Mas e se todos escancarassem o coração, deixassem de lado eventuais divergências, abrissem mão de pequenos conceitos, entendimentos, certezas, mesmo assim você acha impossível…? Sim, absolutamente impossível. Agora, se você dispõe de tempo, energia e dinheiro sobrando e diverte-se em perdê-los, aproveite. Tô fora! A juventude, a loucura, a paixão, o devaneio e o delírio ensandecem os gestores de fundos. Como sempre estão com pressa, diferentemente dos jovens que patrocinam, ainda não cruzaram a casa dos 30 e têm todo tempo do mundo pela frente.

Resistem o máximo que podem, engolem seco, mas, em algum momento, cravam de morte projetos de autores expulsos aos berros e gritos de suas obras. Como um dia ocorreu com Jobs na Apple. E, depois, ele voltou. João Ricardo, 35, e José Eduardo, 33, protagonizaram nos últimos dois anos a grande guerra da internet no Brasil. Seus algozes, os fundos americanos Accel, Tiger e Insight (Priceline). Foi assim. Depois de trancar a matrícula na faculdade de direito, João Ricardo decidiu acompanhar o lutador Roger Gracie na abertura da academia Gracie na cidade de Londres. Treinava e dava aulas de jiu-jítsu. Voltou ao Brasil em 2005. Fundou um primeiro comércio eletrônico – Apetrexo – e, em 2011, com seu irmão José Eduardo, “construiu” o Hotel Urbano.

Em três anos tornou-se, o Hotel Urbano, o queridinho dos investidores. Decolou na vertical. Em pouco tempo, uma injeção de US$ 150 milhões dos três fundos americanos, e, segundo aqueles cálculos que algumas pessoas fazem e quase todas as outras abrem a boca e acreditam sem pedirem comprovações, foi avaliado em R$ 2 bilhões. Em 2015, bateu na casa de 1 milhão de clientes e um faturamento de R$ 550 milhões. Mas a relação com os investidores era insuportável. Foram sacados do comando e tiveram de se conformar apenas como acionistas. Em 2016, o Hotel Urbano veio abaixo. Vendas caíram 70%. Investidores acenaram a bandeira branca e celebraram o armistício com os irmãos. Até quando? O suficiente para recuperarem o investimento e caírem fora. Há dois meses, João Ricardo, correndo riscos pelo contrato de confidencialidade assinado no armistício, abriu a boca. Revelou e confirmou, como tenho insistido, que empreendedores e investidores olham em direção opostas, e alimentam expectativas diferentes e antagônicas. Os primeiros acreditam que felizes chegarão ao lucro. Os segundos abominam a tal de felicidade.

João Ricardo conversou com Bruno Vieira Feijó da revista PE&GN:

1 – “Na minha cabeça, startup é estado de espírito, não números. Para os fundos, o DNA de startup era incompatível com quem já tem 600 funcionários e fatura R$ 500 milhões…”.

2 – “Exigiam uma gestão mais profissionalizada e começaram a contratar funcionários mais experientes vindos de consultorias estreladas… tivemos de receber aqui bonitões de terno e gravata que ganhavam R$ 1 milhão por ano…”.

3 – “Perdemos as pessoas que compartilhavam o sonho de construir de forma sustentável e perene uma marca online referência em viagens na América Latina”.

4 – “Existe um comportamento fundamental que todos precisam ter: o de líder servidor. Quem não serve o outro não tem moral para pedir ajuda em momentos cruciais. Não terá um programador a seu lado virando a noite para construir ou corrigir um projeto bacana. Os bambambãs de gravata que vieram para cá, com 20 ou 30 anos de mundo corporativo nas costas, eram ótimos em planejamento e estratégia. Falavam bonito, faziam um milhão de apresentações no Power Point, mas zero na execução…”.

5 – “Qualquer curso pode ensinar a fazer PPTs e planilhas, mas nenhum ensina características como atitude, caráter e postura de dono. O nosso negócio é feito de pura execução, mão na massa!”.

Deu pra entender? Não combina, não carbura, não orna, não multiplica, não prospera, não glorifica, não viceja, não floresce, não nada. Só aborrece.

Em passado recente, de triste lembrança, sofrimento, escravidão, porrete, chicote, terno, gravata, power point, gomalina, bico fino, davam dinheiro.

Acabou! Next…

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing