Avatares trazem humanização e modernidade para as marcas
Usar personagens para criar mais empatia entre o público e as marcas não é algo novo. Urso (Coca-Cola), Friozinho (Pernambucanas), Lek Trek (Sadia). Não faltam exemplos de mascotes com décadas de idade e lugares cativos no coração dos consumidores. Porém, a evolução tecnológica somada a novos hábitos de consumir conteúdo, formatos e linguagens está incrementando um terreno fértil a ser desbravado por marcas no ambiente digital: os avatares.
Tomás Duarte, especialista em NPS, experiência e satisfação do cliente e CEO da Track, explica que “o avatar é uma extensão da identidade, não só visual, mas intelectual de uma empresa”. Ele deve resumir aquilo que a empresa preza, pensa e tem como propósito. O profissional também faz questão de ressaltar que avatar é uma estratégia diferente de chatbot, conceitos que podem ser facilmente confundidos. “Chatbots trazem um pouco mais de personalização ao atendimento digital, mas o seu principal objetivo é muito mais direcionado a agilidade e automatização do atendimento, enquanto avatares trazem humanização à marca como um todo, e não apenas ao atendimento, criando personificação dos valores e personalidade atrelados à marca”, diz.
Quem começa a trilhar esse caminho é a Caoa, com a criação do Caoa Live, plataforma de atendimento digital, e da Assistente Remota de Atendimento: a Areta. A personagem tem como características ser jovem, transmitir confiabilidade e transparência, e cuidará do atendimento digital das áreas de vendas e pós-venda.
Jack Nunes, diretor-executivo comercial, afirma que a estratégia pretende humanizar a experiência digital dos clientes. “A Areta chega como um recurso importante para facilitar o primeiro contato do cliente e, por meio dela, conseguir informar o que deseja e ter respostas claras e objetivas para seguir com o seu atendimento”, diz. A intenção é que ela evolua.
O planejamento da evolução do personagem foi feito junto à consultoria Croma, a comunicação é feita pela equipe de marketing e redes sociais da Casas Bahia, em parceria com a agência VMLY&R Group. Já o visual foi desenvolvido pelo estúdio Miagui, de Porto Alegre.
Há menos de um mês surgiu um “novo” avatar, o CB, evolução do Bahianinho, que acompanha os brasileiros desde os anos 1960. Adolescente, ele representa sua geração atual: um jovem hiperconectado e ativista em causas ambientais, de diversidade e inclusão. Ilca Sierra, diretora de marketing e comunicação multicanal da Via Varejo, comenta que o CB acompanhou a evolução do varejo nacional, que cresceu e está mais digital. “Como a Casas Bahia, que mudou recentemente seu posicionamento, ele também representa todos os brasileiros. Em pesquisas entendemos que a relação do Bahianinho com o brasileiro era forte e respeitamos isso ao manter elementos fundamentais. Evoluímos o que era necessário para ele comunicar a nova fase da marca e atributos. Embora mantenha o aspecto divertido, o CB tem mais responsabilidades como porta-voz.”
Para Cássio Braga, diretor criativo e sócio da Miagui, as tecnologias de arte digital potencializam essa tendência ao possibilitar novas linguagens e técnicas. “A partir do momento que eles se tornam personas com uma ambição de ter uma vida digital, é natural que se comportem cada vez mais parecidos com influenciadores reais. Atualmente, com a tecnologia disponível, é quase impossível imaginar alguma limitação em âmbito técnico do que um personagem pode fazer. Já no âmbito comportamental, depende muito da proposta do personagem e da marca”, diz. Nesse sentido, ele acredita que é fundamental estabelecer um guideline e garantir que a essência do design estabelecido no início não se perca. “Um personagem costuma ter mais nuances a serem articuladas do que uma marca convencional.”
Num caminho paralelo apareceu a Riachuelo, que aproveitou a criação de avatares no Facebook para apresentar sua coleção de verão nas redes sociais. A varejista desenvolveu personagens baseados em seus colaboradores que estão vestindo as peças da marca. Elio Silva, diretor-executivo de marketing da Riachuelo, disse que a ação reflete a essência leve, alto-astral e próxima com o público. “Estamos sempre atentos aos novos hábitos e comportamentos. Ao ver vários dos nossos clientes desenvolvendo seus personagens, decidimos fazer parte dessa onda e mostrar as peças de um jeito diferente”, afirma.
Engajamento e influência
Quase alcançando a maioridade está a Lu, do Magalu. Ela surgiu em 2003, criada pelo Frederico Trajano, CEO da empresa, como uma assistente virtual para humanizar a experiência de compra no e-commerce e estreitar a relação com os clientes através de seus conteúdos explicativos no site. Hoje, a Lu passou a ser porta-voz da marca e a tangibilizar seus valores e posicionamentos.
Pedro Alvim, gerente de redes sociais e marketing de influência da empresa, explica que há um ecossistema sinérgico por trás da Lu, além de parceiros como ghostwriters e produtoras. Explicitando e defendendo as causas da empresa publicamente, ela é um case: mais de 21 milhões de fãs nas suas redes sociais, está no YouTube desde 2007 e tem o maior perfil de uma varejista em redes como o Twitter e Facebook. Há 3 meses no Tik Tok, já tem vídeos com mais de 16 milhões de visualizações orgânicas e alcançou um milhão de seguidores.
Alvin comenta que a Lu sempre foi mais do que uma ferramenta, que ela faz parte de algo mais amplo, uma estratégia de inclusão digital. “Queremos digitalizar o Brasil e democratizar a tecnologia, por meio do nosso ecossistema. Dar acesso a dispositivos conectados não é incluir as pessoas. Para incluir é preciso ajudar a pessoa a aprender a mexer e aproveitar todo o potencial da tecnologia a seu favor. E é para isso que a Lu existe. Ela é uma especialista em tecnologia, que descomplica, simplifica e explica a tecnologia. Ela produz muitos conteúdos para dar dicas para as pessoas, ensinando-as a usarem tecnologia. E tem mostrado seu cotidiano e lifestyle nas redes sociais”, detalha.
Também com propósito claro e uma identidade já bastante fortalecida está a Nat, da Natura. Ela nasceu como assistente virtual em 2018, para ajudar consumidores, consultoras, líderes e gerentes de negócio a solucionar as dúvidas frequentes de forma ágil e mantendo a proximidade com a marca. Mas com a aceitação e a identificação do público ela assumiu o perfil da empresa no Twitter e se transformou em consultora de beleza, influenciadora digital e porta-voz na rede.
Paula Pimenta, diretora da Central de Relacionamento da Natura, conta que a Nat ajudou na aproximação com o público jovem hiperconectado e em novas formas de conexões com outros públicos. “Ela também pode ser acessada pelas consultoras em nossa plataforma digital, e pelas líderes e gerentes de negócio em um aplicativo exclusivo da Força de Vendas. No último ano, tanto consultoras quanto consumidores passaram a interagir no WhatsApp. A atuação dela chegou à Natura Argentina e demais operações da América Latina ao longo deste ano”, comenta.
Assim como no Magalu, há um grande ecossistema para dar vida a ela. No Twitter, uma equipe exclusiva cuida da estratégia, tom de voz, conteúdo e interações. Trabalhando em sinergia há também uma equipe de atendimento que cuida dela em canais digitais como WhatsApp, app e site. “Como representante da marca, nosso avatar é uma extensão de nossos propósitos e causas. Como qualquer colaborador da Natura, a Nat vive a cultura da empresa, é acolhedora e empática para que as boas experiências com a marca tenham continuidade no mundo virtual. Está profundamente conectada com a essência da Natura, com os seus ideais e contribui para a maneira com a qual queremos seguir interagindo com o público.”
Uma linha quase invisível
Não faltam imagens do CB, da Lu e da Nat fazendo atividades do dia a dia, seja cuidando da casa, protegendo o meio ambiente, viajando, visitando fábricas, interagindo com influenciadores de carne e osso. A lista de ações no mundo real cresce rapidamente e parece estar sendo bem aceita. Duarte, da Track, fala que para não soar estranho o limite é a aderência com o mesmo. “Por exemplo, se a marca entende que o seu público não frequentaria certos tipos de eventos ou ouviria certos tipos de música, o avatar também deve evitar tais ações. O comportamento e a personalidade do avatar devem ser um espelho do público que a empresa deseja atingir”, diz.
Paula conta que a Natura tem uma cultura de testes muito presente e a equipe avalia diariamente as diferentes oportunidades e possibilidades de como e quando ela consegue entrar em uma conversa. “Mensuramos aderência ao tema, a receptividade do público, a sensação de estranheza causada por imagens 3D que se assemelham muito a uma pessoa real, e conseguimos entender o tom e os limites de uma persona virtual”, diz.
Para Alvin, do Magalu, essa ligação entre real e virtual precisa estar conectada com a estratégia e os objetivos da construção do personagem. “Se a estratégia for autêntica, transparente e consistente, a comunidade não terá problema com isso. A comunidade da Lu entra na brincadeira, se envolve com as histórias e se engaja ao ver que ela possui algum tipo de relação com influenciadores e celebridades”, exemplifica.
Se de um lado a humanização aproxima o público positivamente, por outro o assédio cibernético, que afeta meninas e mulheres reais, também é um problema para avatares. Paula explica que a marca está decidida a combater e estimular uma transformação positiva. “Temos uma grande consciência do papel social que exercemos na promoção do respeito e a Nat é porta-voz da nossa essência e valores no Twitter. Já participamos de ações para o combate desse assédio e temos uma relação próxima com a equipe da plataforma para encontrar caminhos de manter diálogos saudáveis na rede”, conta.
No Magalu, não é diferente. A Lu representa causas como a bandeira pró-mulheres e é reconhecida por ser uma ativista do combate à violência. Ao receber cantadas e mensagens de assédio, ela se posiciona e pede respeito de forma incisiva.
Juntos e misturados
O trabalho em parceria entre avatares também ganha espaço nas estratégias, geralmente em prol de causas que possam gerar impacto positivo no mundo. Natura e Magalu mesmo se uniram no começo de 2020 em uma ação com a Unesco sobre assédio às personas virtuais.
Mas parcerias que não tenham causas envolvidas também são bem-vindas. A Via Varejo já tem projetos do CB interagir com outros personagens e marcas, e no Magalu a Lu já fez viagens, cobertura de eventos e até já participou de campanhas publicitárias. Os critérios são os mesmos: fazer sentido para a narrativa da personagem e para a estratégia.
Na visão de Alvin, seja qual for o caminho dentro do vasto campo de atuação de avatar, o fundamental é garantir a autenticidade do personagem e que ele não perca a sua identidade com o público e comunidade que conquistou. “Esse ano surgiram muitos avatares 3D dentro de marcas no Brasil. Por sermos os pioneiros e um dos cases globais no tema, sabemos que Avatares 3D são commodities. Mas ganhar a confiança e a credibilidade do público requer uma construção de marca e relacionamento que não é feita do dia para noite. A Lu continuará evoluindo, mas garantindo que a sua história e narrativa continuem consistentes e ela não perca a sua identidade e conexão com a sua comunidade”, detalha.
Por outro lado
Entre as empresas que não querem abrir essa porta está a Vivo, que não tem avatares. “Entendemos que este não é o caminho que queremos seguir na nossa estratégia”, resume Fabricio Bindi, diretor customer insights & IA da empresa. Desde 2018, a companhia tem a inteligência artificial Aura, que é “mais do que um Bot ou um avatar. É um complexo sistema de inteligência artificial que se propõe a ir além de esclarecer dúvidas”, explica.
A Aura não tem gênero, não tem rosto e não se traduz em uma persona. É um nome usado globalmente pelo Grupo Telefónica em todas as operações onde ela foi lançada. O nome está relacionado ao conceito da “aura” de cada indivíduo. “A ideia é que o nome Aura se traduza como aquela que está sempre com cada indivíduo para ajudá-lo, de forma personalizada, de acordo com o seu contexto e necessidades”, esclarece.
Desde seu lançamento, a Aura evolui para ser o canal mais avançado e relevante de interação com os clientes da empresa, respondendo sobre serviços, consumo de dados, conta, recarga e outras dúvidas com “mais de 90% de precisão”. Já foram cerca de 400 milhões de interações nos mais de 20 canais de atendimento da Vivo e de parceiros (WhatsApp, app Meu Vivo, call center e Facebook Messenger, entre outros). Ainda de acordo com Bindi, ela entende, inclusive, sotaques e regionalismos (por exemplo, sabe que ‘boleta’ é sinônimo de ‘fatura’ no Sul do país) e faz contato de forma proativa para agendar e confirmar visitas técnicas para instalação e reparo de serviços de banda larga e TV por assinatura, por exemplo. “Nos últimos meses, a importância da Aura ficou ainda mais evidente. Durante o isolamento social, os clientes continuavam precisando obter segunda via de conta, saber sobre o consumo de internet, solicitar visitas técnicas etc., além dos canais digitais. O nosso app Meu Vivo e a Aura mostraram-se a alternativa para solucionar essas situações do dia a dia”, conta.
Com a Aura, a Vivo não tem a intenção de simular o atendimento de uma pessoa, mas afirma que é comum clientes interagirem como se ela fosse um atendente humano. “Muitos, inclusive, agradecem à Aura ao final do atendimento. Por isso, sabemos que ela está atingindo seu objetivo: facilitar o atendimento do cliente, trazendo praticidade e um atendimento humanizado.”