Afinal de contas, quem precisa de marcas para sobreviver? De acordo com mais uma edição da pesquisa do grupo Havas sobre marcas relevantes/significativas, as pessoas não se incomodariam se 74% delas desaparecessem do planeta. O resultado é idêntico ao da pesquisa realizada há dois anos, e revela uma realidade alarmante: a grande maioria das marcas – ou empresas – não faz a menor diferença na vida das pessoas. Outro dado interessante: menos de 27% das marcas têm impacto positivo na qualidade de vida e no bem estar das pessoas, que em sua maioria (75%) espera que elas desempenhem exatamente esse papel. No Brasil, o volume de pessoas com essa expectativa é ainda maior: 86%. E 85% consideram que empresas e marcas deveriam estar ativamente envolvidas em solucionar problemas sociais e ambientais.

Há hoje forte desconfiança dos brasileiros nas empresas e marcas em geral, especialmente na comunicação. Por outro lado, empresas socio e ambientalmente responsáveis merecem mais confiança (75%). No geral, os entrevistados consideram relevante o conteúdo produzido por apenas 40% das 1.500 marcas participantes. A eficiência em conteúdo está diretamente ligada à relevância da marca. E há, acredite, uma importante correlação entre relevância das marcas e lucro e resultados comerciais. Mais uma razão para prever a morte de quem só está por aqui a passeio.

A grande crise de confiança que afeta a política se estende às empresas sem propósito, que não agregam valor por razões óbvias. Não existe milagre capaz de salvar quem não tem nada a dizer ou realizar. Simples assim. É um dilema gigantesco capitalista: como dar lucro e crescer, cumprir metas, ser competitivo e ser ao mesmo tempo… humano?

Como afirma a estrategista criativa Louisa Heinrich, em entrevista nesta edição (página 31), o maior problema que enfrentamos hoje é o imenso desequilíbrio entre tecnologia, dinheiro e humanidade. Empresas e marcas passaram tempo demais se preocupando em acompanhar evoluções tecnológicas sem conseguirem, de fato, ganhar relevância junto aos clientes (as pessoas) e, com isso, gerar valor para os próprios negócios.

Os leitores ávidos de Fast Company, Kevin Kelly e afins, e muitos dos “pseudoinovadores” desse mundo quase paralelo das startups de hoje andam concentrando suas energias excessivamente em “problemas”, em sua grande maioria, totalmente desimportantes. Quem precisa, desesperadamente, de entrega de comida japonesa no meio da madrugada? Para que serve um aplicativo que ensina às crianças o conceito de empatia?

Não se trata de algo que nós, seres humanos, mães e pais, podemos fazer muito melhor – ou pelo menos deveríamos estar fazendo? Por que criar um aplicativo que elogia funcionários a partir do cumprimento de determinadas metas prestabelecidas? Não seria melhor que seus superiores os olhassem nos olhos e os elogiassem diretamente?

Temos a tendência de nos apaixonar pela tecnologia e acreditar que ela pode resolver tudo. Só porque podemos fazer algo, não significa que devemos fazê-lo. É um bom mantra para a humanidade. Ainda somos, todos, muito ignorantes para essa perspectiva do papel das empresas e das marcas no mundo, ainda estamos tateando, mas sinto informar que o que se enxerga como futuro “já é”, como se diz. O estudo do Havas é apenas mais um alerta: seja lá o que estivermos fazendo neste momento, precisamos fazer melhor. Muito melhor.