Aconteceu, novamente!

Um dia França e Inglaterra decidiram apostar no avião de passageiro mais rápido do mundo – o Concorde. E deu no que deu. Erro crasso e monumental de marketing. Nesta mesma coluna denunciado há mais de 40 anos. Mas, os mesmos franceses que naufragaram com o mais rápido, não desistiram e decidiram apostar na glória de construir o maior. E assim nasceu o Airbus A 380. Em 1994, a Airbus anunciou sua intenção de desenvolver um mega-avião, o A3XX. A ideia era contrapor-se contra o Boeing 747-400. Vários “group discussions” foram realizados – mais de 200 – e sugestões de se ter a bordo restaurantes, ginásios, cassinos e salões de beleza entraram nos rascunhos.

Em dezembro de 2000, o Airbus A3XX foi rebatizado para A380, já contando com 50 pedidos de diferentes empresas. O A380, pelo formato do 8, que sugeria 2 andares. Originalmente o projeto foi orçado em 8,8 bilhões de euros. Quando o projeto foi finalizado, em 2001, e começou-se a fabricar a primeira das asas, o custo já era de 11 bilhões de euros…

Cinco Airbus A380 foram construídos para os testes iniciais. No dia 27 de abril de 2005, às 10h29, hora local, em Toulouse, o primeiro voo. O piloto-chefe, Jacques Rosay, ao descer, declara: “Eu me senti como se tivesse pilotando uma bicicleta…”. O certificado de segurança do avião, depois de uma sucessão de problemas, foi concedido em 14 de dezembro de 2007. E o início da produção foi sucessivamente adiado por um pequeno e descomunal detalhe: cada aeronave requeria 530 km de fiação e era um emaranhado só… Dos 80 aviões que seriam entregues até o fim de 2009, depois de um primeiro corte, novos atrasos foram anunciados e os 80 viraram 25, e 45 em 2010… Parecia que a história do Concorde estava se repetindo… E estava… Finalmente, no dia 15 de outubro de 2007, o primeiro A380 decola em viagens regulares, sob a bandeira da Singapore Airlines. Os proprietários do avião exultavam de alegria. Financial Times, 27 de julho de 2017. Manchete: “Future Of A380 Superjumbo Is Doubt After Airbus Cut Production…”. Desde 2015, a Airbus não recebeu uma única encomenda pela aeronave. O ritmo da produção passou por uma segunda redução em pouco mais de um ano. Em vez de mais de uma centena por ano, agora menos de um por mês – 10 por ano, com otimismo. Em verdade, segundo o presidente da empresa, Thomas Enders, apenas oito em 2019…

Tudo Errado. Uma vez mais, o orgulho e a empáfia cegaram os dirigentes da Airbus, os políticos e as autoridades francesas. O Airbus A380, assim com o Concorde, é um Money Loser – um perdedor de dinheiro. Encantaram-se tanto com a conquista, com o tamanho da aeronave, que não tiveram tempo de prestar atenção na terra, no mercado, nas pessoas, nos passageiros, na realidade.

Não se deram conta que o paquiderme era absolutamente inviável e inadequado para 99,9% dos aeroportos do mundo. Que 99,9% da pistas precisariam ser reforçadas e readaptadas. Que 99,9% dos desembarques teriam de ser repensados e refeitos. Em síntese, que toda a estrutura de terra teria de ignorar as demais aeronaves que povoam o céu do mundo para viabilizarem o delírio francês. Assim, amigos, ocorreu, novamente. Apaixonaram-se pelo produto e esqueceram-se do mercado. Esqueceram-se de nós. Futuros e improváveis passageiros… Cometer pela segunda vez o mesmo erro é patético. Mas, e desgraçadamente para a França, e Airbus, ocorreu, novamente. Repetindo o que nos ensinou Levitt, “Quem se deixa seduzir e apaixonar pelo produto, fica com o produto, perde o mercado”. Cometerá a França o mesmo erro pela terceira vez? Não duvido!

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing (famadia@madiamm.com.br)