O nome grego, Alexis, aparece seguido de um sobrenome suíço, Thuller, e outro italiano, Pagliarini. Alexis Thuller Paglierini, natural de Jaboticabal, no interior de São Paulo, percorreu um caminho inusitado e “natural” até brilhar no mundo da propaganda e do marketing. 

 O avô materno era suíço. Daí o Thuller. Pagliarini vem do pai, o homem que o batizou Alexis, nome de origem grega, em homenagem a um personagem de um livro – não se sabe qual. Nascido no interior paulista, na calorosa cidade de Jaboticabal, Alexis Thuller Pagliarini andou um tanto por aí até se sentar, há pouco mais de três anos, na cadeira de diretor-superintendente da Fenapro, instituição que reúne cerca de 11 mil agências de todo o país. Como ele mesmo diz, a sua vida profissional começou totalmente por acaso e fluiu de maneira “natural”.

 O menino de Jaboticabal acreditava não ter muitas opções por lá quando precisou se decidir por uma carreira. “Fiz a educação formal na cidade e, na hora de optar pelo vestibular, escolhi engenharia. Naquela época, não havia muitas opções.” Com essa ideia, aos 18 anos Alexis seguiu para a capital paulista a fim de fazer um curso pré-vestibular, o que lhe rendeu uma vaga em Barretos – a essa altura, os seus pais moravam na cidade. “Estudei dois anos nessa faculdade particular até me transferir para São Paulo, para a Faap, onde concluí o curso.”

 Antes da conclusão, Alexis já estagiava em uma empresa de um familiar. Destino mais ou menos certo porque esse parente tinha em mente o jovem como seu sucessor. Mas a vida deu voltas. Um dia, no café da Faap, um desconhecido abordou o então estudante para convidá-lo para um teste de comercial. “Disse não, que meu negócio era outro. Mas o cara insistiu, falou que eu era o tipo perfeito, mostrou um layout da campanha. Continuei dizendo não até ele mencionar o cachê. Era quatro vezes o que eu ganhava em um mês como estagiário. Aí, mudei de ideia”, conta.

 

Era um teste para a marca Cointreau, lembra-se. No entanto, Alexis não passou. Por ironia da vida, as fotos recusadas circularam no mercado e, poucos dias depois, ele foi chamado para outro comercial. “De repente, em seis meses eu tinha comprado um carro zero. Fiz anúncio de tudo, quem pagava mais era a Souza Cruz.” Pelas contas de Alexis, foram mais de cem comerciais e umas 400 fotos publicitárias – desfile ele não fazia. “Eram outros tempos, a gente fazia amizade com fotógrafos, produtores e esses caras telefonavam para
um trabalho. Toda essa dinâmica descortinou um mundo maravilhoso para mim. Um mundo de gente bonita e de glamour, muito mais atraente que o da engenharia”, afirma.

 Mesmo assim, Alexis continuou os estudos e o estágio até que um fotógrafo para quem ele sempre trabalhava fez um desabafo que mudou sua vida. “Ele me contou que estava com um problema por ter pegado uma campanha grande da Alpargatas para 7 de Setembro – “Pise firme nesse chão que é seu”. Seria um desfile e ele precisava selecionar crianças com tamanhos diferentes e crescentes, vesti-las, fazer contratos, uma produção complicada. Resolvi fazer esse trabalho, havia um dinheiro bom envolvido. Eu namorava uma garota, também modelo, e montamos uma empresa para tocar o projeto. Era coisa de 150 crianças, um trabalho insano. Entrei no negócio como empresário, dono da Persona Assessoria Publicitária, que se propunha a dar total suporte às produções publicitárias.”

 

O escritório foi montado em um andar do Conjunto Nacional, na avenida Paulista, e a engenharia acabou ficando de lado. “Terminei o curso, mas tomei a decisão complicada de me arriscar em outro negócio. Meus pais não gostaram da ideia, mas tomei esse caminho de forma consciente.” Tão consciente que, mais tarde, Alexis fez pós-graduação em marketing pela ESPM. Tudo ia muito bem, mas uma hora a Persona começou a dar muita dor de cabeça: administrar funcionários, contas a pagar e receber e produções desgastantes. Por isso, Alexis afirma que acabou vendendo a empresa e seguindo para a agência de um amigo.

 

Era a Coisa Nossa Propaganda, onde permaneceu um tempo até um dos sócios deixar a sociedade para se tornar funcionário da Honda. Tempo depois, Alexis foi convidado para ser coordenador da Honda Way, departamento que criava roupas e acessórios. “Fui lá falei com o diretor de marketing e assinei o contrato. Tudo muito rápido e natural.”

 

Foram sete anos na Honda. “Eu me identifiquei tanto com a empresa que cheguei a ser presidente da associação dos funcionários da marca. Uma fase de trabalho intensa. Aprendi muito com os japoneses, coisas que levo para a vida.”

 

Por exemplo? “Eles gostavam de ver o planejamento integral numa única folha de papel, queriam bater o olho e enxergar o planejamento. Naquela época, muitos japoneses mal falavam inglês e aprendi a fazer aquele resumo de maneira eficiente.”

 Em seguida, Alexis assumiu a área de promoções, eventos e merchandising da Honda e se aprimorou ainda mais na síntese dos planejamentos. “Só não estive no Japão por uma bobeira minha. Teve um momento em que me perguntaram: ‘Quer ir para o Japão ou Estados Unidos?’ Como nunca tinha ido aos EUA, preferi ir para lá. Depois não pintaram outras oportunidades.”

 

Alexis estava contente na Honda, mas, certo dia, uma chance de trabalhar na lendária DPZ caiu em seu colo. “Se a DPZ é hoje uma superagência, naquela época era o desejo de dez entre dez publicitários. Era o Olimpo”. Ele exagera? Seja como for, o executivo conta que
Miguel Barros, então gerente de promoções da Souza Cruz, o maior cliente da agência, com quem se encontrava recorrentemente nos eventos da Honda, lhe disse que estava com problemas no Rio de Janeiro porque
a DPZ não tinha uma divisão de eventos na Cidade Maravilhosa. “Ele achava que eu seria o cara ideal para esse cargo, mas não acreditava que eu sairia da Honda.
Respondi: ‘Não fale duas vezes. Estamos falando de DPZ, Souza Cruz’. Ele, então, falou que iria me indicar.” Coisas que só ocorrem com bons profissionais e sujeitos boas-praças.

 

Na semana seguinte, o diretor da DPZ do escritório carioca telefonou para Alexis. “Ele queria conversar comigo, disse que a Souza Cruz tinha me indicado. Mas eu não sabia que estava com essa bola toda e pedi um salário duas vezes maior do que eu ganhava na Honda. Mais tarde descobri que poderia ter pedido ganhar quatro”, lembra-se, sem arrependimentos.

 

A DPZ era o mundo dourado da propaganda e Alexis foi morar no Rio com a família – ele já tinha se casado com a namorada que o ajudou a montar a Persona, Rachel, e era pai de dois meninos. “Estamos casados até hoje”, avisa. Foram cinco anos na DPZ como diretor da divisão de promoções e eventos. “Adorei essa etapa, talvez a melhor da minha vida.”

 

Por um instante, Alexis se emociona ao contar que, anos mais tarde, perdeu o filho mais velho em um acidente de carro. “Um trauma absurdo, uma paulada difícil de digerir. Meu caçula é um amor, tem 30 anos, vive agora na Chapada dos Veadeiros. Tem uma banda só de músicas autorais, a Dupla Caipira de Reagge, e toca charango, estaleta e faz percussão. Ele é paz e amor total, está feliz morando em Alto Paraíso, um lugar lindo. Fez cinema na Faap, não terminou o curso, mas tem essa habilidade e também trabalha um pouco com isso lá. O nome de batismo dele é Caio, mas na comunidade é Céu Azul.” O publicitário conta que Rachel, sua mulher, foi modelo, como ele, e professora do Ensino Fundamental. Depois “bandeou” para eventos. Foi coordenadora de eventos da Cândido Mendes e trabalhou com a L’Oréal.

 

Mas ele quer falar da sua carreira. “Mais tarde fui para a Coca-Cola. Comecei fazendo projetos para a marca, que era uma conta pequena na DPZ, fazendo um projeto de patrocínio para teatro infantil. A Coca-Cola tinha uma grana de lei de incentivo, batia alguém pedindo patrocínio, ela analisava, dava uma graninha e tal. Mas tive a ideia de empacotar essa verba de forma mais legal, criando o Festival de Teatro Infantil. Fui até a Maria Clara Machado, que foi a curadora, criamos um prêmio, um projeto com tratamento DPZ. Lindo, de primeira qualidade.”

 

Houve outros eventos para a marca dentro da DPZ até que a empresa chamou Alexis para ocupar a vaga de gerente de promoções e eventos. “Fui ganhando 15% a menos do que eu recebia na DPZ, mas tinha muitos benefícios, aquela coisa de multinacional. Além disso, ser gerente da Coca-Cola no Brasil é uma espécie de Nirvana. Não existe uma empresa que realize mais promoções, eventos que a Coca-Cola.”

 

Mas, às vezes, até para caras como Alexis, simpaticão e caloroso, surgem pedras no caminho. Havia uma vaga na Coca-Cola, um degrau pequeno, mas a mais, na empresa, uma oportunidade para alcançar a porta de entrada da diretoria. Alexis estava prometido para ocupar o cargo, só que não aconteceu. Um colombiano foi chamado e o recado era que Atlanta, nos Estados Unidos, onde funciona a sede da multi, tinha dado a ordem. “Fiquei muito chateado com a historia, uma quebra de expectativa total.”

 

Coincidentemente, ele conta, a DPZ o procurou novamente. Queriam que assumisse a diretoria de contas, na tentativa de salvar a Kaiser. Ele aceitou o convite. “O dono da Kaiser, um cara de Belo Horizonte, estava cansado de apanhar da Brahma, que fazia venda casada com o guaraná. A Kaiser queria fazer assim: quer Coca-Cola? Vai ter de levar uma Kaiser. O dono da cerveja bateu na Coca-Cola para que uma empresa fosse criada. Foi para Atlanta e o diretor de lá lhe disse: ‘Você quer investimento nesse negócio? Vou investir’. Daí, deu uma nota de US$ 1 para o cara. Na época, a filosofia da Coca-Cola era não se envolver com bebidas alcoólicas.”

 

Passado um tempo, o negócio Kaiser cresceu, a Coca-Cola sentiu o baque e, nesse período, entrou com uma participação na marca. No entanto, a DPZ não conseguiu salvar a conta da Kaiser. De acordo com Alexis, “ela estava ferida de morte”, apesar de toda a força-tarefa que, conta, a equipe fez.

 

Foram mais cinco anos na DPZ até que Celso Loducca o chamou para a direção-geral de atendimento. “Celso é supercriativo, um cara legal. Profissionalmente foi maravilhoso, mas foi quando perdi o meu filho. Ele morreu em uma sexta-feira para um sábado. Na segunda, eu estava trabalhando. Foi minha forma de sobreviver, de tocar a vida. Caso contrário seria insuportável. Ele tinha 17 anos, lindo.”

 

Em certo momento, a Loducca começou a enfrentar uma fase difícil, com perdas de contas. “Os salários eram bons e ficou complicado me manter ali.” Nesse turbilhão, Álvaro Souza, amigo de tênis de Alexis, que tinha passado pelo Citibank e hoje é presidente do conselho mundial do Santander, ocupava a posição de presidente-executivo da Amcham. “Num papo com ele, eu com o pé para fora da Loducca, fui convidado para ser diretor de marketing da instituição.” Essa passagem foi breve, pouco mais de um ano.

 

Empreendedor

Da Amcham, Alexis foi parar na Impact, onde se tornou sócio. “Era uma empresa de marketing promocional, acrescentei a área de eventos – o principal cliente de ativação da Impact era justamente a Coca-Cola. Mais tarde, virou full service.” Esse seu lado empreendedor durou quatro anos, até 2008-2009, quando “aquela crise aconteceu e tomamos uma paulada forte”. Alexis não aguentou, saiu da empresa e foi para o WTC como vice-presidente executivo da divisão WTC Business Club, um clube de negócios. “O sujeito se associava e tinha uma série de benefícios”, explica.

 

Foram mais quatro anos, outra passagem que ele faz questão de destacar. “Converso com pessoas mais conservadoras que me dizem que fiquei pulando para lá e para cá. Mas foi tudo muito legal, tudo natural. Minha vida profissional foi sempre assim, conversando com um com outro.”

 

Como diretor-superintendente da Fenapro, Alexis está há três anos e meio, chegou a convite de Glaucio Binder, o presidente. “Esta é uma instituição sindical patronal nacional, que reúne um presidente e um corpo de diretores voluntários.  Eu, que sou o carregador de piano, o que toca as atividades da Fenapro, me reporto a esse board.”

 

Alexis conta que Binder considerava que a Fenapro precisava de um profissional como ele. “Achei bacana participar de uma atividade sindical com essa ideia do Glaucio de agregar valor à instituição, ajudar as agências a pensar em seus negócios e no futuro delas. Ele me abriu a possibilidade de fazermos atividades que mexam com o mercado.”

A primeira foi o design thinking, um processo para repensar coisas e, consequentemente, melhorar operações. “É um método multidisciplinar e, sem dúvidas, quem participa sai com uma cabeça diferente. Fizemos cinco reuniões dessas pelo Brasil – Rio, São Paulo, Recife, Belo Horizonte e Porto Alegre. Em geral, participam donos de agência, diretores. Em cada encontro, éramos uns 30 profissionais. Primeiro, fazíamos ‘o muro das lamentações’, depois uma visão de de futuro. Existe toda uma metodologia para esse trabalho e, no final, surgem insights interessantes.”

 

Após todas as reuniões, Alexis consolidou as dinâmicas e criou um documento que traz um diagnóstico importante da área. “O momento é duro para a indústria da comunicação, mas há rupturas em todos os modelos de negócio.” Alexis ressalta o tsunami digital, que não tem volta. No entanto, as empresas estão percebendo que a internet trabalha com robôs e algoritmos, itens que nem sempre favorecem. “Eu vi um dos maiores bancos do Brasil veiculando em site pornográfico sem que ele soubesse. Enfim, está ocorrendo uma depuração disso tudo. Não podemos resistir à tecnologia, mas não podemos jogar fora o que a mídia tradicional traz de beneficio.”

 

A própria Fenapro precisa de mudanças. Com a reforma trabalhista, as agências acabaram desobrigadas a contribuir com entidades sindicais, o que gera uma queda no caixa das instituições. “Precisamos nos reinventar também para levantar recursos.” Uma das ideias é a chamada Caixa de Ferramentas Essenciais da Agência de Propaganda. Em parceria com os Sindicatos das Agências de Propaganda, que atuam na esfera estadual, são realizados road shows com o objetivo de aproximar representantes do mercado de provedores de ferramentas com soluções que contribuam para a geração de negócios e o aumento de produtividade. “Não tem varinha mágica. Temos muitos desafios pela frente, o que é interessante e motivador.”