"As Olimpíadas são engajamento"

O Brasil está a poucos meses de receber, pela primeira vez, uma edição dos Jogos Olímpicos. No Rio de Janeiro, a organização corre contra o tempo para terminar as obras de arenas, estádios e mobilidade urbana, entre outras. Por outro lado, marcas se aquecem. José Colagrossi, diretor do Ibope Repucom, avisa: Jogos Olímpicos são diferentes de Copa do Mundo, sob o aspecto de patrocínio. “Olimpíada é mais engajamento. A Copa do Mundo é a história das seleções. É o Brasil, a Argentina, a França, a Alemanha. Os Jogos Olímpicos são a história dos atletas”, completa.

Alê Oliveira

“tenho um pouco de preocupação que o povo julgue o sucesso das Olimpíadas pelo número de medalhas que o Brasil vai conquistar”

Desde quando existe o Ibope Repucom?

O Ibope Repucom é uma parceria estratégica entre o Ibope e a Repucom, que é a maior empresa de pesquisa em marketing esportivo do mundo. É uma empresa global, com escritório em mais de 27 países. O expertise da Repucom é a análise de eficiência de patrocínio. E nós analisamos a eficiência de patrocínio através do alcance, para saber até onde chega o patrocínio. Se se for televisão, é por meio da audiência; se for jornal, é circulação; se for mídia social, são likes, compartilhamentos, engajamentos e por aí vai. A gente mede até onde chega a marca, esse é o objetivo do Ibope Repucom. Medimos o impacto tanto qualitativo quanto quantitativo. Queremos saber como isso impacta o consumidor. Ou seja, o mínimo denominador comum nosso é a análise de eficiência de patrocínio.

Isso tudo no esporte ou vocês atuam também em outras áreas?

O esporte é, sem dúvida, 70% do que a gente faz. Mas a gente faz, por exemplo, aqui no Brasil, o Carnaval do Rio de Janeiro e o Carnaval de São Paulo. Nós também fazemos vários eventos culturais, como o Festival de Cinema de Gramado, o Festival Folclório de Parintins e o Carnaval de Olinda. A nossa análise é o seguinte: existe o patrocinador, o patrocinado e existe a mídia no meio do caminho. Nós complementamos a análise de mídia com pesquisa. Essa análise de mídia diz quanto essa marca apareceu, mas não mostra o quanto ela foi lembrada. Então, a pesquisa fala qual foi a capacidade que a marca teve em ficar na cabeça das pessoas.

Apesar do mau desempenho da seleção brasileira na última Copa do Mundo, o futebol continua sendo a grande aposta das marcas?

Sem dúvida. Se você fizer uma análise do total que é gasto com patrocínio em todos os esportes, você vai observar que o futebol ocupa uma posição muito boa. O futebol já foi 90%, num certo momento. E hoje está entre 60% e 70%, o que é muito ainda. Ou seja, muitos esportes cresceram. Tivemos o crescimento do automobilismo, do vôlei, do basquete, do MMA, além do crescimento de patrocínio de corridas de rua. O MMA foi o esporte que mais cresceu na década. Em cinco, seis anos, ele cresceu porque veio de um espaço muito pequeno. Quando você é um esporte de nicho, percentualmente, o crescimento é grande. O MMA atingiu o seu auge em 2014, porque o Brasil tinha vários campeões mundiais ao mesmo tempo, sendo que vários deles eram celebridade que extrapolavam o esporte, como Anderson Silva e Minotauro. Ou seja, o Brasil tinha sucesso na competição e esses eram celebridades fora do esporte. Ele continua sendo um esporte importante, um Top 10 no país, mas de 2014 para cá alguns dos nossos lutadores perderam seus títulos mundiais. Ou seja: o esporte brasileiro ainda é muito dependente de resultado e, quando o esporte não tem muito resultado positivo, o interesse dos fãs ocasionais se dilui um pouco.

Isso, então, não vale para o futebol?

Não, porque o futebol é diferente. Ele é um esporte que já está enraizado na nossa cultura. O futebol depende de menos resultado que os outros esportes. Mas tem uma coisa interessante nisso: estamos percebendo uma migração do interesse do público pelo futebol internacional. Uma parcela considerável dos fãs de futebol, de 16 anos a 29 anos, também torce para um time internacional. O que não significa que ele não tenha um time no Brasil. Alguns dizem que são exclusivos de Real Madrid e Barcelona, o que representa um número pequeno. São pessoas que seguem gostando de futebol, mas que buscam futebol de melhor qualidade, onde os ídolos estão jogando. Então, o futebol brasileiro ganhou um concorrente que não tinha antes.

As Olimpíadas, pelo número de esporte que existe e por ser realizada no Brasil, pode mudar esse cenário?

Se você analisar essa década, o que ocorre é que, em ano olímpico – o último foi em 2012 em Londres –, há um crescimento grande por parte das pessoas em esportes olímpicos. Mas aí passam os Jogos Olímpicos e esse interesse cai um pouco. É como uma escada com um degrau grande e outro pequeno e assim por diante. Essa é a tendência, tanto é que dá para reparar o crescimento do número de participantes de esportes olímpicos, não vertiginosamente, mas tem crescido. A Olimpíada é a grande plataforma disso. E os Jogos Olímpicos deste ano serão no Brasil, no Rio de Janeiro, então a pergunta é: por serem no nosso país e, consequentemente, por conta da grande exposição que o evento terá, o legado esportivo vai ser superior ao de Londres, que foi a última edição do evento? Não sei! Depende de várias coisas, inclusive dos resultados das competições. Mas, sem dúvida, o número de participantes nas modalidades vai crescer e vai continuar crescendo.

O Ibope Repucom já fez algum estudo de alcance de patrocínios olímpicos?

Ainda não houve nenhum grande evento para que a gente pudesse ter uma ideia sobre a relação das marcas com os Jogos Olímpicos deste ano. O primeiro grande evento vai ser realizado apenas em abril, que será o revezamento da Tocha Olímpica. Até o momento não houve nada de grande exposição. Tivemos os eventos-teste, mas que não contaram com uma grande cobertura por ser tratar, em alguns dos casos, de eventos que avaliam muito a parte técnica para saber se a raia está pronta, se a piscina está ok. Agora, o que é interessante notar, até mesmo porque vão comparar os Jogos Olímpicos com a Copa do Mundo, é que também vão comparar o resultado dos patrocínios do Mundial com o das Olimpíadas. Temos de entender o seguinte: os Jogos Olímpicos, pela sua natureza e pela sua origem amadora, não têm exposição de marcas nos jogos. Enquanto na Copa do Mundo você tem várias placas de campo, você tem a bola, que é a da Adidas, você tinha o backdrop oficial dentro de campo e muita inserção de mídia, na Olimpíada não tem nada disso. A Olimpíada ainda mantém o seu caráter amador, que veio lá da sua origem. As únicas marcas que aparecem são as, por exemplo, do uniforme dos atletas, mesmo assim de forma discreta. Não tem outra marca que aparece. O patrocínio de Jogos Olímpicos é, por natureza, radicalmente diferente do patrocínio de Copa do Mundo. Ou seja: você que é patrocinador das Olimpíadas, precisa alavancar o seu patrocínio de outra forma, já que não vai haver exposição. É mais complicado.

E como as marcas fazem isso?

Fazem mais em evento, em hospitalidade, em mídias sociais. Ou seja, você usa a marca para criar engajamento com o atleta especificamente. Você precisa ser mais efetivo e criativo, precisa conhecer a fundo o mundo digital, porque colocar placa qualquer um coloca. Agora você fazer uma ativação em rede social, é preciso gerar conteúdo. Isso cria um engajamento maior. Mas tem outra diferença: a Copa do Mundo é a história das seleções, é o Brasil, a Argentina, a França, a Alemanha; já os Jogos Olímpicos são a história dos atletas. E essa história, não necessariamente, traz a história do país que ele representa. O Usain Bolt, por exemplo: se você fizer uma pesquisa do Brasil, poucas pessoas vão saber de onde ele é. Vão achar que ele é americano, inglês, enfim. Nas Olimpíadas, a estrela não é uma seleção, é um atleta. O foco é muito no individual. Na hora que tiver a final dos 100 metros rasos, não vai ser Jamaica contra Estados Unidos, será o Bolt contra o fulano de tal. Na piscina será a mesma coisa. O patrocinador precisa entender que é assim que ocorre.

Como você resumiria isso? 

O futebol é exposição, as Olimpíadas são engajamento.

Você acredita que as marcas já entenderam isso?

Algumas marcas fazem isso muito bem. Um exemplo disso é a P&G. Para as Olimpíadas de Londres, a marca fez um filme que mostrava várias mães levando seus filhos para treinar até eles chegarem aos Jogos Olímpicos. O filme, no final, diz: “P&G, patrocinadora oficial das mães”. Ela não é patrocinadora dos atletas, mas sim das mães. Ou seja, isso cria um engajamento enorme com as mães. De novo, os Jogos Olímpicos permitem isso porque não é uma seleção, são atletas. No futebol, você não torce pelo Neymar, por exemplo, você torce pela seleção brasileira.

De uma forma geral, qual é a sua expectativa para o evento?

Eu acho que, em termos de organização, o Brasil tem a imperfeita perfeição, como eu costumo usar nas minhas palestras. Nos Jogos Olímpicos de Londres, por exemplo, o ponto forte foi a organização. O evento de Londres foi impecável. Tudo funcionou. Do transporte à bilheteria. O Brasil é conhecido por receber as pessoas. A Copa do Mundo foi perfeita porque, entre outras coisas, teve uma grande festa. Do ponto de vista de organização, algumas coisas não vão ficar prontas. Vai ser uma festa fantástica, que vai deixar um legado formidável. Vai ser um sucesso de confraternização. Já em relação ao esporte em si, eu tenho um pouco de preocupação que o povo julgue o sucesso das Olimpíadas pelo número de medalhas que o Brasil vai conquistar. Você já percebeu que outros países têm se destacado bastante em vários esportes. A China é um exemplo. Mas eu temo que o Brasil não ganhe muitas medalhas e isso seja o parâmetro para medir o sucesso ou não dos jogos.