ABA questiona pesquisa da Deloitte para a Abap sobre margem líquida de agências

Estudo aponta que agências de publicidade em 13 anos reduziram ganhos de 14,6% para 5,66%

Principal fonte dos recursos administrados pelas agências de publicidade, os anunciantes questionam os dados expostos na pesquisa ‘Por Dentro das Agências’ feita pela Deloitte para a Abap (Espaço de Articulação Coletiva do Ecossistema Publicitário). Por meio da ABA (Associação Brasileira de Anunciantes), a CEO Sandra Martinelli explica questões que considera divergentes.

“O estudo foi feito com 23 agências, sendo 20 full-service e três agências eminentemente digitais.  Esse é um ponto de questionamento, porque somente o Cenp tem 343 agências cadastradas, que representam cerca de 70% de todo o faturamento publicitário.  20 agências tem um viés extremamente concentrado e não deveria ser representativo de todo o mercado de agências no Brasil”, explica Sandra Martinelli.

Outro ponto levantado pela dirigente da ABA é que o estudo da Deloitte diz que “ser full-service não é mais uma vantagem competitiva, é quase uma obrigação”, referindo-se ao modelo brasileiro de agências que engloba a compra de mídia e outras disciplinas no seu escopo de trabalho.

“Ou seja, na sua essência o estudo já aponta que o modelo de negócio está fadado ao fracasso, porque a multiplicidade de serviços agregados ao full-service não se coaduna com o modelo de remuneração via comissão de mídia, uma vez que mídia passa a ter uma representatividade menor versus a multiplicidade de serviços que uma agência precisa entregar, acarretando muito mais custos com pessoal e ferramentas.  Ponto que a ABA vem discutindo e questionando bastante no mercado, principalmente para contas de governo, em que o Anexo B do Cenp ( Fórum da Autorregulação do Mercado Publicitário) tem de ser respeitado obrigatoriamente.”

Vale ponderar, na expressão de Sandra Martinelli, a evolução dos gastos x receitas, de 2010 a 2023, “porque não deixa claro sobre que base de cálculo está fundamentado (que gerou um gráfico no estudo).”

A executiva acrescenta sobre o estudo da Deloitte: “As hipóteses possíveis aqui seriam: ou a base de margem das agências estava inflada demais e agora os novos contratos achataram para se chegar em uma margem razoável compatível com as margens dos próprios anunciantes; ou as agências se perderam na precificação de seus ativos na celebração de contratos com anunciantes, deixando de cobrar de forma justa por suas novas demandas. Sem a base (base-line) sobre a qual o estudo inicia em 2010 (bem representado no gráfico em que as duas curvas partem de um mesmo ponto, curioso) fica difícil interpretar se há grandes perdas de fato na remuneração das agências.”

Sandra vê outro fato que considera importante. “O estudo faz uma evolução de 2010 a 2023, sem nem recortar o período de 2020 a 2023 em que a pandemia exigiu renegociações de contrato e diminuição drástica de investimentos em mídia por parte dos anunciantes, de todos os portes.  Esse fato é relevante e deveria compor um capítulo do estudo, pois pode ter influenciado totalmente nos resultados de comparativo de gastos x receitas. Outra dúvida que nos ocorreu é porque o estudo foi feito em 2025 e não se questionou sobre o fechamento de 2024, em que todo o mercado teve uma grande recuperação após a pandemia?”

Sandra Martinelli: "Fica difícil interpretar se há grandes perdas de fato na remuneração das agências”/Foto: Divulgação

Sandra Martinelli também chama a atenção para a ausência das BVs (Bonificações de Volume) na ponderação da Deloitte. “Essa receita de BV é fundamental para a margem de lucro da maioria das agências, uma vez que é uma prática comum no mercado publicitário brasileiro.”

A argumentação sobre o aumento significativo de custos com pessoal, incluindo impostos sobre contratação, esbarra na prática de celebração de contratos na iniciativa privada baseado sem FTEs (Full-Time Equivalent).  A ponderação de Sandra Martinelli inclui ainda duas hipóteses.

“Ou as agências não estão sabendo dimensionar o número de FTEs adequado ao escopo de demanda da respectiva conta, ou a negociação final para celebração de contratos está em um nível muito desfavorável para as agências, o que demonstra fragilidade na relação entre os elos da cadeia.”

A insatisfação da ABA leva para a mesa de discussão outro detalhe levantado por Sandra Martinelli.

“A pesquisa quando se encerra em si mesma, desconsidera a análise de cenário mercadológico com crescimento de faturamento publicitário evidenciado pelo Cenp Meios e corroborado com a notícia de que a Globo, maior veiculo de comunicação e, consequentemente maior pagador de desconto padrão de mídia e de BV, declara crescimento exponencial de 2022 a 2024, com pico em 2025 – evidenciando a tendência – de crescimento de 13% de faturamento sobre o primeiro tri de 2024.  Ou seja, a análise precisa ser também bottom up (checando dados de investimento do mercado publicitário em fontes confiáveis) ao invés de uma avaliação simples top down (somente com declarações de uma parcela pouco significativa de agências participantes do Cenp – 23 agências) de receitas x gastos abordada no estudo.”

O estudo aponta o impacto em percentual de aumento de gastos em áreas que não existiam nas agências participantes em 2010 e que foram evidenciados até 2023, coloca Sandra Martinelli.

“Desse total, 57% são de novas demandas relacionadas ao mundo digital (gestão de influenciadores, ciência de dados e analytics, social listening, conteúdo e engajamento, produção digital, gestão de redes socias e gestão e privacidade de dados). As hipóteses aqui apontam para uma desqualificação da capacidade das agências em orçar os FTEs adicionais que essas demandas impactam na prestação de serviços; ou a necessidade de um esforço maior das agências fazerem os anunciantes enxergarem (com fatos e dados) o devido valor que esses serviços entregam para a prestação de serviços nos contratos que são celebrados", finaliza a CEO da ABA.