Avon e Thompson discutem estratégias para incluir negras nas lideranças

Lideranças femininas se reúnem na Wunderman Thompson. Da esquerda para a direita: Adriana Barbosa, CEO da PretaHub; Lia Vainer, doutora pelo Instituto de Psicologia da USP; Raphaella Martins, content business solution executive da Rede Globo; Helena Bertho, communications manager na Coca-Cola Company; Danielle Bibas, VP de marketing da Avon; Jackqueline Busnello, gerente responsável por diversidade e inclusão no Bradesco; Andrea Assef, diretora de marketing da agência; Christiane Silva Pinto, gerente de marketing do Google Brasil; Mafoane Odara, gerente do Instituto Avon e Patrícia Santos, sócia-fundadora da Empregueafro (Créditos: Leonardo Rodrigues)

A Avon e a Wunderman Thompson reuniram grandes lideranças femininas durante evento ocorrido na própria agência na última quinta-feira (26). O objetivo foi falar sobre estratégias efetivas para aumentar a presença de mulheres negras em cargos de liderança no mundo corporativo.

A reunião começou com a abertura de Andrea Assef, diretora de marketing da agência. A profissional mencionou a importância do espaço em que o encontro ocorreu, já que foi ali que o Programa de Equidade Racial 20/20 nasceu. Na sequência, Danielle Bibas, VP de marketing da Avon, falou rapidamente sobre a iniciativa. “Estou aqui, como qualquer um de vocês, para aprender”, disse ressaltando que o evento surgiu após a indagação: por que ainda há tão poucas mulheres negras nas lideranças?

A primeira a falar foi Mafoane Odara, gerente do Instituto Avon, que fez uma breve apresentação do evento e explicou a dinâmica do primeiro painel. Na sequência, Lia Vainer Schucman deu uma pequena “aula” aos presentes. A profissional é doutora pelo Instituto de Psicologia da USP e autora da tese “Entre o ‘encardido’, o ‘branco’ e o ‘branquíssimo’: raça, hierarquia e poder na construção da branquitude paulistana”.

Para a acadêmica, há alguns fatores para que a mudança aconteça. Um deles é começar a encarar a história do país. “Sabiam que pra cada 10 anos de Brasil, a gente teve sete de escravidão?”, questiona. A professora mencionou a importância de entender o racismo estrutural para combater o problema. “Não há uma sociedade boa para brancos com o racismo estrutural”, reitera.

Além disso, é necessário estudar conceitos como o letramento racial. Em suma, ele diz para que haja uma real desconstrução do racismo é preciso que as pessoas brancas reconheçam sua branquitude; que a população entenda que o racismo é um problema atual e não um legado; que os cidadãos assumam que identidades raciais são aprendidas; adicionem o racismo ao vocabulário e interpretem códigos e práticas racializadas.

“No passado, crianças brancas ganhavam crianças negras de presente para brincar e castigar”, relembra a doutora ressaltando a importância de se estudar os fatos históricos recentes, afinal, a Lei Áurea foi sancionada em 13 de maio de 1888, há apenas 131 anos. Historicamente, é um período curto.

Patrícia Santos de Jesus, sócia-fundadora da Empregueafro, também participou do primeiro painel do dia. A profissional atuava em RH e resolveu criar a consultoria focada em diversidade racial. Para ela, é preciso ser didático e explicar aos empresários a importância econômica de envolver negros em seus negócios. “A gente já sabe que quer estar lá. Mas eles não sabem porque tem de contratar a gente”, elucida.

Citando um estudo do Instituto Ethos, que diz que negras são apenas 1,6% em cargos de gerência e 0,4% em executivos, Patrícia afirma que é preciso que negros e brancos andem juntos para mudar tal realidade. “As outras pessoas brancas dão mais ouvidos a pessoas brancas”, conta em tom de lamento, mas destacando que por isso é importante um trabalho conjunto.

O segundo painel contou com a mediação de Adriana Barbosa, CEO da PretaHub e presidente da Feira Preta. A primeira a falar foi Jackqueline Busnello, gerente responsável por diversidade e inclusão no Bradesco. Ela destacou que a empresa, fundada em 1943, já nasceu com uma premissa de inclusão. O banco queria “abrir as portas para pessoas com poucas posses”, algo incomum à época.

Helena Bertho, communications manager na Coca-Cola Company, explica que a empresa adota filosofia do “ser, fazer e dizer” quando o assunto é diversidade. “Primeiro você precisa pensar qual sua essência, seu propósito como marca. Depois a gente faz. Isso norteia o trabalho. E depois temos uma história pra contar”, explica. Seguindo essa premissa, marcas podem evitar cair naquela classificação de empresas que estão usando o tema da inclusão só porque está na moda.

Para Helena, a presença de negras e negros não é só sobre ter um número, “mas sobre refletir o mercado”. “Se nosso negócio é pra todo mundo, ele precisa ser feito por todo mundo”, afirma.

Gerente de marketing do Google Brasil, Christiane Silva Pinto também relatou alguns dos esforços da gigante da tecnologia para incluir negras no quadro de colaboradores e, consequentemente, líderes.

Uma das principais iniciativas é o AfroGooglers, projeto que já tem cinco anos. Trata-se de um comitê de conscientização e celebração da causa racial do Google Brasil. “O número de pessoas negras nesses anos de atuação aumentou mais de 20 vezes. Sou muito orgulhosa de falar que tem um dedo meu em cada uma dessas contratações”, celebra.

Christiane lembra um ponto importante: profissionais negros e, principalmente, as mulheres negras possuem backgrounds que necessitam de atenção. “Lembrem que essas pessoas que vocês estão contratando não são só mais um número. Elas vêm com histórias”, alerta.

Outro ponto de atenção: o mesmo background, muitas vezes, elimina os candidatos de pele escura. “Quando a gente pede inglês, 99% dos negros já estão fora”, explica complementando que o Google fez uma bolsa em parceria com a Ebony English para eliminar tal exigência e auxiliar os jovens profissionais.

Para Raphaella Martins, content business solution executive da Rede Globo e ex-funcionária da Thompson, a desconstrução do racismo estrutural inclui decisões essenciais. “Vai contratar um fornecedor e ele não é diverso? Não contrate”, resume.

“Temos um contexto que está impactando negativamente a todos nós. Não só os negros”, alerta.

A mediadora Adriana finalizou dizendo que é preciso transcender da resistência para uma questão de bem viver. “Uma das pautas da juventude negra está no bem-estar”, explica. “Quando pensarmos em diversidade, precisamos pensar na transversalidade do tema. Não adianta uma empresa falar ‘eu sou diversa’ e contratar uma agência racista”, finaliza.

Lideranças da Wunderman Thompson, como Pedro Reiss, CEO, e Ezra Geld, chief strategy officer, também estavam presentes como ouvintes.