Faleceu nesta segunda-feira, aos 89 anos, Eugenia Nussinkis, nome de grande importância na história da mídia no Brasil.  Gaúcha radicada no Rio de Janeiro – e que completaria 90 anos no dia 23 de agosto -, Eugenia foi a primeira mulher a ter um cargo de nível executivo na Gillette do Brasil, inspirando inúmeras profissionais que vieram depois. Foi responsável pela administração de vendas e depois cuidou da área de auditoria de mídia, avaliando o trabalho das agências de propaganda no uso dos investimentos da Gillette. Nessa missão, desenvolveu um software de auditoria, método inovador posteriormente adotado mundialmente pela Gillette, o que a levou a viajar aos  cinco continentes para implantar o sistema e treinar equipes locais. Sua gestão permitiu à Gillette obter relevantes resultados na otimização da sua verba publicitária.

Antes de entrar na Gillette, Eugenia trabalhou na mídia da Interamericana (antes de ser adquirida pela Salles) e da Alcântara Machado, e se transferiu para o anunciante justamente quando a Almap conquistou a conta.

Na década de 70, a profissional foi grande incentivadora do desenvolvimento de pesquisas de audiência, apoiando ao lado de nomes como Caio Domingues (então JWT) e Altino de Barros (McCann) a AudiTV  (depois adquirida pelo IBOPE) na adoção do “tevêmetro”, o primeiro dispositivo que permitia acompanhar o que os telespectadores  assistiam, numa época em que as TVs possuíam seletores mecânicos de canais e não controles remotos, marcando o início de uma nova era de profissionalização da atividade de avaliação de mídia.

Otto de Barros Vidal, sócio da NBS, lembra que Eugenia também foi grande incentivadora de patrocínios de futebol, tanto em rádio como na TV, destacando-se na Copa do Mundo de 1970, e deixou marcada sua importante participação na introdução do sistema GRP – Gross Rating Point, como o primeiro anunciante a se valer da técnica de mídia, que revolucionou a mídia brasileira na década de 70. No livro “Grandes Nomes da Mídia Brasileira”, editado pela Nobel e pelo Grupo de Mídia de São Paulo, consta que o GRP começou a se expandir no Brasil com Otto de Barros Vidal, que estava na Alcântara Machado, e Eugenia Nussinkis, na Gillette. O sistema fora importado dos EUA – exigido pela Gillette. Na McCann, que tinha parte da conta da Gillette, Altino Barros também realizava testes com a técnica.

Eugenia também foi muito atuante no Instituto Verificador de Circulação (IVC), e chegou a presidi-lo entre 1977 e 1978.

“Ela formou muita gente. Lecionava Pesquisa de Mídia no Instituto Bennett, no Rio de Janeiro, onde a conheci quando lecionei Pesquisa de Mercado, e construímos uma sólida amizade de mais de 40 anos. Eugenia tinha um estilo calmo e discreto de atuar e sua visão influenciou muitos profissionais de Mídia”, comenta Zilda Knoploch, CEO da Enfoque Pesquisa de Marketing, que a conheceu no início de sua vida profissional no instituto de Pesquisa IPOM, com Paulo Pinheiro de Andrade e Maxime Castelnau – que viviam falando sobre a “Eugenia da Gillette” e o que ela estava fazendo para viabilizar a pesquisa de audiência no Brasil.

arquivo pessoal Zilda Knoploch

“Eugênia já estava numa posição relevante, era admirada por todos, pelo seu trabalho inteligente e pela sua forma de manter suas opiniões e autenticidade, num ambiente ainda muito dominado pela figura masculina. Ela foi pioneira em romper as barreiras de gênero, alcançando uma posição prestigiada (e até temida!). Quando posteriormente fui trabalhar numa empresa do Grupo Gillette, a Jafra Cosméticos, ela foi minha coach, indicando os caminhos para enfrentar algumas armadilhas do ambiente corporativo. Aprendi com a Eugênia a nunca aceitar derrotas sem buscar alternativas, mesmo que ao custo de pressões e de desagradar quem quer que fosse. Ela me inspirou a  ter paciência para chegar aos objetivos, flexibilidade para lidar com imprevistos e, principalmente, nunca perder o bom humor e a cortesia.  Quando decidi abrir a minha agência de Pesquisa, ela me orientou e deu ótimos conselhos e seu exemplo norteou várias das iniciativas que desde então eu tomei.”, conta Zilda.

J. Roberto Whitaker Penteado, que teve Eugenia como cliente (e posteriormente amiga) no início dos anos 70 na Alcântara Machado, lembra que a conta da Gillette era considerada como uma “escola” exigente, em função dos sofisticados planos de marketing que vinham ao Brasil, da sede de Boston (EUA).

“Eugenia fazia uma supervisão de todas as atividades de comunicação da empresa – diria até mesmo, uma ‘marcação cerrada’- e, com isso, a qualidade dos nossos planos de comunicação e do planejamento de mídia era excelente”, comenta, lembrando que ela também lecionou na ESPM-Rio, comandada por ele entre 1978 e 2000.  

Ao se aposentar, há cerca de 25 anos, Eugenia abriu a Media Systems, empresa de auditoria de mídia para anunciantes de grande porte, usando o método que ela idealizou e se manteve ativa no comando da empresa até cerca de um mês.

Marion de Athayde, sua sócia, comentou na nota sobre o falecimento de Eugenia que a Media Systems “foi um sonho realizado por ela, que trouxe prosperidade e oportunidade de crescimento para todos”.

“Sentiremos a falta dela, não só pela honestidade, transparência de atitudes, consideração e envolvimento por todos que a cercavam. Não houve quem não fosse tocado pelo profissionalismo, pela força de vontade e capacidade de trabalho deste incansável ser humano.”, escreveu Marion.