A proporção de agências que oferecem os chamados serviços complementares, que vão além da propaganda, mais do que dobrou na comparação entre 2014 e 2017 – saltou de 29% para 67%. O dado consta no estudo Perfil e Tendências das Agências de Propaganda, do Sinapro-SP (Sindicato das Agências de Propaganda do Estado de São Paulo), realizado pela Toledo & Associados, que entrevistou 275 empresas do setor no estado de São Paulo, entre junho e agosto deste ano.

Mesmo entre as agências de grande porte da capital paulista, com receitas acima de R$ 50 milhões, a variação foi grande no período, indo de 42% para 67% das empresas com ofertas complementares. Entre os principais tipos de serviços analisados pelo estudo estão o digital, produção de conteúdo, eventos, marketing promocional, produção de vídeo e relações públicas.

Por trás dos números, uma constatação: já não se pode viver apenas de publicidade. Os negócios complementares ainda são pouco representativos em termos de receitas, como aponta o Sinapro-SP. No caso do serviço “digital”, por exemplo, a participação é de 11% na média estadual, caindo para 7% entre as grandes agências com receita acima de R$ 50 milhões. No entanto, eles trazem aquilo que interessa às agências: lucratividade.

“As margens das agências caíram e não vão voltar aos níveis de antes. A crise apenas potencializou isso. Precisamos diversificar as receitas para manter a rentabilidade”, reconhece Ricardo Calfat, sócio e COO da REF, que, no começo de outubro, abriu um braço para atividades de relações públicas, a 4PR, que tem na composição societária, além de Ricardo Calfat, Renato Pereira, Eduardo Barros, Fernando Calfat, já unidos na REF, e o jornalista e CSO da empresa Alexandre Spínola. Em 2012, a REF lançou a produtora de conteúdo Black Door, outro negócio complementar. “Agora, temos interesse em estabelecer uma empresa de tecnologia, para representar softwares internacionais no Brasil. É o nosso próximo passo”, afirma Calfat.

Médio
Abrir novos negócios de comunicação com sócios externos tem sido uma tendência entre outras agências de médio porte. A Santa Clara, por exemplo, é uma que também possui área de relações públicas. Entre as grandes, tem se tornado tendência o lançamento de unidades de negócios com modelos de negócios alternativos. Em julho, a Ogilvy lançou o Cognitive Studio, área que explora a computação cognitiva sob a plataforma IBM Watson – que gerou projetos como A voz da arte, para a Pinacoteca de São Paulo.

A ação, premiada com três Leões no Festival de Cannes deste ano, utilizava inteligência artificial para tornar o passeio ao museu mais interativo e personalizado. No mês anterior, a agência criou o Content Studio, estrutura de criação, produção e monitoramento que presta serviços de conteúdo digital ou como operação dentro do cliente ou a partir da própria agência. “Não dá nem para chamar de serviço complementar mais. A questão hoje é que a relação de marcas e consumidores ocorre em um ecossistema completamente novo, totalmente em tempo real, em muito mais canais e todos com total interação”, afirma Fernando Musa, CEO da agência.

“A questão da inteligência artificial, por exemplo, é uma realidade que já começa a mexer com a vida das pessoas, a fazer parte de muitas das interações reais. Logo, se faz parte da vida das pessoas, tem de estar no radar de uma agência, de alguém que cuida de marcas e desta relação. Importante frisar ainda a importância de toda área de data intelligence, que é no momento o sangue que corre através de absolutamente todas as outras áreas”, analisa.

O fato é que, além da importância de possibilitar à agência uma oferta mais integrada, esses serviços trazem novas receitas, geralmente com boa margem. Segundo Musa, o Content Studio já é uma das áreas que mais crescem na Ogilvy. Em relação a novas unidades do tipo, ele afirma: “Temos de estar juntos de tudo aquilo que se relaciona com tecnologia e transformação do negócio dos clientes, porque tudo isso hoje é parte da construção de marca e do negócio”.

Complexo
Em um cenário em que os serviços de comunicação se tornaram tão complexos e diluídos em centenas de canais e tipos de entregas, talvez já não faça mais sentido falar em “serviço complementar”, como defendeu Musa. Uma das facetas polêmicas do estudo, por exemplo, é considerar o digital como algo complementar. Questionado sobre isso, Dudu Godoy, presidente do Sinapro-SP, afirmou que o item será mantido no estudo do ano que vem. “É um item complexo, porque abrange desde a criação de campanhas até a mídia programática, uso de dados, entre outros pontos. Além disso, há agências que ainda não evoluíram suficientemente nessa área”, afirmou.

Boa parte das 275 agências do estudo tem porte pequeno. Nelas, a realidade de precisar fazer “de tudo um pouco” para sobreviver fica ainda mais evidente. É o caso da Octopus, da região do Grande ABC paulista. Segundo seu presidente, Paulo Cesar Ferrari, a empresa, de 40 anos, passou a fazer campanhas digitais, produção de conteúdo, inbound marketing, live marketing, produção de vídeos e comunicação corporativa. “Tudo isso amarrado ao principal foco da agência, que é planejamento e branding”, afirma. Outro exemplo de multidisciplinaridade é a Maria São Paulo, que tem ofertas complementares de relações públicas e inteligência de dados. “Detestamos desperdiçar oportunidades”, resume Juan Maresca, CEO da empresa.

Independentemente do tamanho do negócio, qualquer agência vivencia hoje um cenário de profundas transformações. “Elas estão avançando na transformação do seu modelo de negócios, tanto com ampliação de serviços, quanto incorporação de competências tecnológicas e de estratégia de negócios”, analisa Godoy.