Agências brasileiras obtêm êxito atendendo clientes estrangeiros
A publicidade brasileira é uma das mais admiradas do mundo. Recentemente, a AlmapBBDO foi escolhida agência da década no Cannes Lions. Não à toa, é cada vez maior o número de empresas estrangeiras procurando agências nacionais de diferentes tamanhos.
Os motivos são variados. Para Victor Hyago, sócio-diretor da Becka Advertising, a precificação é um deles. “Agências americanas, por exemplo, temerosas por eventuais problemas no andamento dos projetos, cobram tudo à vista. Já nós oferecemos aos clientes a opção do parcelamento, que acaba sendo vantajosa, pois um projeto de US$ 5 mil passa a ser muito mais viável com cinco pagamentos de US$ 1 mil. Aprendemos a trabalhar sob pressão desde sempre e o fato de existir a possibilidade de o cliente não nos pagar lá na frente nos faz ter um desempenho até melhor”, opina.
Para Gustavo Bacchin, cofundador e COO da Cadastra, o lado financeiro é um fator importante. “Porém, no caso do Brasil, o que nos torna realmente competitivos é a qualidade. Somos um mercado atrativo em preço e ao mesmo tempo entregamos resultados aos mercados mais exigentes”, analisa. “Estamos trabalhando com grandes marcas em mais de 15 países em escopos que fogem do escopo tradicional de agências. São projetos orientados à performance e ao e-commerce. No Brasil, temos inúmeros impostos e dificuldades de negócios que não existem em outros países”, complementa.
Além disso, segue Bacchin, o Brasil é naturalmente um país diverso e multicultural, o que traz a capacidade de entender e conversar com outras culturas. Outro fator importante lembrado pelo executivo é a inexistência de fronteiras quando olhamos para o formato de trabalho remoto. “As tecnologias de hoje nos permitem conectar times em países diferentes, possibilitando que anunciantes acessem parceiros e talentos em localidades antes não imaginadas”.
Exemplos dessa capacidade não faltam. Um deles vem da Africa. Há dois anos, a agência atende Budweiser na Argentina. “Hoje contamos com um time de sete argentinos dedicados exclusivamente à conta. Quando começamos a trabalhar para a marca, tínhamos o grande desafio de reposicioná-la como uma cerveja premium, cool e americana em um mercado onde ela era vista, essencialmente, como uma cerveja barata”, explica Carol Boccia, VP de operações e atendimento. “Precisávamos trazer a questão da qualidade superior da bebida e o jeito BUD de fazer cerveja, conceitos que já eram explorados mundialmente e
representados pela frase We don’t make beer, we brew it. Todos esses elementos precisavam fazer parte desta nova construção, mas a cultura argentina tem muitas palavras e gírias peculiares. Buscamos então uma forma bem local para falar sobre isso e nossa campanha acabou transformando a frase global em No Hacemos cerveza. We brew birra ou We don’t make beer, we brew Birra, uma forma simpática para uma marca americana, junto a uma agência brasileira, posicionar a Budweiser para os argentinos”, explica a executiva.
Filipe Cuvero, VP de criação da dentsumcgarrybowen, também relata uma história curiosa. “Já fizemos um trabalho global entre Brasil, Índia e Japão para Nissin, onde juntamos equipes dos 3 países para executar um mesmo filme, com exemplos de cenas diferentes para cada cultura. No final foi muito divertido colocar um filme ao lado do outro e ver essas diferenças. Mas conceitualmente eram praticamente os mesmos filmes. Além de Nissin, também exportamos filmes de outras marcas, como Canon e Subway. O importante sempre é conversar com os escritórios de outros países para que sua ideia tenha pequenas alterações que ajudem a mexer com o coração não só do seu país, mas de pessoas de outros lugares”, comenta.
Para Matias Menendez, ECD colega de agência de Carol, os players estrangeiros buscam brasileiros pela inventividade. “Sendo argentino, posso dizer que o Brasil sempre foi um benchmark em criatividade, e não falo apenas em termos de festivais. Existe um grande histórico de publicitários brasileiros que conquistaram outros mercados internacionais e isso comprova que o DNA criativo daqui se destaca muito lá fora. Para mim, a direção de arte do Brasil é uma das melhores do mundo, sem dúvida. Mas o país evoluiu muito e faz tempo que o atrativo não é só esse. Hoje você vê vários projetos de conteúdo, de tecnologia e de social que nasceram aqui e são brilhantes”, enumera.
Para Bacchin, da Cadastra, quando se atua com mindset de performance, você se acostuma a trabalhar baseado nas jornadas dos consumidores, que são completamente diferentes para cada produto ou serviço – e não apenas a nível das marcas; além de audiências complexas e do poder das informações. “Hoje em dia, a gama de dados disponíveis nas plataformas de publicidade digital, como Google e Facebook, nos permite estudar e entender tamanho, comportamento de audiências e investimento necessário para criarmos campanhas e projetos de sucesso em praticamente qualquer mercado”, explica o COO.
Entretanto, para se destacar, as agências precisam ganhar reconhecimento fora do Brasil. Segundo Cuvero, há duas formas para isso. “Uma, que parece mais clara, são nos prêmios internacionais. Há anos as agências brasileiras mostram um trabalho de alta qualidade em Cannes, El Ojo, Fiap, One Show e outros. A outra são nos jobs globais de dentro de cada holding. Em todas as holdings que trabalhei, as agências brasileiras souberam como se destacar pelo trabalho duro e pela criatividade. E dentro do próprio grupo existem prêmios internos que nos dão a oportunidade de mostrar o trabalho”.
O relacionamento com as empresas que já estão no país também pode ser um caminho, conforme explica Marina Tumolo, diretora de operações da fri.to. “Para sermos efetivos, o principal é entender o mercado, desde hábitos de compra até questões comerciais, todas as forças e fraquezas precisam ser analisadas”, afirma.
Uma presença física no país a ser conquistado é “vital”, além da construção de cases no mercado local e nos segmentos dos anunciantes desejados, conforme explica Bacchin, da Cadastra. “Uma estratégia importante é atender marcas multinacionais, já que exige da agência saber trabalhar com stakeholders em diferentes países, línguas e culturas, lidar com a complexidade de hierarquias e processos de tomada de decisão, que na maioria das vezes são descentralizados. Essa experiência ajuda a credenciar a agência para trabalhos em outros mercados”, ensina.