Ricardo Rozzino, Célia Catunda e Kiko Mistrorigo são donos da TV PinGuim, que completa 27 anos, produtora de conteúdo audiovisual de animação responsável pelos sucessos do peixe detetive que consegue viver e voar fora d’água com um capacete que parece um aquário, o Peixonauta, e da menina cientista protagonista do Show da Luna. A produtora, que cresceu mais de 40% em 2016, tem planos de expansão no mercado internacional, que responde por 50% da receita da empresa, com exibição em cerca de 100 países.

Em julho, lança o longa-metragem do Peixonauta, que estreia no cinema em 3D. A animação foi um divisor de águas da produtora, que ingressou no mercado internacional com a série e marcou um novo momento da animação brasileira. Concebida para ser uma série de 52 episódios, de 11 minutos cada um, a produção foi vendida para 82 países, de México, Chile e Argentina a Turquia; de Sérvia e Albânia ao sultanato de Brunei. Nos Estados Unidos, ele entrou através de dois nichos: pelo canal em espanhol do Discovery e pelo catálogo da Netflix. Chegou também à Europa.

Sem capital próprio suficiente à empreitada, a TV PinGuim teve de captar recursos em suas mais variadas formas e modelos. Uma miríade de receitas, que Rozzino conta na entrevista concedida à Propaganda. Ele fala da receita de sucesso, das dificuldades de se fazer animação no Brasil e das novidades para esse ano. Confira.

 

 

Haverá nova série do Peixonauta, animação que foi um sucesso da produtora?

O Peixonauta completa oito anos em 2017. Produzimos um longa-metragem do Peixonauta em 3D, que estrearemos em julho no cinema, um filme tecnológico. As duas séries que fizemos foram exportadas para quase todos os países das Américas, além de muitos países da Europa, África e Ásia. Trabalhamos muito no mercado internacional, como forma de viabilizar os projetos.

 

Qual a fórmula para conseguir internacionalizar uma animação?

Procuramos fazer um produto mais neutro possível, que conte uma história da forma mais universal possível. Muita gente achava que o Peixonauta nem era brasileiro, as pessoas foram descobrindo aos poucos, porque, dentre outras coisas, são produtos feitos com bastante cuidado no sentido do capricho tecnológico, áudio e som em alta definição.

 

E o Show da Luna, outro sucesso da produtora?

O Show da Luna estreou nos Estados Unidos em agosto de 2014, só depois é que veio para o Brasil, no fim do mesmo ano. Fizemos uma pré-venda para a NBC, ainda não estava nem pronta.

 

O Show da Luna também está presente em outros países?

Está em todos os países da América em mais de uma plataforma, no digital. Estreamos no Chile, no fim do ano passado, em TV aberta. Ainda está no Reino Unido e em dois ou três países africanos. Vendemos para Portugal, país para o qual nunca havíamos vendido nada. Está presente também em muitos países asiáticos, de 80 a 100 países. É bastante conhecida no mercado mundial. Já Peixonauta foi o primeiro produto que fizemos pensando em atingir o mercado global, então tivemos uma curva de entrada mais difícil. Éramos menos conhecidos, mesmo assim conseguimos uma penetração grande. São produtos que se mantêm vivos por muito tempo e com grande alcance.

 

Quais os produtos da TV PinGuim?

Temos o foco no segmento infantil, no pré-escolar. A ideia é fazer um produto que possa divertir nessa faixa etária que muda tão rápido, nosso público vai de bebê de colo até seis anos. Antes do Peixonauta, havíamos feito o De Onde Vem?, uma série pequena que só passa no Brasil. Ainda está disponível e passa na TV Escola e na TV Cultura. Fizemos muita coisa no passado que ficaram restritas às TVs educativas.

 

Então podemos afirmar que o Peixonauta e o Show da Luna foram divisores de água na atuação da produtora?

Sim. Principalmente o Peixonauta. Pode-se dizer que foi um divisor de águas na animação brasileira. Antes do Peixonauta, não tinha nada ou quase nada feito de maneira mais global, ampla. Uma série com uma quantidade relevante de episódios. Porque se fizer 10 é difícil vender, vai ficar reprisando isso? Fizemos 52, depois mais 52. Hoje temos 208 episódios do Peixonauta.

 

Quanto tempo demora para produzir uma animação?

De um a dois anos, com 52 episódios. Passa pela questão de financiamento. Temos bastante dificuldade com isso, como todas as empresas brasileiras. É extremamente difícil obter recursos para produção.

 

Por quê?

Porque ainda não temos uma indústria robusta, consolidada. Dependemos muito do mercado internacional, que representa 50% do nosso faturamento, e é o que mais pode crescer. Nosso financiamento vem das licenças de exibição, das plataformas digitais e licenciamento de produtos.

 

A Lei 12.485, que obriga a TV por assinatura ter em sua grade de programação pelo menos 3 horas e 30 minutos por semana de conteúdo nacional e de produção independente, impulsionou o crescimento da produtora?

Sim, bastante. Embora seja muito difícil captar recursos incentivados. Os valores não resolvem. Nós misturamos venda para os canais, um pouco de recursos incentivados, vezes mais outras menos, e utilizamos uma linha de financiamento do BNDES chamada Procult. Fomos a primeira empresa do Brasil a pegar dinheiro emprestado para produzir uma série. A vantagem disso é que se financia como se fosse uma indústria, com taxa de juros bem baixa, diferente dos bancos comerciais, que cobram 12% ao mês. Além disso, obtemos receitas fora do Brasil. É mais ou menos assim que funciona nossa engrenagem.

 

Novidades?

Lançaremos o filme do Peixonauta em julho. Estamos produzindo mais uma temporada do Show da Luna. Além disso, estamos começando a produzir uma série nova para televisão, que deve chegar em 2018. É infantil, relacionada à música. Chama-se Ping e Pong, nome provisório. Trata de como a música faz parte da nossa vida, até de forma imperceptível. Os ritmos de uma máquina de costura, uma pessoa andando, os sons que ouvimos: de pessoas trabalhando, os ventos pelas plantas. Tentar fazer com que se perceba que isso faz parte da natureza humana. A música é um fenômeno incrível. Ninguém sabe direito porque gosta de música, queremos brincar um pouco com os sons ao nosso redor. Tratar música de forma sofisticada, rica. Como um universo maravilhoso.

 

Quantas pessoas trabalham na produtora?

50 pessoas. Temos uma maneira bacana de trabalhar aqui, sentamos os três sócios na mesma sala, eu estou mais preocupado com o caixa, e eles no episódio. Nós nos ajudamos muito.

 

De onde nascem os insights à animação? Por exemplo, o Show da Luna trata de igualdade de gêneros, com o pai dividindo as tarefas do lar?

Geralmente quem pensa em tudo são o Kiko (Mistrorigo) e a Celia (Catunda), que são os criadores e também dirigem. Temos um pipeline de produção gigantesco, muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. Esse é o papel importante além de criação, que o Kiko e a Célia desempenham muito bem, de estarem próximos. Tem um pouco de arte isso, às vezes queremos pegar as coisas no ar. Por exemplo, com o Peixonauta começamos a tratar de sustentabilidade quando ainda não era um assunto conhecido (2004/2005). Luna está ligada a ciência, tecnologia e matemática. Como no Brasil temos dificuldade com esse tema nas escolas, optamos por colaborar e ficar longe dessas coisas de princesa, aspectos mais fúteis. Então, mulher é protagonista, menina é cientista ou qualquer coisa que queira ser.

 

A TV PinGuim cresceu em 2016?

Sim, crescemos mais de 40%, mas poderíamos ter crescido ainda mais. Em 2015 crescemos 50%. De 2012 para cá, a empresa mudou de patamar. Esperamos manter esses resultados neste ano.