Preencher o enorme vazio deixado pelo fim do Projeto Inter-Meios exigiu do mercado publicitário bem mais do que engenho, tempo, foco e investimentos substanciais. Exigiu um sentido de responsabilidade próprio de mercados maduros, grandeza (pois os resultados podem expor certas debilidades da publicidade brasileira), determinação (pois os problemas a serem superados contavam-se às dezenas, eram de diferentes naturezas e exigiam elevada convergência de diferentes interlocutores) e, acima de tudo, coragem, muita coragem. Era simples, muito simples, deixar as coisas como estavam, até porque sempre se podia sacar do bolso a medição do Kantar Ibope Media, virtuosa para muitas finalidades, mas de todo imprecisa para determinação do volume de investimentos em mídia num dos mercados publicitários mais dinâmicos do mundo.

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Mas valeu toda a história, toda a tradição quase centenária da publicidade brasileira em arregaçar as mangas e buscar resolver ela própria os seus problemas, usando pouco mais do que mesa, cadeiras e diálogo para identificar com precisão os seus problemas e buscar solucioná-los. Não foi assim que se cristalizou o modelo brasileiro de publicidade, o Conar e o próprio Cenp, que chega aos seus 20 anos de fundação em dezembro próximo, todos apoiados no instituto da autorregulação? Em meio a estas três iniciativas marcantes, muitas outras foram deliberadas por meios semelhantes: diálogo, convergência, a visão do todo superando os interesses imediatos e localizados, devidamente pesados e sopesados, mas subordinados ao bem maior, na percepção sempre correta, sempre construtiva, que quando o mercado ganha, todas as suas partes se beneficiam.

Foi assim que a publicidade brasileira se tornou um dos segmentos da economia nacional mais competitivos no plano internacional, mais reconhecidos pela sua criatividade, competência e, na sua quase totalidade, por compromissos éticos. Envolvidos num dia a dia turbulento e desafiante, não nos lembramos com a merecida frequência deste fato cristalino e indiscutível: nós, publicitários, estamos na proa da economia brasileira quando se fala em mercado global. Quantos outros segmentos da economia podem reivindicar esta condição, tanto mais no setor de serviços? O Cenp-Meios, com seu propósito de medir o investimento em mídia no Brasil, reuniu de forma primorosa estas virtudes da publicidade brasileira. Ele parte do instituto da autorregulação comercial e do que ela significa, somando o melhor da tecnologia e espírito voluntário das agências de publicidade. Tudo foi feito de uma forma ao mesmo tempo simples, segura e de máxima precisão – sabemos, agora, os montantes investidos por meio e região no nível dos centavos –, a ponto de termos um sistema sem paralelo no mundo.

A simplicidade com a qual o sistema pode ser descrito encobre, no entanto, dezenas de soluções brilhantes para problemas de todas as naturezas. Como garantir aos anunciantes, agências e veículos que os dados terão uso seguro e não individualizado? Como respeitar a legislação? Como salvaguardar a segurança de todo o sistema? Como harmonizar e dar transparência aos métodos e bases da pesquisa e à sua divulgação ao mercado? Estes e dezenas de outros problemas foram objeto de longos debates, quase todos eles realizados na sede do Cenp, em São Paulo, nos quais a boa vontade e, acima de tudo, a coragem do mercado publicitário prevaleceram, possibilitando o nascimento neste agosto de 2018 do Cenp-Meios. Os fundadores da moderna publicidade brasileira, aqueles que desde logo entenderam o valor da autorregulação, colocando-a acima dos seus legítimos interesses imediatos, estão felizes. Nós, aqui, agora, continuamos, a despeito de todas as dificuldades e incertezas de momento, honrando a sua herança.