A busca pelo oxigênio
Pense numa corrida. O ritmo da respiração: inspirar, expirar. Enche o peito: orgulho; esvazia: alívio. Inspiração ritmada, levada pelas pernas, marcada pelas batidas do coração.
Se você gosta de correr, já entendeu. Inspiração ocorre sem maiores solenidades, o tempo todo, quase sem ser notada.
Não por acaso nossa trajetória profissional é tratada como “carreira”. Quem já não viveu na rotina do trabalho momentos de desabalada carreira? O cara que vai na frente nos estimulando a alcançá-lo. O cara que tenta nos ultrapassar, exigindo que se aperte o passo. O que corre ao lado, não nos deixando perder o ritmo. Sim, a concorrência também é uma fonte de inspiração.
Gosto de ter ídolos, cultivar referências. Observar o que fazem os grandes ajuda a arejar a cabeça e aguçar boas ambições. Assim como observar o erro dos outros também nos poupa de velhos tropeços.
Das muitas exposições que tive o prazer de visitar pelo mundo, a que mais me marcou foi Copier Créer: de Turner à Picasso, em 1993, no Louvre. Mostrava as fontes de mestres do quilate de Pablo Picasso, revelando em cima de quem eles exercitaram o traço até descobrir seu estilo pessoal. Todo mundo precisa de portas para encontrar caminhos.
Quando começo a escrever um livro, é bacana saber que existem Dostoievskis, Saramagos, Machados, Gabos, Kafkas, Cortázars, Clarices, Austers e mais trocentos monstros na dianteira, rindo daquela sacada que eu imaginava ser inovação. Também é bom saber que um formigueiro de novos talentos está experimentando formas de narrativa que podem instantaneamente encher meu texto de teias de aranha. Olhar em volta é a única maneira de se situar, baixar a bola e curtir a adrenalina do percurso.
Quando estou criando ou produzindo conteúdo audiovisual, é maravilhoso saber que Breaking Bad, Os Sopranos, House of Cards e todos os filmes de Woody Allen, Coppola, Scorcese, Almodóvar, Irmãos Coen, Iñárritu e companhia já foram feitos. Isso deixa claro o quanto de estrada ainda falta. Haja fôlego até pra sonhar.
O que existe de inspiração por aí não está escrito. Ou melhor, tá escritaço, muitas vezes por linhas tortas, em casa, na rua, na sala de reunião, no trânsito, no papo do taxista, na sala de espera do médico, onde a gente menos espera. É ficar ligado, jogar realidade com ficção no liquidificador e – ufa! – correr pro abraço.
De uns tempos pra cá, meu joelho resolveu atrapalhar. Fui forçado a trocar a corrida por outros exercícios. Mas a dinâmica da inspiração continua igual. Na hora da ginástica, junto com o suor, as melhores ideias escorrem pela testa.
Adilson Xavier é CEO da Zola Filmes