Há 60 anos no Brasil, quarto maior mercado de beleza, a L’Oréal aponta que o país é um laboratório a céu aberto e desempenha papel fundamental no mercado de cosméticos. “As brasileiras estão entre as mais exigentes do mundo. Se conseguirmos satisfazer às suas necessidades, conseguiremos satisfazer qualquer consumidor do planeta”, comenta An Verhulst-Santos, presidente da L’Oréal Brasil.

Na entrevista a seguir, a executiva destaca o foco no empoderamento feminino, detalha iniciativas sustentáveis e fala sobre o objetivo em ser a empresa número 1 em digitalização dentro de seu segmento.

An Verhulst-Santos: “L’Oréal não testa nenhum de seus produtos ou ingredientes em animais há 30 ano” (Divulgação)

O consumidor brasileiro mudou muito ao longo de seis décadas. O que o de hoje tem em comum com o de 60 anos atrás?

Essa transformação, associada à diversidade étnica e cultural, faz com que o Brasil seja um laboratório a céu aberto e desempenhe um papel fundamental no mercado de cosméticos. É o único país onde encontramos os oito tipos de cabelos classificados pela L’Oréal, do liso ao mais crespo. Sobre os tons de pele, temos 55 de 66 tonalidades classificadas pela L’Oréal. Ao mesmo tempo que isto é um desafio, é uma ótima oportunidade para inovação. As mulheres brasileiras são apaixonadas por seus cabelos. Por esse motivo, investimos há mais de 10 anos em pesquisa no país e inauguramos, há dois anos, um Centro de Pesquisa e Inovação, no Rio de Janeiro, o único do Grupo na América Latina e um dos seis hubs de pesquisa da L’Oréal no mundo. Ele reforça ainda mais o nosso compromisso de longo prazo com o Brasil.

Como ele atua hoje?

O Centro foi projetado com o que há de mais moderno em pesquisa e inovação: colaborativo, digital, aberto ao ecossistema científico e comprometido com a inovação sustentável. O objetivo é acelerar o desenvolvimento local de inovações em categorias onde os brasileiros são altamente exigentes, como cuidados com os cabelos, proteção solar e higiene, com potencial de lançamento mundial. Além de tornar as melhores inovações da L’Oréal relevantes para consumidores brasileiros e latino-americanos por meio de desenvolvimentos locais e da customização de tecnologias mundiais. Já desenvolvemos, por exemplo, produtos como Dercos Kera Solutions, primeiro protocolo dermocosmético para reparar cabelos danificados e o principal lançamento de Vichy para o ano, e a linha Anthelios Airlicium de proteção solar de La Roche-Posay, que renovou tanto a fórmula quanto a embalagem, trazendo mais durabilidade e tecnologia de não-transferência.

Quais os principais desafios de comunicar bem a L’Oréal, tendo um portfólio com 20 marcas e quatro unidades de negócios?

As 20 marcas são organizadas em quatro divisões de negócios que operam em circuitos específicos e complementares (Produtos para o Grande Público, Luxo, Cosmética Ativa e Produtos Profissionais para Salões de Beleza). Somos três mil colaboradores. Não temos uma estratégia de comunicação publicitária institucional, mas temos uma estratégia de fortalecimento de nossas marcas, que são nossas fortalezas. Cada uma tem um consumidor específico e nosso objetivo é atendê-los da melhor forma possível dentro de suas categorias. Temos uma extensa capilaridade de categorias e distribuição, que vai de perfumarias a supermercados, passando por salões e travel retail.

Um dos temas em evidência no mundo da beleza é a questão dos testes em animais. Como a empresa vê o futuro dessa questão nos âmbitos de negócios e de indústria?

A L’Oréal não testa nenhum de seus produtos ou ingredientes em animais há 30 anos e tem estado à frente de métodos alternativos por mais de 40 anos. Para contribuir e tornar os métodos alternativos uma realidade no Brasil, a L’Oréal acolheu no Centro de Pesquisa e Inovação no Rio, a subsidiária brasileira da Episkin, que produz pele reconstruída e tecidos epiteliais e os disponibiliza em todo o mundo, não apenas para o Centro de Pesquisa & Inovação da L’Oréal, mas para outras empresas, grupos de pesquisa ou centros de testes. Estes tecidos são ferramentas validadas para serem usados como métodos alternativos para substituir o uso de animais em testes de segurança. Já disponibilizamos ao mercado o modelo de pele humana reconstruído para avaliar a segurança e a eficácia de novos ingredientes e produtos. É o terceiro laboratório no mundo e o primeiro nas Américas.

A L’Oréal está na China, onde autoridades de saúde exigem testes em animais para determinados produtos. Por que a empresa segue no país e o que tem feito sobre essa lei?

A L’Oréal tem se comprometido a trabalhar junto com as autoridades e cientistas chineses por mais de 10 anos para que os métodos de testes alternativos sejam reconhecidos, e para permitir que a regulamentação sobre cosméticos evolua em direção a uma eliminação total e definitiva dos testes em animais. Desde 2014, alguns produtos fabricados e vendidos na China, como xampus, sabonetes líquidos para o corpo ou maquiagens, não são mais testados em animais. Abrimos um Centro Episkin em Xangai para produzir peles reconstruídas a fim de desenvolver testes in vitro de segurança. O Episkin Academy, criado para treinar toxicologistas, assessores de segurança e autoridades, tem disseminado a cultura de métodos alternativos na China nos últimos quatro anos. A L’Oréal também disponibiliza esta tecnologia às autoridades chinesas, compartilhando os nossos procedimentos de teste e conhecimentos técnicos.

Outra questão é a ‘beleza real’, com questionamentos aos ‘padrões’ e ‘correções’ para apresentar ‘mulheres perfeitas’ em campanhas. Qual a opinião da empresa sobre isso?

A L’Oréal está e deve estar sempre atenta às mudanças e exigências dos consumidores. Estamos constantemente inovando pensando neles. Incentivamos a autorrealização, a autoestima e, principalmente, a conversa entre mulheres. O papel da mulher na sociedade mudou e também o estilo de vida das mulheres com mais de 40 anos. Hoje, a idade perfeita é a em que nós nos sentimos bem, realizadas. Temos de olhar para o que somos, para nossa essência, e não para nossa idade. Pensando nisso, a L’Oréal Paris lançou o movimento Idade sem Tabu. Organizamos, em setembro, um Beauty Talk com as atrizes Cláudia Raia e Tais Araújo e as apresentadoras Fátima Bernardes e Fernanda Gentil. Elas falaram sobre idade e empoderamento, compartilhando vivências. A marca busca empoderar as mulheres através da autoestima, independentemente do momento de vida. Em comunicação, trabalhamos com programete no GNT, anúncios e abordamos o assunto nas redes sociais.

Há equidade de gênero nas lideranças? Como é a estrutura hoje?

Nossa missão é Beleza para Todos. Diversidade e inclusão estão no nosso DNA e são estratégicos para o nosso crescimento sustentável. Na L’Oréal Brasil, 40% do Comitê Executivo é composto por mulheres e 58% do quadro funcional são mulheres. Nosso objetivo é ser um espelho da sociedade. Queremos promover a inclusão em todas as dimensões: nos colaboradores; nos produtos e na comunicação de nossas marcas; e em projetos de protagonismo social que apoiamos.

Tendo conceitos de sustentabilidade como base da companhia, quais são as iniciativas da empresa no Brasil?

Nossa performance em sustentabilidade é tão importante quanto o nosso sucesso econômico. Lançamos em 2013 o nosso programa Sharing Beauty With All, que define metas de sustentabilidade do Grupo para 2020. No Brasil, há três grandes focos: transformação de nossa cadeia de valor, combate às mudanças climáticas e protagonismo social. Fechamos uma parceria com a Engie, empresa privada de energia, para garantir uso exclusivo de eletricidade de fontes renováveis em todas as nossas unidades, reduzindo nosso impacto ambiental. Com o uso de energia limpa do parque eólico de Trairi, no Ceará, evitamos a emissão de 7 mil toneladas de CO2 na atmosfera, o equivalente ao plantio de mais de 43 mil árvores. Até o fim do ano, prevemos a formação de mais de 1.100 estudantes desde o lançamento das nossas escolas profissionalizantes de beleza em comunidades do Rio de Janeiro, em parceria com a Casa do Menor, em Nova Iguaçu, e a Redes da Maré, no Complexo da Maré.

Pode falar sobre o objetivo de ser uma beauty tech?

O Grupo L’Oréal tem a ambição global de ser uma beauty tech e a empresa número 1 em digitalização dentro de seu segmento. O ambiente digital e o e-commerce são peças-chave para isso. Nossa meta é o que chamamos de 20/50/100: 20% de nossas vendas provenientes do e-commerce, 50% de interações personalizadas e 100% de marcas adoradas.

O ano de 2019 teve muitas novidades nesse sentido?

Lançamos o aplicativo Color Match, desenvolvido pela ModiFace, empresa especializada em realidade aumentada e inteligência artificial. Ela foi adquirida pela L’Oréal e hoje atua desenvolvendo soluções tecnológicas para nossas marcas. O aplicativo permite que a consumidora experimente as 32 tonalidades de Garnier Nutrisse antes de mudar o visual dos cabelos, evitando os riscos inerentes ao processo de coloração e deixando mais fácil a escolha da cor ideal. A Divisão de Produtos Profissionais de L’Oréal (que inclui L’Oréal Professionnel, Kérastase e Redken) desenvolveu o L’Oréal Access, plataforma digital voltada para educação e desenvolvimento do profissional de beleza. É um espaço multimarcas de e-learning e networking aberto. Nossa marca Lancôme também lançou uma plataforma digital para compartilhar conteúdo de beleza. A revista digital Paris Inspires foi inspirada no estilo de vida das mulheres parisienses e leva dicas de maquiagem, skincare e fragrâncias. O objetivo do site é trazer mais inspiração para o público da marca, com dicas, tutoriais ou segredos dos especialistas. Em e-commerce, também avançamos significativamente. Nossas vendas online estão crescendo 58% versus 2018 através de nossa operação direta de e-boutiques e marketplaces, mas também por meio de parceria com nossos clientes e-retailers e pure players.