Desde o ano passado, boa parte do meu trabalho é fazer reuniões com marcas e agências para projetos diversos e de diferentes tamanhos. Percebo que algumas coisas são padrão em diversas situações na relação da entrada do marketing digital e da publicidade dita tradicional.

As agências digitais chegaram no mercado como aquele jogador cheio de talento e uma grande promessa para o futebol, mas que não leva muito em consideração a experiência e legado dos mais experientes que ganharam grandes campeonatos, fizeram muitos gols e já deram muito dinheiro para os clubes.

O fato é que do lado das agências digitais se vende a ideia que, diferentemente da publicidade tradicional, se entrega números, ROI, segmentações avançadas, primeiras posições no Google, melhores resultados de performance, porém, há também uma grande reclamação que o maior dinheiro do marketing não é seu.

Acompanhamos o crescimento exponencial da criação das agências digitais no país. Grandes, médias e muitas chamadas “eugências”.  Uma vez que se aprende SEO, por exemplo, já pode montar uma agência com este foco. Aprende-se Ads e já pode abrir uma agência de mídia ou de performance, por que não? Mas a publicidade, a comunicação não é sobre o meio e sim sobre pessoas, são elas as impactadas com as peças de mídia no Facebook, nas buscas do Google e nos 5 segundos dos vídeos do Youtube. Por isso, ter novas ferramentas, agora digitais, para impactar as pessoas, não nos traz uma nova publicidade, mas sim mais formatos.

Não estou aqui desmerecendo as agências digitais e tampouco supervalorizando as agências tradicionais, mas escuto muito no dia a dia coisas tipo: “Pedi 50 mil para o e-commerce e negaram, mas para dar 15 milhões para o VT na Globo eles têm.” Esse tipo de reclamação não coloca na mesa que a agência foi criada para construção de marca e comunicação com pessoas para que gerem vendas. Engana-se quem acha que investir todo seu dinheiro em digital trará melhores resultados. Vi uma palestra do pessoal do todomundoquem.com que traz a visão de pessoas que não têm acesso à internet e não estão nas redes sociais – mais de 50% da população. Mas quem disse que o digital iria matar a TV, jornal e rádio, por exemplo, esqueceu dessas pessoas aí.

Ainda no meio deste jogo todo, tem algo que é muito forte nessa análise das agências jovens e mais velhas: o relacionamento. Já fui em inúmeras reuniões com marcas, onde a agência digital estava preocupada em falar dos números das campanhas de Adwords e a agência tradicional querendo mostrar a campanha de Natal e aprovar o visual para depois enviar o PSD pra agência digital desdobrar nas redes sociais. Obviamente, tem espaço pra todo mundo e muitas agências digitais vêm crescendo três dígitos ao ano, mas devemos colocar cada um em seu lugar. Muitas marcas só existem ainda hoje pela construção de marca que as agências fizeram para ela, o que cria um elo de confiança gigante e que não se quebra tão facilmente (e não se substitui porque você deu um ROI de 15 na campanha de Dia das Mães).

Esses dias falei com um CMO de uma grande marca e perguntei pra ele se valia ainda mesmo o investimento de um comercial com uma pessoa super famosa, na Globo, no intervalo de programas com grande audiência, pagando milhões e ciente do BV, ele me disse: “Se eu desligar isso a marca quebra. Depois que veiculamos no outro dia, vendemos absurdamente.” É muito importante frisar que os modelos de negócio das agências estão mudando, pois o digital trouxe essas mudanças, novos formatos, novas mídias e mais oportunidades para as marcas e novos formatos de agências, consultorias, coletivos criativos e muitos outros modelos que vêm surgindo. As estruturas das agências mais tradicionais estão se reduzindo, grandes grupos de publicidade fundindo, mas isso faz parte de um movimento natural de um mercado que precisa rever seus custos, mas que não o tira do jogo.

Recentemente a DPZ&T criou um núcleo de performance para a Renault, movimento que traz luz a essa necessidade das agências mais tradicionais, entregarem mais números, fazer mais com menos, mas que não tira elas do jogo. Assim como diversos outros grupos já compraram agências menores e que são especialistas em algum serviço específico, como CRO, por exemplo, mas para ser um setor da agência e nunca maior que ela em si. E tá tudo bem.

Vejo o mercado crescendo muito pelos novos formatos que o digital nos trouxe, novos modelos de negócio, agências, consultorias e diversos outros formatos de entrega de serviço, mas calma lá, tem que ter ritmo de jogo, conhecer bem o campo, os adversários, as regras, treinar bastante para só assim ganhar grandes campeonatos. Publicidade é mais sobre relacionamento e entender de pessoas, do que sobre canais e ROI.

Rafael Martins é CEO do Share