3D Printing Healthy Food: brincando de Ceres na era digital

Bram Sayes

Chloé Rutzerveld e seus experimentos comestíveis 3D.

Na mitologia grega, Ceres é considerada a Deusa da fertilidade da terra, da agricultura, a que ensinou o homem a cultivar e extrair alimentos da natureza. No século XXI, o mito vira realidade e poder nas mãos de qualquer mortal por meio da impressão 3D. A comida impressa já não tem nada a ver com as receitinhas quase infantis, de cookies, chocolates, pizzas e toda sorte de junk food que a primeira leva de criadores do Vale do Silício foi capaz de preparar. Desde 2015, novos conceitos importantes estão surgindo para disseminar e validar as tecnologias em 3D Printing Food, apesar de ainda existir muita controvérsia: afinal, é comida ou somente “espuma”? 

Em primeiro lugar, é preciso apagar da mente a percepção de que se trata de um modo produtivo de alimentos em escala menor. 3D Printing Food não está a serviço de produzir quantidade, por menor que seja. Ao contrário, vem se impondo na alimentação em nome da hiperpersonalização e do design thinking, tendências também consagradas à mesa. Os mais puristas terão que aceitar as novas alternativas. Inicialmente, a impressão 3D se concentrou no aprimoramento visual e padronização em pâtisserie, viabilizando nanodetalhes, como por exemplo, o apuro de acabamento em folha de ouro e desenho de marcas. Em seguida, a aplicação clínica das “texturas alimentares impressas em 3D” eram ideais para pessoas com Alzheimer ou com dificuldade de engolir. Este tem sido um passo importante para adoção de uma alimentação adequada e mais saborosa por pacientes com doenças crônicas.

Agora, a disrupção de 3D printing food entrou em um nível muito mais crítico e pode quebrar muitos paradigmas. Por exemplo, no preparo de refeições mais funcionais e mais sustentáveis. Esta é a premissa do trabalho da biodesigner holandesa Chloé Rutzerveld, a pesquisadora mais promissora na área, que esteve recentemente em São Paulo, no Path Festival. Criadora do projeto “Edible Growth” ela se baseia na impressão 3D para “recriar” vegetais e proteínas.

A maior mudança está em deixar de imprimir receitas para imprimir os próprios ingredientes que podem ser potencializados individualmente. O alimento cru, que hoje é menos nutriente que um alimento que passa por cocção, poderá ser “turbinado” e, uma única berinjela, poderá ter o valor nutricional de toda uma refeição. Estes são avanços devem projetar a impressão 3D de alimentos a um novo patamar. Desperdício zero, saudabilidade, ativismo, eliminação de aditivos, conservantes e impacto ambiental são a base dos ingredientes impressos em 3D. Valores que vão muito além dos nutricionais para a geração “Y”. 

O cozinheiro dá lugar ao consumidor leigo. O engenheiro de alimentos dá lugar ao designer. O nutricionista dá lugar ao cientista. O livro de receitas torna-se um app. O alimento pode ter sua intensidade de nutrientes dosadas, como um dimmer faz com a luz. Ou seja, já é possível brincar de Ceres, a Deusa das sementes e da terra e imprimir nossos próprios insumos, balanceados ao nosso gosto, para fazer bem ao nosso corpo. Então que tal imprimir tomates neste fim de semana, com muito mais cor e potássio do que a natureza é capaz de oferecer? Em breve, ao comprar uma impressora 3D para a sua cozinha, a composição nutricional dos alimentos estará disponível na ponta dos dedos, bastando digitar mais ou menos, de acordo com o que você estiver precisando. E detalhe: precisando naquele dia.

 

Paulo Mumia

Marisa Furtado é jornalista e curadora do food lab Madame Aubergine Cozinha e Cultura