O Índice Reykjavik 2019 coordenado pela Kantar apontou crescimento global das lideranças femininas no ambiente corporativo. No Brasil, a publicidade também tem levado mais a sério o tema e não encara apenas como tendência o aproveitamento da mulher em posições chaves do negócio. Não à toa, 44% do total de líderes nas agências são mulheres, segundo levantamento do PROPMARK e More Grls. A situação, no entanto, ainda é desigual se considerarmos a alta liderança, como cargos de presidente e CEO. A alta gestão das agências ainda é muito masculina: apenas 10% é composta por mulheres.

“Estamos em um negócio feito por pessoas, onde o talento faz toda a diferença. Portanto, quanto mais diversidade tivermos, melhor será o resultado do nosso trabalho. Na David, temos um quadro equilibrado, com 52% de mulheres e 48% homens, e isso se repete, também, na liderança: dos 9 heads, 5 são mulheres; e 4 homens. Os bons resultados de uma empresa não dependem nunca de apenas uma pessoa, mas de um time, que deve ser diverso em todos os sentidos. É inegável o infeliz fato de que ainda há pouca mulher na liderança das empresas. Quando estamos nessa posição, é uma chance para inspirarmos as pessoas nessa direção, mostrando que, na sua agência, as oportunidades são para todos”, explica Sylvia Panico, diretora-gerente da David no Brasil e COO global da rede do WPP.

O esforço para equiparar essa conta entre homens e mulheres na liderança também contempla profissionais que abriram o próprio negócio, como Gabriela Hunnicutti, CEO da Bold. Ela acaba de mudar o modelo da agência para o conceito de células. “A meu ver esse formato abre espaço para uma maior integração e troca de ideias. Consequentemente, maior crescimento profissional para as pessoas e para o negócio.”

No caso da designer Ana Couto, seu nome estampa sua agência, que atualmente opera com perfil full. “Acho que existe uma diferença entre mulheres executivas e mulheres empreendedoras. As empreendedoras são a maioria. Das empresas que são abertas no Brasil, 52% são abertas por mulheres e 1/3 dos negócios no país são de empreendedoras”, explica Ana.
“A empatia feminina é uma qualidade que pode ser vista como diferencial quando a líder consegue transmitir esse equilíbrio entre exercer uma liderança focada em resultados e um “safe space” para as pessoas se desenvolverem e inovarem. Estudos mostram que empresas geridas por mulheres tendem a ser mais diversas – que é um componente fundamental para inovar – e mais rentáveis”, acrescentou Ana Couto.

Ana Couto: “Das empresas que começam no Brasil, 52% são abertas por mulheres”

Anna Karina Brockes, diretora de criação da Bold, utiliza números: “Segundo o IBGE, mulheres trabalham até 72% a mais que os homens em tarefas domésticas. Então, o terceiro turno certamente vai existir; as mulheres são 51,5% da população no Brasil, que representam 85% do poder de compra, apesar de não se sentirem representadas pela publicidade. Para falar com elas é preciso dar voz a elas; o estudo do Peterson Institute for International Economics de 2016 apontou que ter mulheres na liderança significa mais rentabilidade para a empresa.

Ana Karina acrescenta: “Quando cheguei à Bold encontrei uma equipe muito diversa, com 70% de mulheres no quadro de liderança, 60% de mulheres no time, 50% de mulheres no quadro societário, 30% de LGBTQI+ e 17% de negros. Meu desafio aqui, além de ajudar a melhorar a qualidade criativa da agência, é cuidar das pessoas e manter a diversidade da equipe. É ajudar a promover um dos nossos principais valores, que é gente que gosta de gente e de, principalmente, levantar a importância do autocuidado na construção da auto estima, não só profissional, como também pessoal, que é tão importante no nosso cenário atual.”

Ana Karina Brockes (Bold): “O terceiro turno certamente vai existir”

Desde dezembro de 2019 na posição de CEO na Lew’Lara\TBWA, após uma passagem disruptiva pela direção-geral da Grey Brasil, a executiva Marcia Esteves tem certeza de que a presença de mulheres em cargos de gestão não é apenas uma questão de apoio à diversidade, mas de valorização da eficiência.

“O olhar feminino é tão rico e valioso quanto os demais olhares. O olhar jovem e o olhar maduro, o olhar ingênuo e o sofisticado, o olhar de raízes culturais do campo e o olhar urbano, o olhar da razão e o olhar da intuição. O que seria da criatividade da qual depende a publicidade sem esses olhares? Por isso julgo ser tão importante o equilíbrio e a complementaridade não somente na liderança, mas na empresa inteira”, raciocina Marcia.

Marcia Esteves: “julgo ser tão importante o equilíbrio e a complementaridade não somente na liderança, mas na empresa inteira”

Na opinião de Marcia, a missão das lideranças é propiciar as condições para desenvolvimento. “Para que todos, sem exceção ou distinção, possam evoluir, se desenvolver. Isso passa por ter o compromisso de inclusão, diversidade e respeito como palavras de ordem. Desta forma, a empresa estará conectada à realidade do nosso país e automaticamente atingirá melhores resultados de negócio, conectando e incluindo as marcas na vida dos consumidores.”

Carol Boccia, vice-presidente de operações da Africa, fala que 56% dos cargos de liderança da agência têm gestão feminina. “E entendemos a importância de manter esta equidade. Diversidade de gênero é uma pauta constante na agência. Nosso foco em diversidade de gênero está na criação. Hoje, essa é a área que tem o maior desequilíbrio. Para mudar isso realizamos algumas iniciativas. Por exemplo, em 2019 foi feito um trabalho de orientação de carreira voltado para mulheres criativas (Mostra a Pasta), que será repetido este ano devido ao sucesso”, frisou Carol.

“Somos quatro mulheres em um board de sete pessoas, portanto, a maioria. E creio que chegamos até aqui porque cada uma de nós, a seu jeito, não se calou ao enfrentar as adversidades que a carreira nos trouxe. Uma vez, quando eu tinha apenas seis meses em uma nova agência, descobri que o plano de saúde para os funcionários homens era estendido para suas mulheres e filhos. Mas que as funcionárias mulheres não tinham esse mesmo benefício. Ao questionar o CFO, ele respondeu: ‘São os homens que sustentam a casa’”. Apesar da revolta que senti, enfrentei a situação com argumento e paciência. Um tempo depois, todas a mulheres da agência tinham o mesmo benefício. Tenho orgulho de ter uma CFO mulher na agência. Justa, independente do gênero”, relata Marcia Aguirre, VP de estratégia da Tribal.

“Somos quatro mulheres em um board de sete pessoas, portanto, a maioria”, diz Marcia Aguirre (Tribal SP)

Historicamente a Ogilvy teve mulheres no comando. As executivas Charlotte Beers e Shelly Lazarus foram CEOs globais da rede. No Brasil, 70% do board executivo é formado por mulheres, como enfatiza a Chief Marketing Officer Karina Ribeiro.

“Temos uma série de iniciativas internas e de parcerias na Ogilvy que formam e incentivam o desenvolvimento dos nossos funcionários, entre eles o Programa de Mentoria, que é direcionado para os líderes, tanto homens quanto mulheres, e tem como foco desenvolver habilidades e desafios do dia a dia. Regularmente promovemos capacitações, workshops e treinamentos em várias áreas. Especificamente para mulheres realizamos o programa “30 for 30”, com duração de 3 meses, que reuniu conteúdos sobre empoderamento, autoconhecimento e aspectos da liderança no dia a dia, entre outros pontos”, finalizou Karina.