Existe uma gastronomia de estrada que não pode ser desprezada. Quando se viaja, é possível encontrar lugares que oferecem pratos inesquecíveis. Não estou falando da Toscana ou das estradas vicinais francesas. Falo daqui mesmo, das estradas de Minas, Espírito Santo, Bahia, por aí. Cozinhas que têm seu valor, pela autenticidade e talento. Mas é uma loteria. O termo “inesquecível” pode ser usado por conta de uma dor de barriga que resiste alguns dias ou de uma azia que dá a impressão que almoçamos um charuto aceso.

Como cheguei até aqui razoavelmente vivo e jamais me recusei à aventura de conhecer um lugar novo, dificilmente resisto à tentação de experimentar a “melhor linguiça da estrada” ou “a rainha da chuleta”, que é uma delícia, apesar do inevitável duplo sentido. Ambas estão na BR101. É de lá também a cadeia Queijão, cuja marca (óbvia) é um rato eufórico. A tal cadeia oferece alguns queijos, como o “Tipo Reino” ou um Serra da Canastra que podem transformar seu café da manhã numa festa.

Zé Guilherme Vereza também é assim, embora seja um pouco mais comedido, para não dizer bem mais fresco. Ele não chega às extravagâncias de enfrentar uma dobradinha no botequim num posto que se chama “Atrás do Muro” nem de ir fundo numa buchada. Mas o trivial menos barra pesada ele manda vir com a coragem dos desbravadores. Foi numa dessas que, também num posto, encontrou um cartaz que dizia: “carpacho especial”.

Ressabiado, confirmou se era mesmo o Carpaccio que tinha sido inventado no Harry’s Bar, de Veneza. Era. Zé mandou vir. Quando o prato chegou, eram praticamente duas postas de carne crua, de quase um centímetro de grossura, com muita mostarda, limão e o conteúdo de um vidro inteiro de alcaparras. Zé Guilherme reclamou: “mas esse carpaccio está com as lâminas muito grossas!” O garçom, não entendendo do que ele reclamava, explicou: “é que aqui nós fazemos no capricho!” Há muitos anos eu vivi um momento de anedota, quando perguntei como vinha o peixe anunciado num quadro negro e o garçom disse: “vem morto, lá do riacho”.

Dizem que uma colega nossa perguntou num restaurante de beira de estrada se o peixe que estava sendo servido era pirarucu. Segundo a lenda, o peixe era um surubim, mas a moça perguntou candidamente: “pirarucu?”. E o garçom: “tiraram, sim senhora”.

Uma que os irmãos Paim lá de Porto Alegre me contaram. Estavam eles também numa bodega às margens da estrada, quando entrou um gaudério daqueles bem gauchasco mesmo, grosso de dar orgulho, acompanhado de três moças.

Pediram um “espeto corrido” que é como chamam lá o rodízio. E uma delas comandou ao garçom Coca-Cola. Olhando pro gauchão, que garçom de responsa não fala com donzela, o atendente pergunta: “família?”, querendo saber o tamanho da garrafa a ser servida. O taura abre um sorriso e retruca: “mas o que é isso… é tudo puta!”.

Não tem muito a ver com isso, mas aquela colega nossa do pirarucu estava fazendo uma pesquisa na cidade sobre os hábitos de lazer das pessoas. E foi conversar com dois pescadores que estavam dando banho em minhoca na beira de um riachão mineiro.

E, lápis na mão, pranchinha com o formulário, pergunta: “o que vocês gostam de fazer quando estão de folga?” O caipira: “pescar, ué”. E ela, insistente, continua: “mas, além de pescar, o que vocês gostam de fazer quando estão de folga?”

E recebe a resposta: “nóis pesca de quando em vez. Mas, pra falar a verdade, nóis gosta mesmo é de fudê”. Até os peixinhos ficaram vermelhos.

Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor (lulavieira@grupomesa.com.br)