A crença na fé da razão
O que tem faltado, e muito, em nossa atividade de marketing e comunicação é simplesmente bom senso. São experiências demais, tentativas demais, ensaios demais. No mais das vezes, baseadas em puro desespero de ver que as coisas não funcionam como antes ou na fé cega dos que acreditam em milagres inexplicáveis. Mas o mercado não funciona assim. Ele tem lógica, muitas vezes difícil de captar e entender, mas com racional suficiente para fazer a engrenagem do mercado rodar segundo leis essencialmente imutáveis.
As pessoas compram e usam aquilo que conhecem, desejam e seu dinheiro – sempre curto – opta por comprar, em detrimento de muitas outras coisas. Como eu escrevi, no meu livro com Marcos Felipe Magalhães, há sempre uma sensação de que “todo ato de consumo implica algum sacrifício e frustração por parte do consumidor”. É uma luta feroz, portanto, para que as marcas se façam conhecidas, desejadas e vençam a eterna indecisão do consumidor em onde investir seu escasso dinheiro (ou tempo). Nesse mister de fazer as pessoas conhecerem, desejarem e optarem pelas marcas ainda não se inventou nada mais efetivo e eficaz que a publicidade, a mídia TV e o comercial. Todas as demais plataformas, meios e formatos são, no fundo, acessórios.
Há exceções, no caso de marcas de luxo e de nicho, bem como o B2B que, inclusive, é cada vez mais uma operação que se assemelha ao B2C, inclusive transformando a TV, como seus múltiplos canais e alternativas, em uma opção cada vez mais utilizada no espectro B2B.
A TV sempre compôs uma excelente dobradinha com outros meios. Produtos populares, como o rádio (que também funciona para alguns nichos). Produtos de elite ou mais sofísticados (a mídia impressa). Marcas com foco no jovem (o cinema). No geral, ou seja, multiuso, as muitas opções de OOH e o digital, com a sua miríade de alternativas.
Não sem razão o digital divide com a TV o principal destino das verbas e o OOH vem crescendo bastante, à medida em que se digitaliza e amplia seu espectro. Mas tem havido, como se sabe e começa a bater na mente de anunciantes, agências e seus profissionais, exagero em relação ao digital. Isso sem falar nos experimentos com pouco ou nenhum sentido, para a maioria das marcas, dos influenciadores, da comunicação por conteúdo ou das experiências. Todos estes são ótimas cerejas do bolo, mas não são o bolo em si e nem a sua cobertura.
Não são poucas as marcas que têm se frustrado com essas “promessas” de melhor ROI que, no fundo, comprometem a saúde e o futuro das marcas. Você inventou uma fintech? É claro que seu primeiro passo de comunicação está no digital. Depois, para se distanciar dos concorrentes, ganhar musculatura e expandir sua marca, pode começar a pensar em TV…
Você está no comércio digital ou gerou uma operação DTC (direct to consumer), mais uma vez sua opção inicial é o digital. Depois, se você tirar o pé da TV ou se fizer pouco presente nessa mídia, sua marca entrará na curva dramática do esquecimento ou não vai decolar para a liga principal, onde joga o mercado dos grandes números, das massas.
Por tudo isso acredito, com convicção, que os tempos ditos áureos da propaganda vão retornar. Mais pé no chão, melhor substanciados em números e conhecimento do consumidor, mais consequentes, mais profissionais, mas amparados em tecnologia, mais competitivos, com menor rentabilidade (afinal, a concorrência aumentou muito) e por aí vai. Mas retornarão, porque é a lógica, a fé na razão do que funciona de fato e não o que tem voo de galinha, muito curto, agita as coisas no momento em que acontece, mas no fundo gera pouca consequência e oferece um futuro muito curto.
Rafael Sampaio é consultor em propaganda (rafaelsampaio103@gmail.com)