Em um momento de transformação da indústria da comunicação, os profissionais do setor de planejamento e estratégia buscam redefinir seus papéis e a percepção do mercado sobre a relevância da função para o futuro do mercado. Duas importantes movimentações nas últimas semanas ajudaram a recolocar o setor no “spotlight”, com a contratação de Rodrigo Maroni, ex-Africa e presidente do Grupo de Planejamento, para se tornar head de desenvolvimento estratégico da Suno, e com a ida de Renata d’Ávila para o cargo de chief strategic officer (CSO) da FCB.

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O movimento de Renata, que vinha de passagens por Lew’Lara\TBWA e F.biz, ajuda a explicar um pouco a mudança que o setor pretende, em que se torna menos “planejamento” e mais “estratégia”. A profissional será responsável por funções que passam por planejamento estratégico, dados e BI, ocupando uma posição nova na estrutura da agência. Trata-se de um escopo totalmente diferente daquele que ela tinha em 2010, quando deixou a mesma agência após ocupar o cargo de head of planning. “Voltar para a FCB neste momento de renovação é muito especial. Há uma evolução natural no planejamento dentro da estrutura da comunicação. A estratégia se tornou algo vivo, em que a marca precisa ter um direcionamento claro, mas, ao mesmo tempo, estar conectada e se adaptar à cultura e à vida das pessoas. Assim, o planner precisa ter experiência mais holística e presente no dia a dia das contas”, afirmou.

Para a executiva da FCB, que inicia em sua nova função nesta segunda-feira (21), a visão “outsider”, de quem olha de fora, se torna mais importante em um ambiente de transformação de negócios, que demanda pessoas com visão de fatos que conectam pessoas e marcas, capacidade de interpretar sinais, fazer perguntas e encontrar respostas. “Acho que a principal mudança é que o que fazemos e somos hoje não cabe mais na palavra ‘planejamento’. Saem de cena os planejamentos anuais de longo prazo e as apresentações extensas de muitos slides. Eles dão lugar a estratégias mais vivas, adaptáveis, flexíveis”, concorda Renata Serafim, CSO da Lew’Lara\TBWA.

Renata d’Ávila, da FCB Brasil: há uma evolução natural na área

Ela lembra que o avanço de dados como fundamental gerador de insight e do conteúdo como importante expressão das marcas tem feito a área de planejamento ou estratégia estar mais onipresente no processo de comunicação e negócios. “Antes, fazíamos um trabalho para ajudar a marca a falar, era muito mais sobre discurso. Hoje, é muito mais sobre experiência, de fato. É sobre a marca ser e viver junto com as pessoas, uma relação vertical, de igual para igual”, completa.

Renata assegura que se manter relevante é o desafio do profissional de estratégia neste momento, inclusive, como gerador de negócios para a agência. “Temos o desafio crescente de estabelecer e monetizar produtos de estratégia que sejam relevantes para o mercado, transcendendo clientes fixos, que tenham um formato possível de divulgação e distribuição, e sejam fonte complementar de renda. É exatamente a crença nessa função e na sua relevância, que sempre me moveu e continua me movendo. Sem estratégia, nada para de pé. As coisas até podem acontecer, mas sem consistência, sem que construam uma história”, avalia.

Rodrigo Maroni: conexão das disciplinas dentro da agência

Um dos aspectos da transformação do setor, que podem o ajudar a manter a relevância, é a ampliação do que se entende por estratégia. Não se trata mais apenas de pensar na campanha, mas ir muito além no negócio do cliente. “A estratégia agora é viva, dinâmica, always on e cheia de novas oportunidades. A oportunidade para nós está em ser um ativo mais importante, indo desde a definição do produto e serviço até a concepção e implementação do marketing e comunicação. Se tem essa prerrogativa, o profissional pode trafegar em todos os níveis dos clientes, desde o consultivo até a estratégia de execução”, diz Rodrigo Cerveira, CSO da Z515.

“Se conseguir passar a arrebentação de uma área conectada somente com construção de estratégias de comunicação e ser percebido como um construtor de valor, mais consultivo, com uma entrega que transita do entendimento profundo dos desafios do negócio em conjunto com uma capacidade de resolução de problemas através da criatividade e da originalidade, o estrategista terá sempre um lugar não somente na indústria da publicidade, mas em qualquer mesa de qualquer negócio”, reforça o executivo.

Renata Serafim: avanço de dados é fundamental

Da mesma forma, Marcia Aguirre, vice-presidente de estratégia da Tribal São Paulo, fala que é preciso reconhecer que o pensamento estratégico, que antes focava principalmente na mensagem, precisa agora ser trabalhado de forma mais ampla. “Temos de dar um passo atrás, e sermos capazes de recomendar um novo modelo de negócio para o cliente, caso o produto dele esteja virando uma commodity, ou se seu serviço não esteja mais sendo usado porque as pessoas adotaram um novo comportamento. E dar um passo pra frente, sendo capaz de fomentar discussões sobre tipos de plataformas, ecossistemas digitais, data intelligence, pesquisas focadas em usabilidade e pain points”, analisa.

Segundo ela, data intelligence, user experience (UX), UX research, experience mapping, persona, jornada, pain point, mapa de navegação e ecossistema digital estão entre os temas que o estrategista precisa se especializar.

Rodrigo Cerveira, CSO da Z515: passar a arrebentação

Lugar
Nos últimos anos, o planejamento “achou” seu lugar, segundo Paula Queiroz, diretora de planejamento da Cheil Brasil. “Há cinco anos, o planning vivia uma grande crise existencial, porque nem todas as agências, criativos e até clientes tinham a cultura de trabalhar com time de planejamento no seu melhor potencial. A gestão da estratégia feita pelo planejamento estava se confundindo com um defensor de ideias criativas, um powerpoint estranho ou um profissional com entrega tática de canais. Acho que, hoje, essa realidade mudou, estratégica nunca se fez tão necessária”, avalia.

“A indústria como um todo está passando por uma transformação muito grande. Acredito que, hoje, o estrategista tem o principal papel de “descomplexar” todo esse novo cenário. A grande mudança no nosso papel está em entender como a marca navega pelos diferentes canais e formatos, sem perder sua relevância para o consumidor. Compreender como esse ecossistema funciona, com dados e todas as informações disponíveis, é o elemento-chave que transformou nosso papel”, complementa Marcio Stangalin, sócio e CSO da CL. “A complexidade do sistema atual exige do planner um conhecimento mais amplo, o que significa sair mais. A vida não acontece de verdade nos feeds de redes sociais”, analisa.

Marcia Aguirre: devemos recomendar um novo modelo de negócio para o cliente

Entidade que congrega profissionais do setor, o Grupo de Planejamento tem se transformado para atender aos anseios da área. “O papel do estrategista nas agências evolui de acordo com as demandas do mercado. Comparado há cinco anos, hoje há uma expectativa de que essa figura entenda de todas as disciplinas que ganharam relevância – como dados, Business Intelligence e uso de influenciadores, entre outras. Digital, então, nem se discute. E a expectativa é que essa evolução continue. Abraçamos essa evolução promovendo, por exemplo, a Data Masterclass em parceria com o Google; o Workshop de Comms Planning com Julian Cole; e o Mark Pollard, em parceria com o Facebook”, explica Rodrigo Maroni, presidente do GP e Head de Desenvolvimento Estratégico da Suno United Creators.