Artigo de Gustavo Bastos propõe aproveitamento do desfile da Unidos da Tijuca
Sejamos todos Paulo Barros
*Gustavo Bastos
A história poderia ser contada do ponto de vista da persistência, mas seria pouco falar apenas neste aspecto. Poderia também ser contada do ponto de vista das voltas que a vida dá, já que um ex-comissário de bordo nascido em Nilópolis, baixada fuminense, foi parar com o genial Joãosinho Trinta. Falando no mestre criativo, também poderia ser contada a história de aprendiz x mestre, ou como o jovem aprendeu com o mago seus truques e multiplicou sua capacidade de invenção de outros truques. Mas tudo isto seria pouco.
Como seria pouco falar só da criatividade, da ousadia, da quantidade de boas idéias que passaram na nossa frente na Avenida, vamos falar que estavam todas bem feitas, bem cuidadas, gerando um produto final inesquecível. O desfile da Unidos da Tijuca foi bom nos detalhes, mas melhor ainda no conjunto porque aliou criatividade com competência, ideia boa com produção apurada.
Acho que a história do carnavalesco Paulo Barros deve ser contada sob todos estes pontos de vista juntos e misturados, uma história sobre um talento que persistiu não só na ambição de ser campeão, mas na vontade de fazer diferente. E o melhor: uma vontade não matou, nem atrapalhou, a outra. Fico imaginando a quantidade de “conselhos” que o Paulo Barros ouviu – ou melhor, graças a Deus não ouviu – de fazer menos ousado, menos criativo, para ser campeão. Porque o que não falta é gente que sabe “o truque” para ser campeão, e geralmente esse “truque” passa por ser menos criativo, menos ousado, ter menos idéias, trocar conteúdo por forma pura, ousadia por técnica pura.
Só que, graças, o carnavalesco não sucumbiu à ideia de trocar conteúdo por forma, mas deu forma apurada às suas melhores idéias.
E eu, que trabalho com propaganda, sei a dificuldade de dar forma às ideias, para que elas saiam do papel e fiquem ainda melhores do que quando eram só uma idéia dentro da cabeça da gente.
O que se viu na avenida foi uma técnica mais apurada, um acabamento melhor, coreografias ainda mais bem ensaiadas além de criativas, ou seja, uma soma de fatores que resultou num conjunto inesquecível de técnica e criatividade, de acabamento e ousadia.
Era tanta ideia boa que tinha um carro com um Michael Jacksonb, outro com vários Batmans esquiando, Homem aranha escalando prédio, bateria com gangsters se metendo no meio, a histórica comissão de frente com as mágicas coreografadas magistralmente e tudo isso numa escola só, num desfile só. Apenas uma das coisas citadas acima já seria suficiente para levanter as arquibancadas, deixar a escola como a mais comentada do ano e ainda brigando pelo campeonato.
Mas isso tudo todo mundo já sabe, viu e aplaudiu. O que ficou na minha cabeça desde que assisti a apuração na quarta-feira é que a gente tem que levar esta lição para as nossas vidas. Não basta ter persistência, tem que se ter com amor ao que a gente faz, sem abandonar a criatividade, a ousadia e a alegria. Não ouça os conselhos que falam em se apequenar para se dar melhor na vida, para subir na carreira e ser mais aceito. Não ceda às tentações da mesmice e da preguiça mental, não se deixe levarpelos tristes, pelos complexados, pelos que só querem que todos façam mais do mesmo e que nada mude, pelos sem talento e sem alegria de viver. Deixe-se levar pela alegria, pela ousadia, pela criatividade, pelo talento. Isto serve para mim, para você, para o Rio de Janeiro, para o Brasil. Estamos no estado emergente do país emergente mais bonito e interessante do mundo. Vamos levar para o ano inteiro, para nosso dia-a-dia, nosso cotidiano esta criatividade, esta alegria, esta ousadia que pode sim se misturar com disciplina, bom gosto, técnica, competência, apreço pelo detalhe, pela qualidade.
Vamos todos ser Paulo Barros na vida, ou pelo menos tentar. Com persistência, ousadia e competência, a gente chega lá.
*Sócio e diretor de criação da 11/21
gustavobastos@onzevinteum.com.br