Branded Content tem cara de Hollywood
No ano passado, Arício Fortes e Paulo Coelho, então na Pereira & O’Dell (agência americana que faz parte do brasileiro Grupo ABC), conquistaram um Leão de ouro na estreante área de Branded Content & Entertainment Lions, em Cannes, com o ousado “Snoop Dogg smokable book”, para o rapper Snoop Dogg. O case consistia em um livro escrito pelo próprio artista – famoso ativista da causa da maconha –, com sua letra, onde as folhas poderiam ser arrancadas e fumadas. Esse é só um, entre inúmeros trabalhos, onde o entretenimento pode ser utilizado a favor das marcas. Uma área que, segundo Fortes, hoje diretor de criação da Africa e jurado brasileiro de Branded Content no Cannes Lions 2013, cada vez mais ganha espaço, com os anunciantes buscando proporcionar entretenimento aos consumidores. “O Branded Content é menos Madison e mais Hollywood”, diz, comparando a famosa rua de Nova York, onde estão instaladas boa parte das grandes agências da publicidade tradicional, com a meca da indústria do cinema mundial.
Hollywood
“Uma área que a cada dia que passa ganha mais espaço. Não só lá fora – e eu presenciei isso bem lá em São Francisco, onde estava antes de vir para a Africa –, onde realmente existe uma demanda forte nesse sentido, mas aqui no Brasil também. Tenho presenciado nessa minha breve estada de seis meses que os anunciantes já se interessam mais no assunto e é uma baita oportunidade das marcas conversarem com as pessoas. É uma forma diferente de se comunicar. O branded content é menos Madison Avenue e mais Hollywood. E fala com as pessoas em um momento em que elas estão descontraídas, quando é possível levar mensagens mais completas, com coisas mais envolventes, já que existe um tempo maior para isso. A secundagem é livre, diferente do break comercial.”
TV por assinatura
“O Brasil terá uma grande oportunidade de se aprimorar na área com essa nova lei que garante uma reserva de mercado para o conteúdo nacional da TV por assinatura (a ‘Lei da TV Paga’, que irá gerar uma demanda de 1.070 horas anuais de conteúdos nacionais e independentes inéditos). Quando estava para ser aprovada, já era visível o interesse de profissionais de várias áreas para fazer algo relevante nesse sentido. É uma grande oportunidade para as marcas se juntarem com agências e produtoras, colocarem a coisa para rodar e tentarem fazer algo além da propaganda tradicional – ressaltando, obviamente, que não tenho nada contra a publicidade no formato como está no Brasil, que é ótima, funciona e é o que eu faço também no dia a dia aqui na agência. A questão é outra: o branded content é algo novo, e quem enxergá-lo como uma ferramenta eficiente pode sair na frente dos outros.”
Chances em Cannes
“Os dois Leões que o Brasil teve no ano passado não significam que iremos repetir essa performance, ou melhorá-la. 2012 foi um ano de experimentação, por ser a estreia da área. A tendência para este ano é a categoria como um todo começar a se consolidar e termos uma visão mais clara do que será de agora em diante. Com isso, acho que todos que inscreverem trabalhos que se enquadrem em Branded Content, e, dentro disso, se encaixem nas diversas subcategorias que existem dentro da área, terão chances de disputar prêmios.”
Favoritos
“Como eu disse, é uma área nova, não me sinto à vontade para apontar favoritos. Mas é claro que os Estados Unidos largam na frente. É comum as agências receberem, diariamente, pedidos de trabalhos que saiam do convencional. É uma rotina, não exceção. Na Pereira & O’Dell fizemos vários projetos assim e eram coisas que os anunciantes já pediam na largada, não como complemento de uma campanha. Lógico que os americanos fazem muita coisa ruim também. Mas é normal, já que o volume é muito grande. Outra vantagem dos americanos é que eles produzem muito bem. Não que o resto do mundo também não tenha uma excelente produção, mas é o que eu disse anteriormente: branded content é Hollywood!”
Custos
“Os grandes projetos da área exigem sim um bom dinheiro gasto com produção. Na Pereira & O’Dell era clara a inversão, onde se aplicava mais dinheiro em produção e menos em mídia. Parte-se do seguinte princípio: se o conteúdo for legal, ele irá se espalhar e terá mídia espontânea – ao contrário do Brasil, até pelo nosso modelo de publicidade. Mas não acho que esse modelo atrapalha a criação de bons projetos de branded content. É possível, inclusive, fazer trabalhos bacanas na área na TV aberta, com as novelas, séries e outras atrações. Além da internet e da TV paga, como falamos anteriormente. A Africa Rio, que tem um pouco mais de um ano e meio, já é uma das maiores agências do mercado carioca e é focada em product placement. Já fizemos grandes projetos para Itaú, P&G, Grendene e outros anunciantes. Espero que em breve a gente possa fazer mais coisas relacionadas à área, que os anunciantes cobrem pelos projetos. É bom para todo o mercado, uma questão de amadurecimento. Fora isso, é divertido. São trabalhos mais soltos, com mais liberdade ainda para colocar as ideias em prática.”
Ideia x Produção
“Tem que ter os dois. Para ganhar um Leão em Cannes, por exemplo, a ideia tem que ser muito boa. É fundamental. Ainda mais em branded: quando você vem da propaganda e vai julgar trabalhos de entretenimento, percebe que a largada é por cima. Você vê ao mesmo tempo uma campanha que custou milhões de dólares de uma AT&T, trabalhos dirigidos por grandes cineastas e coisas menores. Então, a ideia tem que pesar no critério de avaliação. Mas lógico que a produção é muito importante. Quando se fala em entretenimento, as pessoas já lembram de filmes de Ridley Scott, de megaproduções. Então é necessário um mix entre esses dois elementos. E o buraco é mais embaixo. Às vezes eu via, lá nos EUA, que as marcas tinham boas ideias, mas os redatores das agências não eram especialistas em escrever scripts de cinema. Então se contratava um roteirista que desenvolvia o projeto junto com os criativos, o que eu acho justo. É bem diferente fazer uma minissérie de um produto e um filme de 30 segundos.”
Snoop Dogg
“Ele ganhou por dois motivos. Primeiro pela rebeldia, ao trazer um assunto controverso: a maconha. E não era a ‘rebeldia pela rebeldia’. Quem embasava o trabalho era o Snoop Dogg, um dos maiores rappers da história. Quando juntamos um trabalho em que as folhas de um livro poderiam ser destacadas para embalar o fumo, com a chancela de um dos grandes astros pop da atualidade – e também o maior ativista da maconha no showbizz –, isso tudo gerou uma mídia espontânea muito grande. A própria turma do Snoop veio dizer que o livro que criamos para ele teve repercussão tão grande quanto o lançamento de um álbum. O que fez com que se tornasse matéria da MTV, Time, The Washington Post e inúmeros outros veículos relevantes. Até em um programa matinal da ABC, que é uma espécie de mesa-redonda, foram levadas pessoas para falar sobre a maconha a partir desse projeto. E sem falar que a ideia é muito legal. Os fãs do Snoop Dogg e as pessoas que gostam de cultura pop em geral se identificaram.”
Júri
“Ainda não falei com as pessoas, mas em geral acredito que todos os júris do Cannes Lions deste ano serão bem maduros e irão gerar grandes discussões e debates acerca da relevância do que funciona na comunicação, o que pode ser melhor. Espero encontrar também coisas bacanas fora dos Estados Unidos e Inglaterra, ver trabalhos que me encantem de outros lugares do mundo. E do Brasil, claro.”
Inscrições
“No site de Cannes, quando você vai esmiuçar as categorias, estão bem detalhadas todas as subcategorias. Se ainda existem problemas de inscrições por parte das agências brasileiras ou de qualquer outra parte do mundo, a culpa é de quem inscreve. Tudo está bem claro. E algumas pessoas precisam entender que as categorias têm fatores diferentes umas das outras, elementos diferentes para dar um Leão. Caso contrário, seria uma coisa só.”
Preparação
“Venho lendo bastante sobre o assunto, vendo trabalhos do mundo inteiro e pretendo, em breve, conversar com meus colegas de júri, com o presidente, para saber o que ele busca, quais os principais critérios que irá adotar. Também quero conversar com as agências brasileiras. Estou 100% aberto a quem quiser me procurar e conversar sobre branded content.”
Escape
“Realmente é uma época de muito trabalho. Além de Cannes, há o dia a dia de uma das maiores agências de publicidade do país, onde temos que gerar resultados. Minha válvula de escape para essa correria é minha família, meu cachorro, viagens, jogar tênis, comer bem, ler.”