ET. Tubarão. Indiana Jones. A Lista de Schindler. O Resgate do Soldado Rayan. Além de terem abocanhados várias estatuetas do Oscar e serem dirigidos por Steven Spielberg, um dos maiores cineastas ainda vivos, estes blockbusters têm em comum a maneira como habitaram (e ainda o fazem) nossa imaginação.

Vale a pena examinar outra película criada por ele no longínquo ano de 2001, mas que se mantem atual ao discutir a equação homem versus máquina que invade nossas vidas sem pedir licença. Estou falando de Inteligência Artificial (A.I em inglês).

A obra se passa no futuro, quando a Terra apresenta escassez de recursos naturais e rígidos controle de natalidade. Como resultado, humanos convivem com robôs de todos os tipos e são as máquinas que garantem o equilíbrio econômico do planeta.

O filme conta a história de David, o primeiro robô criança programado com sentimentos. Ele é adotado por um casal cujo o filho biológico está congelado, aguardando a medicina encontrar a cura para a sua doença. Após um tempo, o filho do casal se recupera e retorna para casa, criando um conflito entre as duas crianças para conquistar a atenção e o amor da mãe.

Nesse cenário conturbado, David é expulso de casa e convencido de que será aceito de volta caso se torne em um menino humano, ele parte então em uma longa jornada em busca da Fada Azul, a mesma que transformou o Pinóquio.

Trazendo o tema para os dias atuais, a adoção de soluções com Inteligência Artificial é crescente ao vender o conceito de que permitirá máquinas a pensarem como nós, otimizando uma série de processos e tornando-os mais ágeis e sem erros.

Ficou assustado? Calma, tem mais…o falecido físico Stephen Hawking disse que “todos os aspectos das nossas vidas serão transformados, e isso pode ser o maior evento na história da nossa civilização”.

Essas transformações já estão em curso e geram impacto em todas as indústrias. Nos deparamos, por exemplo, com carros autônomos, drones, impressoras 3D, assistentes digitais e até mesmo com diagnósticos médicos feitos por robôs. Segundo estudos da Universidade Stanford, até 2030, o nosso dia a dia estará modificado pela I.A. Outro relatório, assinado pelo Gartner, aponta que o valor de negócios global gerados pela Inteligência Artificial será de US$ 1,2 trilhão este ano, o que representa um aumento de 70% em relação a 2017.

Mas será mesmo A.I. a nossa próxima Fada Azul? Os robôs vão realmente substituir os humanos em seus empregos e demais atividades diretas? Quem vai comandar as tais criaturas com asas de libélulas?

É verdade que o advento de novas tecnologias tem permitido que empresas aumentem a sua produtividade e executem processos de negócios até dez vezes mais rápidos e, em média, com 37% menos recursos. Mas nada (repito, nada) vai substituir mentes humanas por trás do exército de máquinas que promete transformar nossa vida para melhor. Pelo menos não no mundo da comunicação.

Se você torceu o nariz para a afirmação acima, divido alguns casos recentes.

Para celebrar o Dia Mundial da Paz, o Burger King resolveu chamar seu arquirrival McDonalds para criar um sanduba em conjunto. Em anúncio de página inteira publicado no The New York Times, a empresa chegou a sugerir nomes para o aperitivo, como: McWhopper, uma combinação do Big Mac e do Whopper, carros-chefe das duas empresas.  Até um site foi criado para detalhar como a parceria teria vida.

Aparentemente, Steve Easterbrook, CEO da empresa do mascote que é um palhaço de peruca vermelha não gostou da ideia e, via redes sociais, agradeceu a iniciativa, mas sugeriu que cada uma seguisse seu caminho de maneira independente. Ironicamente ele terminou seu texto dizendo que “da próxima vez um simples telefonema seria o suficiente”.

A ideia do Burger King foi brilhante, apesar da recusa. Mais genial ainda foi a sacada do Giraffas, rede popular de fast-food, que publicou em seu Facebook estar à disposição para co-criar um BKBrutus, ou GiraWhopper. Em poucas horas a campanha viralizou e o Giraffas ganhou milhares de novos fãs, tornando-se case de sucesso.

Um segundo relato mais recente aconteceu neste primeiro semestre de 2018 e afetou a rede KFC, aquela do velhinho de barba branca e óculos redondo que todos queríamos como avô, e que vende frango frito em baldes. A empresa foi obrigada a fechar mais de três quartos das suas 900 lojas no Reino Unido por falta de frango causada por um de seus fornecedores. Ou seja, ela deixou de operar por falta de matéria prima.

Com o caos instalado, eles vieram publicamente pedir desculpas e, em suas mídias sociais, criaram uma campanha com sua sigla invertida para FCK! (F#@$%!, em português). Ao basear sua campanha digital no melhor do humor britânico, a empresa não só conteve a crise como reverteu rapidamente a situação. Semanas após o acontecido as vendas de nuggets e cia. Não só voltaram ao normal como cresceram dois dígitos.  

Em ambos os casos a pergunta que fica é se um robô, por mais moderno que fosse, teria a esperteza, sutileza e criatividade para criar algo do gênero. Será que máquinas autônomas resolveriam sozinhas as crises descritas acima? Onde entraria o componente humano para engajar os públicos afetados?

Sim, porque no final do dia a relação que temos, como consumidores, com empresas e suas marcas é tão forte quanto o cuidado que elas nos dão.

Não sou radical ou saudosista a ponto de dizer que está tudo errado. Ao contrário, prego que os comunicadores têm de ser multidisciplinares. Podem ter sua base em humanas. Mas também precisam saber de exatas. Devem ser especialistas em coleta e análise de dados, por exemplo. Devem saber extrair o melhor que a tecnologia pode oferecer ao criarem marcas e estratégias para protegê-las e promovê-las. Precisam entender do negócio para criar campanhas vencedoras.

No final do filme de Spielberg, David sai vencedor ao ouvir de sua mãe um “eu te amo”. É o que nós, consumidores, mais queremos ter todos os dias. É sermos respeitados, cuidados e amados pelas corporações e seus produtos que rondam nossa vida. E este cuidado deve sempre ter um toque humano. Pode até ser via Skype, FaceTime, WhatsApp ou qualquer outra engenhoca que ainda está por vir. Mas que o comando de voz venha de alguém como a gente e não de uma máquina.

Alexandre Alfredo é jornalista, mestre em comunicação corporativa e COO do Grupo CDI Comunicação e Marketing