Making Of

 

 

 

Por Gustavo Soares, diretor de criação da J. Walter Thompson

 

Na padaria, eu sentei bem pertinho da TV com a Mônica, minha mulher. Chamei a atendente, isto no meio do jornal, com o César Tralli falando, e pedi para aumentar o volume. “Não dá, moço. ” Mas a Mônica, então, falou com todo o charme: “É que vai passar o filme de Coca-Cola que ele fez”. Ela se animou toda, berrou para aumentar o volume: “É que vai passar o filme que esse moço de azul fez!”. A padaria inteira grudou os olhos na TV.

 

Licença, para uma observação: eu não gostei de “Mad Men”. Apesar de se tratar da propaganda, da reconstituição fantástica dos anos 60, dos competentíssimos atores e do DNA nobre (do mesmo criador de “Família Soprano”), eu não curti. Para mim, não passou de uma novelona, em que conflitos de vida ou morte se resolvem com telefonemas e deus ex machina sendo mais usado que brilhantina (e LSD). Mas assisti até o final, para poder chegar ao ápice que todos os meus colegas comentavam: o comercial de Coca-Cola. Aos que não assistiram, não vou contar detalhes. Até porque o que vale aqui é uma das séries mais icônicas da televisão, centrada na publicidade americana, ter escolhido como seu momento definitivo um dos comerciais mais importantes da história.

 

O comercial é “Hilltop”, que mostra dezenas de pessoas de todas as nacionalidades segurando garrafas de Coca-Cola e cantando “eu gostaria de pagar uma Coca-Cola para o mundo”. Depois de abandonar seu cargo na McCann-Erickson e de ouvir sua fiel escudeira Peggy perguntar: “Mas você poderia criar para Coca-Cola!”, Don tira um sabático/bad trip, que termina com uma volta por cima genial. Na série, para o Don Draper, criar um comercial emblemático para a Coca-Cola representa a consagração – ele está meditando quando tem a ideia e dá um sorrisinho. Para mim, e para todos nós aqui na J. Walter Thompson, o que é que representa criar um comercial emblemático para o Natal da Coca-Cola? Bom, você precisaria ter visto o tamanho do sorriso quando o filme foi exibido.

 

Foram quatro minutos em um break histórico: o intervalo normal da novela com mais dois comerciais de 30 segundos adicionados. Fora o cinema, centenas de salas Kinoplex passando o nosso curta antes dos filmes, com trailer de verdade, vozeirão do Walker Blaz e tudo. E na internet uma versão especial, com 40 segundos a mais.

É o primeiro filme da nossa ideia que ganhou a concorrência de Natal da Coca- Cola. O briefing: resgatar o espírito mágico das Caravanas Iluminadas. E o que nos levou muito além dos caminhões enfileirados.

 

Criamos uma produtora fantasia, a Caravana Produções, que, a cada Natal, vai apresentar roteiros de filmes natalinos e todos os desdobramentos possíveis e imagináveis. Para 2015, criamos outras duas histórias lindas, apresentadas por um coletivo que, além da J. Walter Thompson, incluiu Gustavo Taretto, Milton Gonçalves, Lázaro Ramos e mais um monte de gente talentosa e apaixonada pelo Natal. “Uma Ponte para Noel”, criada por José Roberto Torero com um argumento do Ricardo John, CCO da Thompson, e reescrita diversas vezes por mim, foi a escolhida. Ao roteiro se juntaram Fernando Grostein e todas as estrelas da Spray Filmes – e a convite deles, o Blasco Giurato, diretor de fotografia do clássico “Cinema Paradiso” e o fabuloso ator Milhem Cortaz. Além do músico Lucas Lima, responsável pela trilha sonora.

 

A história mostra o garoto Matias (brilhantemente interpretado por Guilherme Ely), que acredita que a razão para seu vilarejo não receber a visita de Papai Noel é a única ponte do local estar quebrada, impedindo a passagem da carruagem dele. Seu pai, um marceneiro, depois de ler a carta do filho para o Papai Noel, decide acreditar na magia do Natal e tenta consertar a ponte.

 

Para os que não vão receber a Caravana em sua cidade, criamos junto com a Zombie Studio uma versão 360 graus do filme, para o Google Cardboard, que veio em packs especiais comemorativos. Lembra que eu escrevi lá em cima sobre a versão mais longa que está na internet? No mesmo site, é possível ver um mapa com todas as Caravanas Iluminadas que vão passar pelo Brasil. Elas também exibem o filme num telão móvel instalado na lateral dos caminhões e mostra os personagens em sua cenografia.

 

A campanha tem rendido menções mais que honrosas mundo afora, seja nas redes sociais de milhões de pessoas emocionadas, seja nos veículos especializados de imprensa no Brasil e no exterior, como aqui na revista Propaganda. Rendeu principalmente e merecidamente o retorno da Coca-Cola ao seu lugar de direito como a marca do Natal. Ao colocar tantos ícones emblemáticos na mesma história, com Papai Noel chegando nos caminhões da Caravana junto do Urso Polar adorável, ao som de “O Natal vem vindo, vem vindo o Natal”, nós fizemos o Brasil relembrar que o Natal tem sabor de Coca-Cola. Não custa repetir que rendeu os nossos melhores sorrisos aqui na agência. E, por fim, rendeu um pequeno mal-entendido.

 

De volta à padaria, enquanto o filme passava na TV, as pessoas que ouviram a atendente interpretaram que eu ter feito um filme significava atuar nele. Portanto viam o Milhem Cortaz na tela, olhavam pra mim. Olhavam de volta para o Milhem Cortaz, olhavam mais uma vez para mim. E no final, enquanto aplaudiam, tocados pela história do Matias, comentavam um pouco chocados sobre o quanto as pessoas ficam diferentes na TV.