A ilusória busca da verdade

Baixou um século 19 na “neocontemporaneidade”. Instalou-se um grande movimento em busca da verdade. A propósito, já disse Schopenhauer: “o que a história conta não passa de um longo sonho, do pesadelo espesso e confuso da humanidade”. E ainda: “a natureza não mente jamais”. Pronto.

Adotem-se estas máximas e deixemos de frescura. De que verdade estamos atrás? Da verdade que desmente a uns e outros, engajados “contra” ou “a favor” nas redes sociais? Ora, mas sempre não nos guiamos pelas mentiras da ocasião? Como se elegem os políticos? Como são conduzidas as políticas? Como se produzem os discursos? O que se escreve na mídia é de se copiar? E os padres, os pastores, os rabinos, os xeques, que arrebanham milhares e milhares de ovelhas em busca de uma mentira confortante?

Recentemente, passei a tratar a informação como ao horóscopo: se me convém, acredito; se não, duvido. Pronto. Nunca mais me incomodei com isso. A verdade nunca está no momento em que é revelada. O agora é o mundo da mentira. A verdade é estanque. A mentira é corrente. A verdade é tesa. A mentira é flexível. Só que não.

Basta inverter que também não será mentira. Sim, porque viver sob o império da verdade é impensável. Se aqui estamos foi por termos sido capazes de inventar a mentira, combustível para avançar sobre os entraves da verdade e acreditar que existe alguma coisa além do horrendo “pesadelo espesso e confuso”. Qual seja, a consciência de que a única verdade está na natureza. Essa natureza que “não mente jamais” e a que estamos eternamente atados e nos capacitou a mentir. Ou a elaborar uma “verdade” para a sobrevivência da fantasia, que nos mantém lúcidos para a crença. A mentira tempera a realidade, atenua o amargor ou o azedume ancestral e perene da verdade. A verdade é inconfessável.

Daí, a versão mentirosa, palatável. Agarra-se à mentira como a um salva-vidas. Então, vamos lá. Onde se esconde a verdade do Brasil de hoje? De que lado sopram os seus ventos? Qual a estrada que conduz a ela? Quem se aventura por essa penosa busca segue descaminhos sinalizados por falsos indicativos. E se frustra. Daí, a questão hoje não se mobilizar pela verdade, mas ter respostas que contestem as mentiras.

Com outras mentiras, muito mais eficazes. Porque a verdade é ingênua, realista demais e inconveniente. Ninguém, no fundo, quer ouvi-la, quer saber dela. Queremos é armas para enfrentar a umas e outras mentiras. Isso. À força da radicalização, a verdade torna-se inócua, frágil.

Está instalado que mentiras se combatem com mentiras mais elaboradas, mais críveis (ou incríveis), mais chocantes, mais danosas e mais perversas. Sim, no final a verdade vence. Não porque a defendamos. Ao contrário, a ignoramos. Mas vence porque a verdade é a natureza, em sua absoluta e crua inconsciência. Que nos faz acreditar, idiotamente, que agimos por vontade própria.

É assim, porém, nessa ilusão empolgada, que alcançamos um estado de loucura aceitável. Fosse outro, seríamos internados.

Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing (stalimir@gmail.com)