Há um ano, Claudia Leitte ‘quebrou’ a internet ao anunciar que iria tirar o Leitte do nome. A bem bolada ação da Eurofarma, criada pela Santa Clara, era para falar sobre a intolerância à lactose e lançar a campanha Pode ter, mostrando que a pessoa não precisa tirar totalmente o leite da dieta. Até hoje, a cantora continua como garota-propaganda do produto Perlatte, para combater o problema, trazendo resultados acima do esperado. Nesta entrevista, a diretora de marketing Roberta Nóbrega fala mais sobre os desdobramentos da estratégia e como a empresa tem trabalhado para chamar a atenção das pessoas de um jeito diferente.

Divulgação

Como foi a estratégia de escolher a cantora Claudia Leitte para divulgar o Perlatte?
O que fez a Eurofarma desenvolver esse produto é que muitas pessoas passam mal e não sabem que têm intolerância à lactose. A empresa resolveu estudar um pouco mais sobre isso e fazer uma pesquisa Datafolha para saber o que as pessoas sentiam após consumir algum produto com derivado de leite. Concluímos que muitas pessoas sofrem, mas nem sabem que têm intolerância à lactose. Pequeno percentual só sabe que é e foi ao médico para tratar. Cerca de 60% a 70% da população como um todo tem intolerância à lactose. No nosso cálculo, 53 milhões passam mal, mas também não investigam as causas. O que dá mais ou menos 35% do público acima de 16 anos. Daí pensamos que não adiantava sair falando do produto, a gente tinha de chamar a atenção para a causa. Porque isso afeta muito a qualidade de vida das pessoas. Conversando bastante com a nossa agência, a Santa Clara, chegamos à conclusão de que a gente precisava chamar a atenção de uma forma diferente. E como? Usando uma pessoa supercarismática, que tem leite no nome, que é engajada em algumas causas e foi então que surgiu a ideia da Claudia Leitte. E foi um sucesso mesmo. Logo na primeira ação que nós fizemos, quando ela anunciou que iria tirar o Leitte do nome, nossa proposta inicial era ficar quatro dias veiculando o teaser, mas nós tivemos de soltar à noite a revelação (de que se tratava de uma campanha), menos de 24 horas depois, porque estava causando muito burburinho nas redes sociais e também porque a ideia não era enganar a população.

Quando o Perlatte foi lançado?
Vai completar dois anos. Foi um produto desenvolvido com muito cuidado. Nós não fomos os primeiros a lançar esse tipo de produto. A Eurofarma é uma empresa especialista na prescrição médica, nós ainda não somos uma empresa forte em produtos para falar diretamente com o consumidor. No caso de Perlatte, não precisa ter a receita médica. Só que, como nós temos esse lado bem científico relevante na nossa cultura, a empresa decidiu lançar o produto (Perlatte), mas com estudo clínico. E um produto que seja pronto para uso, porque o que existia até então no mercado tinha de diluir no alimento, não era muito bem explicado. Nós fizemos um estudo comparativo e somos o único a ter esse estudo no Brasil feito com a população brasileira.

Qual foi o resultado da ação com a Claudia Leitte para a marca?
O objetivo ainda é alertar a população a respeito da intolerância à lactose. Nós queremos oferecer para a população um alerta sobre a qualidade de vida. Esse é o principal objetivo e isso demora. Não é uma coisa de um dia para o outro você conscientizar a população que ela pode ter um problema e precisa ir ao médico ou precisa prestar atenção no que come e se passa mal. Esse é o nosso objetivo e, é claro, depois oferecer um produto de qualidade, que tem estudo clínico. Os médicos pregam que a pessoa faça uma reeducação alimentar e, toda vez que tenha um evento que acabará ingerindo algum alimento derivado de leite, deve tomar o remédio.

A repercussão ajudou nesse objetivo?
Sim, nós percebemos muito mais pessoas engajadas na causa. Houve mais pessoas entrando em contato com a central de atendimento, a venda do produto também cresceu e os médicos também estão prescrevendo mais do que prescreviam. Esse é um mercado que não existia no Brasil e está sendo construído. Agora, nós também temos ciência de que precisa muito mais. Tem muita gente sofrendo com a intolerância à lactose e não sabe, com uma qualidade de vida péssima. Um teste comprova a intolerância à lactose. O fato de o Perlatte ter estudo clínico nos deu muito prestígio junto à classe médica. Hoje, o Perlatte é líder em receituário médico. Os médicos reconhecem que é uma enzima diferenciada e é a única que comprova a eficácia. Por isso, a campanha tem um tom tão educativo. Porque não é uma campanha que nós queremos que o consumidor se automedique, mas sim que ele tome consciência do problema e procure um médico para que ele prescreva o medicamento.

Quais serão os próximos desdobramentos da campanha?
Continuamos nesse mesmo conceito de chamar a atenção da população, esse é o ponto principal. Vamos continuar usando rádio, fizemos algumas inserções no GNT, em programas de receita em que vai muito leite, tentando chamar a atenção das pessoas. Há algumas informações de que a população asiática tem muito mais intolerância, então a gente também está fazendo um levantamento mais concentrado para chamar a atenção para isso. As peças têm a participação da Claudia Leitte. Fizemos alguns materiais para ponto de venda também com ela. A Claudia é a porta-voz de toda a campanha.

A Santa Clara criou toda a estratégia?
Sim. O start da fase 2 foi no Carnaval, com a criação da música Pode ter. Nós pensamos que se desenvolvêssemos uma música com o mote Pode ter poderíamos chamar mais a atenção ainda. Desenhamos uma música junto com a Claudia Leitte. Não é uma música que fala só totalmente de intolerância à lactose, fala de intolerância a outras coisas também. A gente tentou unir isso de que as pessoas podem ter opiniões diferentes, precisam respeitar o que cada uma pensa. Então brincamos um pouco com isso. Também surgiram na letra coisas como ‘Pode ter cantada, mas respeita o meu não’. A gente tentou fazer um link com essa questão da intolerância e o ‘Pode ter leite’. A Claudia fez o lançamento da música no trio dela na Bahia e a música está indo superbem, está tocando nas rádios. A canção virou música de trabalho dela, está no Spotify, tem clipe próprio.

Mas a Claudia Leitte fala da marca na música?
Não, em nenhum momento. Não era esse o objetivo. A gente não queria uma divulgação de forma explícita. A única coisa que ela fala na música é ‘para a intolerância pode ter informação e pode ter leite com ou sem café’. O clipe é patrocinado pelo produto, mas ele aparece de forma muito sutil no começo. A ideia era que viralizasse mesmo e a informação sobre a intolerância fosse maior do que a divulgação do produto. Num primeiro momento é isso, lá na frente pode haver um investimento maior na divulgação do produto. O alerta à população é o principal objetivo da campanha. Não adianta falar agora do produto se a pessoa nem sabe que ela tem o problema.

A Eurofarma aumentou o investimento em marketing para essa campanha?
Sim, nós aumentamos. A primeira fase foi lançada entre maio e junho do ano passado. Foram seis meses de contrato com a Claudia e depois renovamos para mais um ano. O contrato vai até janeiro/fevereiro do ano que vem.

Qual foi o valor investido?
Não revelamos o valor do investimento, mas para nós, que nunca fizemos ações desse porte, é um volume significativo. Essa não é uma campanha institucional, tanto que nem divulgamos muito a Eurofarma nas ações. O objetivo é mesmo chamar a atenção para a questão da intolerância à lactose.

Essa é a primeira grande ação de marketing da empresa?
Desse porte, acredito que sim. Em 1999, quando entrei na empresa, a Eurofarma tinha uma linha de OTC que trabalhava com o consumidor. Também houve investimento em medicamentos genéricos, mas de usar uma pessoa conhecida, uma garota-propaganda para divulgar um produto específico foi a primeira vez.

Explica um pouco mais sobre o mote Pode ter.
O Pode ter tem um sentido dúbio, pois significa que pode ter leite e pode ter intolerância.

Quais são os maiores desafios da comunicação nessa área de saúde?
O desafio da campanha em si é conscientizar a população. É um trabalho que precisa de alguns anos, pois é um mercado que não existe. A Eurofarma tem um tripé de planejamento estratégico. Nós queremos fazer mais investimentos em marketing, ter mais produtos diferenciados no mercado e a expansão territorial fora do Brasil. A Eurofarma é a primeira multinacional farmacêutica brasileira, com capital 100% nacional, que está presente em 20 países da América Latina. O desafio dentro da nossa área é enorme, que é investir bem em marketing, tanto naquilo que somos bons e fortes, que é o trabalho junto com a classe médica, e começar a ter também produtos que possamos falar diretamente com o consumidor, como é o caso do Perlatte. Porém, nós não temos pressa com relação a isso, queremos ir passo a passo de uma forma assertiva, fazendo boas campanhas relacionadas à qualidade de vida dos pacientes e não simplesmente fazendo propaganda. A gente quer entrar de uma maneira diferente, gerando credibilidade com o público final da mesma forma que temos com a classe médica. É difícil ter um retorno rápido quando você escolhe uma estratégia dessa, pois é muito mais fácil pegar um produto e sair fazendo propaganda. Mas não é esse o nosso objetivo.

Qual é o market share da Eurofarma?
Em receituário, somos a segunda empresa, com uma participação em torno de 6%, tendo em vista que o mercado farmacêutico é muito diversificado. A primeira empresa tem 7%, 8%. Em 2017, a Eurofarma atingiu receita de R$ 3,7 bilhões, 11% superior ao ano anterior. O grupo tem 46 anos de existência.

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