Antes da comunicação, o negócio

Alê Oliveira

Alexis Thuller Pagliarini

Uma reflexão sobre os rumos da propaganda no Brasil e no mundo, feita em companhia de um amigo antenado, me faz enxergar um movimento importante, que merece atenção redobrada das agências. Refiro-me ao interesse crescente das grandes consultorias de negócios pelo universo da comunicação.

Parece um movimento ainda silencioso, mas com potencial de bagunçar ainda mais o conturbado meio de campo das agências de marketing e comunicação. A lógica é a seguinte: as conhecidas Big Four – EY (antiga Ernst & Young), KPMG, Deloitte e PWC – participam de decisões de importância estratégica das empresas para as quais prestam serviços, certo? Juntam-se a elas outras consultorias de grande importância, como IBM, por exemplo. Esta, já atuando forte em processos de gestão de dados e de mídia digital.

Por que então não estender seus serviços ao campo da comunicação e do marketing? De fato, parece que elas estão começando a se interessar em romper as barreiras do discreto universo da estratégia de negócios e gestão administrativa para colocar a cabeça para fora e se tornarem players importantes também nos processos de comunicação das empresas com que já mantêm contato.

Esse movimento pode ser uma ameaça às agências de propaganda? Aparentemente, sim. Apesar de extremamente importante para o resultado de empresas, o marketing sempre foi um terreno pouco explorado pelas consultorias de administração de negócios. Agências e empresas especializadas eram acionadas após a conclusão dos serviços das consultorias, que eram focadas basicamente no estabelecimento de um norte estratégico.

O que parece estar acontecendo agora é que as consultorias “descobriram” o potencial de negócios que envolvem comunicação e começam a se estruturar para atuar na área. E o que pode acontecer? Imagino que as consultorias possam adquirir agências ou efetivar parcerias que as permitam incluir no seu portfólio os serviços de marketing e comunicação.

Por outro lado, vale a reflexão sob a ótica de uma agência de propaganda. Para ela, é mais difícil comprar uma consultoria, até porque muitas delas são pesos-pesados e muito bem consolidadas no mercado. Porém, cabe a possibilidade de se apresentar aos clientes e prospects como uma agência que pensa no negócio deles, e não especificamente nas criação e veiculação de campanhas publicitárias.

Mais do que nunca, os clientes esperam das suas agências ações que gerem resultado mensurável, ações que estejam fundamentadas no entendimento do negócio como um todo. Parece claro que as agências devam incluir nos seus times – talvez de atendimento – profissionais com uma visão mais estratégica de business.

Seriam esses profissionais, juntamente com planejamento, responsáveis por uma interlocução mais profunda com os clientes, entrando assim em sintonia com os anseios do cliente. Temos dito, aqui mesmo neste espaço, em outras ocasiões, que, nesses tempos bicudos, as agências devem ser mais proativas e não ficarem simplesmente à espera de um briefing.

Essa nova variável só pinta o quadro de cores mais fortes. Será que não é a hora de ter profissionais oriundos da especialidade de administração de empresas no atendimento? Não é a hora das agências entenderem mais de business models do que puramente de propaganda?

Será que o formato do briefing não deve mudar, incluindo, por exemplo, análise SWOT (Strengths/Fortalezas; Weaknesses/Fraquezas; Opportunities/Oportunidades e Threats/Ameaças)? Não sabemos muito bem no que isso vai dar, mas o exercício de se envolver mais no negócio dos clientes parece ser uma necessidade premente, independente da ameaça de se perder espaço para as grandes consultorias. Sentar à mesa da estratégia de negócios dos clientes dará mais trabalho e exigirá novos perfis de profissionais nas agências de propaganda, mas o resultado pode aparecer rapidamente, seja para fazer crescer a atuação das agências, seja para simplesmente proteger seus negócios.

Não tenho informações muito claras sobre esse movimento, mas ele parece lógico nas atuais circunstâncias. Fica então o alerta. Que sirva para uma reflexão positiva para a manutenção dos negócios das agências de propaganda.

*Superintendente da Fenapro e VP da Ampro