Dá para compreender por que a propaganda era tão rejeitada e mal falada, na primeira metade do século XX, quando nos deparamos com peças de publicidade no formato de anúncios, ou cartões postais, que quando não são duvidosos na sua caracterização de falsos testemunhais, são frágeis na apresentação dos elementos que pretendem sustentar um argumento de vendas. Um desses cartões postais de propaganda que circulou no Brasil, em inícios do século referido, mostrava a tradicional imagem de Deodoro da Fonseca, montado a cavalo, com o braço esticado exibindo o chapéu, proclamando a República.

Tudo bem. Pois no reverso do então chamado bilhete postal o anunciante conta uma história da carrocinha: diz que Deodoro da Fonseca antes de proclamar a República pediu, por favor, uma água mineral Lambari e cita um livro como referência. Se o livro existiu não sei, não encontrei a referência citada numa busca pessoal que fiz no Instituto Histórico e outra busca digital na Biblioteca Nacional. Não acredito na tal justificativa e se não cita o autor, dá para desconfiar.

Mudando de água para cerveja em 1922 a cervejaria Antarctica resolveu fazer um institucional baseado na repercussão na imprensa da histórica viagem dos aviadores portugueses Gago Coutinho e Sacadura Cabral na sua épica travessia do Atlântico Sul. Na peça de propaganda publicada diz que os famosos aeronautas teriam dito: “A cerveja Antarctica é incomparável na sua pureza e deliciosa no seu sabor”. E “prova” mostrando suas assinaturas, autógrafos, estes, que na época foram publicados em revistas e jornais, em outro contexto. Se o testemunhal existiu de fato, palmas para o criativo, se foi inventado, palmas também pela oportunidade. Era legal. Naquele tempo o direito autoral não existia.

Grades vultos da história do Brasil foram “induzidos” a fazerem testemunhais de produtos, dos quais eles tomaram conhecimento depois de publicados. Era mentira. Ruy Barbosa foi uma das vítimas desses testemunhais forjados, garoto propaganda dos chocolates Lacta e do Cinzano. O presidente Afonso Penna anunciava nas revistas os cigarros “Mistura 80” da fábrica Leite & Alves. Até o Papa Pio IX foi “induzido” a recomendar uma marca importada de chocolate em pó: Cocoa. O famoso tenor Enrico Caruso sugeriu o xarope de “Alcatrão e Jatahy” de Araújo Freitas e nosso grande poeta Olavo Bilac testemunhou a favor do xarope Bromil que o teria curado das afeições do peito; morreu justamente das afeições do peito.

Esses antecedentes de testemunhais inventados me deixam com um pé atrás, em relação aos dois casos citados, o do Marechal Deodoro e o dos aviadores portugueses. Cito outro, também com impressões digitais de testemunhal forjado: o cartão postal que circulou por volta de 1911 com o rosto do Presidente da República Campos Salles, em que o primeiro mandatário recomenda provar os vinhos de Adriano Ramos Pinto, importador de vinho do Porto. Ramos Pinto era bom de marketing promocional. De olho no mercado brasileiro, teria presenteado com o seu produto os aviadores aqui citados, antes de partir de Lisboa. Uma ativação inteligente se é que ele conseguiu explorar a situação, quem sabe publicando algum anuncio com o registro. Não sabemos.