “vira a cara”, diante da dor e do drama “dos outros”. Há uma consciência de que a sociedade é uma cadeia interdependente e, portanto, ainda que se trate de um país essencialmente capitalista, o nível da qualidade de vida coletiva é que espelha o sucesso das atitudes de cada um.

Vancouver é uma cidade em que o indivíduo não tem como ocupação primordial proteger-se do outro: não há muros na frente das casas, não há segurança ostensiva nas ruas, não há detector de metais nas portas dos bancos… É interessante descobrir, estando aqui, que o contrário é inaceitável. E que o normal é ter um presidente como Justin Trudeau, por exemplo.

Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing (stalimircom@gmail.com)