Agências: se não existissem, teriam de ser inventadas
A frase que intitula esta coluna poderia ser minha ou de boa parte dos publicitários que realmente dominam seu ofício. Mas foi dita pelo atual presidente da WFA (Federação Mundial de Anunciantes), em seu encontro anual. Após destacar o grande valor que as agências aportam aos clientes, falou sobre os problemas atuais de falta de transparência em suas relações com clientes e veículos, em especial do universo digital, que aportou uma série de outros intermediários e especialistas que não estão trabalhando de modo claro e aberto.
Essa realidade derivou de um movimento que parecia ser uma evolução do modelo de relação anunciante-agência-veículo, mas não deu muito certo e hoje fica evidente que precisa ser revisto. É a separação entre agência criativa (que inclui planejamento) e agência de mídia – modelo que não existe no Brasil, é importante observar.
A agência de mídia surgiu com a promessa de maior foco e evolução técnica na área de mídia, mas acabou se transformando em uma organização com um exagerado viés financeiro, competindo com taxas sempre menores, mas agregando mais fornecedores e custos pouco claros ao processo. Além da prejudicial perda de conexão com a área criativa. Outros decouplings (separações) que se tentaram foram com as atividades de produção e de planejamento estratégico. Também não deu certo, gerando maiores custos totais e menor eficiência.
Com a ampliação das plataformas de comunicação empregadas pelos clientes além da publicidade, como promoção, RP, marketing direto e outros, houve outro movimento em direção a um sistema mais atomizado, com diversos tipos de agência. Mais uma vez, o sucesso foi baixo e temporário e o resultado final para os anunciantes ficou aquém das expectativas.
Essas agências especializadas começaram a oferecer outras “especializações”, com qualificação menor, ou caminharam em direção a serem uma agência de publicidade “reinventada”, mas geralmente sem os atributos mais relevantes das boas agências clássicas, em especial as competências de integração e de criação.
Em outros casos, os anunciantes, principalmente os de maior porte, passaram a fazer essa integração em suas áreas internas, duplicando tarefas, aumentando custos (que nem sempre ficam evidentes) e perdendo em tempo e qualidade geral.
Paralelamente, houve esporadicamente a sedução de emprego do formato de house-agency, a agência do cliente, que trabalha basicamente para ele. Como o modelo nunca se mostrou de fato mais eficiente que o tradicional, ele teve altos e baixos e hoje vive uma nova fase, chamada de in house, mas igualmente menos eficaz e quase marginal em termos do volume geral do mercado publicitário.
Outra “tendência” recente, mas também prejudicial ao ecossistema secular da publicidade, é a da entrada das firmas de consultoria no negócio. Elas têm seduzido os clientes com abordagem mais racional, propostas de redução de verbas e ampliação de serviços para a área de gestão do marketing e desenvolvimento de produtos.
Uma vez mais se cai no erro da miopia de tentar racionalizar em excesso uma atividade que tem mais de arte do que de teoria e se beneficia de forma vital com a independência e multiexperiência das agências.
Isso quer dizer que as agências clássicas de publicidade estão preparadas para enfrentar o futuro dos clientes que atendem, o futuro delas e dos veículos? Absolutamente, pois há muito que evoluir, especialmente nestes tempos de virada na maioria do pensamento e atitudes das pessoas e de reorganização do mercado. Mas isso tem mais a ver com a “declinação” operacional do modelo do que com sua estrutura básica e será tema da próxima coluna.
Rafael Sampaio é consultor em propaganda rafael.sampaio@uol.com.br