Lula Vieira

Estou falando muito sério: e as cotas para velho, idoso e coroa, onde ficam? Juro que não há nenhuma brincadeira, nenhuma armação neste meu manifesto.

Não estou sendo, nem de longe, partícipe (esta palavra não é coisa de velho, é só coisa de informado) de minimizar a justa, verdadeira e fundamental luta das minorias contra o preconceito.

Eu estou ficando irremediavelmente velho, idoso, tenho cabelos brancos e pouquíssima agilidade. E não entrei no assunto vigor sexual, o popular pau duro, cuja saudade já está junto aos velhos sambas de Noel. Mas estou criando (juro) tão bem, ou melhor, do que no tempo em que ganhei tantos prêmios que fizeram meu prestígio e minha capacidade de ser ouvido.

Mas estão usando minha idade e meu cabelo branco da mesma forma que o fazem com aqueles classificados como judeus, negros, gordos, periféricos e gays.

Usam para discriminar. Sim, sei o quanto essa minha tese pode ser reduzida a pó por qualquer ativista. O que estou falando é raso, primário e não reconhece a história que pesa sobre os excluídos.

Perdão, perdão, perdão. Falo da dor da patada do preconceito. Falo do que dói quando ele se manifesta. Em lugares que você acha que o preconceito jamais pode virar argumento, eu ouvi de um adversário, num determinado foro, que a minha opinião não tinha valor, pois eu era um velho ultrapassado.

Frase literal: “Ninguém mais te leva a
sério, você está velho!” Pois é, essa criatura poderia dizer: “Tu és negro, tu és bicha, tu és judeu”.

Como, ai de mim, não tive a sorte de
ser judeu, meu lado viado não teve supremacia (ainda que por pouco) e nasci branco, calei-me.
Guardei uma lembrança: doeu-me profundamente. Ninguém se descobre velho sem dor (e não se escreve isso sem trocadilho). Eu quase tenho certeza de que dos publicitários de sucesso eu fui o que nasceu mais pobre.

E fui seguramente o mais gordo, o menos sensual e o pior dançarino. Então me permitam dizer que eu sei o que é sofrer preconceito.

Mas, por mais babaca que possa ser o que eu vou falar a seguir, tenho certeza de que algo posso falar aos pretos, gordos, bichas, tortos, vesgos, peitos caídos, quatro-olhos, paus pequenos, filhinhos de mamãe, perebas, pobres e bregas.

Nós temos de entender que assim é a vida. Achar que nossa dor é melhor e mais fundamental que as dos outros é também um preconceito. Vamos, sim, lutar pelos nossos iguais.

Mas, antes, lutemos por nós. Ou seja, lutemos para vencer dentro das regras do jogo. Lutemos para que nosso sucesso pessoal possa ajudar a ser também a vitória da turma toda.

Isso quer dizer que se alguém te der uma chance, vá com tudo. Perder essa chance não é apenas perder a sua chance pessoal. É, de alguma forma, desperdiçar a oportunidade (seja você quem for) de um negro, de um homossexual, de um gordo, de um feio, de um pobre e de um troncho.

Ganhe em nome dos excluídos. Sei lá se isso é assim mesmo. Mas me deu vontade de pensar dessa forma. É porque estou em plena campanha. Eu quero minha cota.

Quero que eu tenha espaço no coração das meninas que, por exemplo, no metrô, se levantam e me dizem: “O senhor pode sentar aqui!” Sou grato pela delicadeza, mas reivindico que nos corações delas exista cota para idosos.

Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor (lulavieira@grupomesa.com.br)