No auge dos seus cinco anos, Lucas questiona:

– Pai, o que é isso aqui?
– Isso o quê?
– Esse negócio aqui atrapalhando o filme?

Era um daqueles comerciais que interrompem no YouTube. Como em casa só se vê streaming, ele nunca tinha se deparado com um intervalo na vida.

Ensinei a apertar o “skip ad” e, a partir daí, ele nunca mais usou a plataforma sem ficar com o dedo de prontidão.

No mesmo dia, do outro lado da sala, a minha sobrinha de um ano pressiona o indicador contra a TV, esperando uma obviedade: que a tela seja touch. E é um raciocínio lógico.

Se a do tablet e a do celular são, por que essa telona não é?

Logo depois, noto que ela não se conforma com a quantidade de controles remotos para assistir a uma única tela. Irritada, joga todos no chão. Eu penso: “Com toda razão, é revoltante”.

Olhar é um exercício criativo. E observar as crianças pode ser um exercício e tanto. Pequenas obviedades que ocorrerão amanhã, os pequenos já estão naturalmente pedindo hoje.

Meu filho de 12 anos, por exemplo, não suporta ver TV “convencional”. Ele é da geração que assiste ao que quer, quando quer e sem interrupção (leia-se intervalo comercial). Vê Netflix, Now, YouTube, Apple TV, mas nunca canais abertos e fechados. É o fim da TV como costumamos ver? Eu não tenho dúvida nenhuma de que é.

Foi olhando para o consumo dos meios de comunicação na minha casa que tive a certeza de que a propaganda convencional não iria muito longe.

Há sete anos, migrei da propaganda para o branded content, numa época em que o termo ainda era uma esquisitice no Brasil. Larguei minha carreira e comecei do zero, como se tivesse 20 anos.

Estudei muito, experimentei novos formatos, montei a primeira agência de advertainment do Brasil. Criei e produzi séries de TV, webséries, projetos de VR, conteúdo multiplataforma. Foi um caminho árduo, mas recompensador. O olhar foi um grande aliado nesse período.

Observar narrativas de todos os gêneros, o arco do herói e histórias colaborativas foi essencial para desenvolver um trabalho inovador.

Hoje, constato que a expressão “branded content”, infelizmente, está banalizada no mercado. “Chamam qualquer coisa de conteúdo”, resmungo em pensamento. De fato, um post, um site, um vídeo, qualquer coisa é designada como conteúdo de marca.

O meu alívio é perceber que a audiência só se engaja quando a narrativa é relevante.
Não é por acaso que a Netflix está se tornando a maior produtora de conteúdo do mundo, ultrapassando grandes estúdios de cinema e TV.

O fato é que o serviço de streaming consegue lançar um olhar profundo (o olhar, mais uma vez o olhar) sobre o comportamento da sua audiência.

A Netflix vê exatamente como fisga o espectador e a partir de qual momento ele começa a maratonar.

A empresa encara tudo isso não como algoritmo, mas com inteligência e muito storytelling.
É como eu sempre digo: é só olhar ao redor. E, olhando para os meus filhos, os meus sobrinhos e a galerinha que frequenta a minha casa, dá paraimaginar os próximos passos da indústria da comunicação. 

Observo uma geração inteira se formando atrás de um celular, por uma tela bem pequena.
Na mão, eles possuem uma central de comunicação, entretenimento, games e interação social.
Uma geração um pouco hipnotizada, é verdade. Mas quem disse que a minha não era assim diante da TV?

Guga Lemes é CCO da beGiant Advertainment