A marca da rede varejista Havan, pouco conhecida fora dos estados do Sul, ganhou evidência a partir do ano passado, quando seu proprietário resolveu encampar a campanha de Bolsonaro. Ele fez, inclusive, ações de endomarketing, reunindo funcionários e sugerindo desemprego em massa caso seu candidato não vencesse. Outras marcas, através de manifestações explícitas de seus gestores, também acabaram associadas ao mesmo posicionamento, como a Riachuelo e a Centauro.

No caso da Havan, até hoje, ao entrar em suas lojas, você encontra os atendentes vestindo camisetas verdes com mensagens de ufanismo patriótico. Encorajados pela eleição de um candidato improvável que se propunha a fazer um governo de extrema-direita, esses empresários terão vislumbrado no fato uma tendência de marketing. Até 31 de março estavam reinando sozinhos na “publicidade com lado”. Foi quando a cerveja Rio Carioca publicou anúncio, sugerindo que não fosse bebida em comemoração ao golpe militar de 1964, muito enaltecido pelo presidente eleito. Inaugurava o conceito de marca de oposição. Mais recentemente, o “lado” da cervejaria ganhou a companhia do Burger King, que convidou o casting do comercial do Banco do Brasil, vetado por Bolsonaro, para gravar um anúncio.

Em mais de 40 anos de carreira, não lembro de ver marcas assumindo posições políticas de maneira tão explícita. Isso é diferente, por exemplo, do que fazia a Bombril, através de interpretações de seu garoto-propaganda, Carlinhos Moreno. Ali não havia posicionamento político, apenas o uso de oportunidades de adotar o senso comum como “acabar com a sujeira na política”. Agora não. Agora estamos falando de assumir uma postura diante do governo e assinar embaixo, custe o que custar. Vale a pena? Se considerarmos o momento em que Bolsonaro encarnou o moralizador destemido terá sido conveniente para certas marcas ousarem e seguirem a manada. Por que é ousadia? Porque não se sabe o dia de amanhã e as marcas têm objetivos perenes. O fato de começarem a pipocar mensagens de marcas em “oposição” demonstra isso. Provavelmente detectaram sinais de que estarão melhor situadas “contra” do que “a favor” do governo. Porém, em tempos de grossa libertinagem nas redes sociais é preciso tomar cuidado redobrado.

Desde que algumas marcas assumiram essas posições de pró e contra, já recebi na minha timeline inúmeras prováveis fake news que fariam ruborizar o diabo. Desde a denúncia de um escandaloso caso de sonegação fiscal, devidamente perdoado como “retribuição”, até uma foto, naturalmente em plano fechado, de um hambúrguer recheado de larvas. Acredito que o marketing das marcas não está preparado para encarar essa guerra de guerrilha. Basta ver como lidam com os problemas verdadeiros denunciados nas redes: quase sempre de maneira atabalhoada, que só faz aumentar a percepção de culpa. Diferentemente do marketing político, calejado por um longo histórico de brigas sem regras, o marketing das marcas está acostumado a tratar apenas com o lado positivo das relações. É, portanto, no mínimo curioso ver como a “publicidade com lado” avança. Se como tendência ou apenas como tentativa pontual.
Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing (stalimircom@gmail.com)