Brasil Kirin, dona da Schin, prepara novas estratégias para as marcas
Douglas Costa, vice-presidente de marketing da Brasil Kirin
Tradicional fabricante de bebidas brasileira, há quatro anos a Schincariol foi comprada por empresa japonesa e mudou o nome para Brasil Kirin. A partir daí, a companhia, que hoje é a terceira maior cervejaria do país em vendas, com 8% de participação de mercado, passou por processo de profissionalização e tem revisto as estratégias para valorizar mais o próprio portfólio. Entre outros pontos, Douglas Costa, vice-presidente de marketing da empresa, afirma nesta entrevista que todos os produtos devem passar por redirecionamento que prevê a regionalização para aumentar a presença em todas as áreas do Brasil.
Como é a relação com os executivos japoneses da Kirin?
O Japão monitora os resultados da companhia, mas eles dão liberdade para os executivos do Brasil. Existem algumas diretrizes que não são muito rígidas porque eles entendem que o mercado brasileiro é específico. Apesar de a Kirin ter uma atuação mundial, eles deixam as estratégias e a direção do negócio para quem está aqui no dia a dia.
Qual é a parte do negócio mais difícil de os donos japoneses entenderem?
Existe uma diferença cultural e, principalmente, questões de legislação e tributos que ainda exigem uma profundidade maior para compreender bem. No entanto, temos atendido às expectativas deles. É um ano de mudanças, que estamos aproveitando para estruturar melhor a companhia de acordo com o cenário previsto daqui para frente.
Este ano a Brasil Kirin lançou uma campanha institucional da companhia, algo pouco comum no mercado de bebidas. Qual é o objetivo?
Vínhamos de uma longa jornada da Schincariol como empresa familiar e nos tornamos companhia profissionalizada e multinacional. A estratégia de falar do institucional é para marcar efetivamente a mudança. Mostrar que um grande grupo internacional é quem está à frente dos negócios das nossas marcas agora. Além disso, destacar que somos uma empresa de bebidas em geral, não somente de cerveja. Por último, mas não menos importante, mostrar aos pontos de venda que as marcas que eles conhecem separadamente pertencem à mesma empresa. É a assinatura dos serviços que oferecemos. Era importante realizar esse trabalho para fazer com que acionistas, autoridades e clientes tivessem entendimento sobre o que é a Brasil Kirin.
Fora as cervejas, quais os outros produtos mais relevantes do portfólio?
É um portfólio extenso, com produtos que têm força em cada região do país. Hoje, 37% do volume de produção está em não alcoólicos, o restante em cerveja. Entre os não alcoólicos, o carro-chefe são os refrigerantes, com a marca Viva Schin como a principal e de maior distribuição. Depois, temos a linha de águas, com e sem gás. Em seguida o suco Fruthos, o energético Ecco e o Fibz, um refrigerante com fibras produzido com uma tecnologia que trouxemos do Japão, lançado há pouco mais de um ano no Brasil. Além desses, temos a Itubaína, que existe há bastante tempo e nós resgatamos dando uma repaginada no produto, criando uma identidade retrô. De certa maneira, a Itubaína acaba, inclusive, sendo um sinônimo da categoria de refrigerantes de tutti-frutti. Para os mais velhos, remete à infância e aos bons momentos. Para os mais jovens, conquista pela identidade visual.
Como você avalia o digital nas estratégias de marketing da companhia?
Nós ainda temos uma atuação importante na mídia tradicional, principalmente com a cerveja Schin e o refrigerante Viva Schin, que são as marcas mainstream da empresa, mas o digital vem ganhando relevância. Hoje, o digital está sempre presente na estratégia 360 graus de cada um dos produtos. Dependendo da marca, do público e da classe social, há uma participação maior ou menor do digital. Já podemos considerar que, no caso das cervejas especiais, por exemplo, é possível ir muito para o digital com ações mais focadas do que para as mídias de massa. Tem muita informação que a gente leva do espaço real para o espaço digital por meio dos eventos, fazendo ativações nas redes sociais.
É possível medir resultados concretos no digital ou você utiliza apenas para fazer branding?
Geralmente a gente utiliza as redes sociais mais como branding. Mas também é possível medir resultados por meio de promoções. Atualmente você estimula a pessoa na mídia de massa justamente para levar para o digital, onde ele faz o cadastro. Nesses momentos é que a gente consegue mensurar. As redes sociais acabam sendo um meio para medir a comunicação de massa, pois, quando se veicula um filme, você obtém o retorno pela internet. Para os marqueteiros, acaba sendo uma forma de mensuração importante, tanto em visualizações como em engajamento, algo que até hoje não é tão simples de se fazer na mídia de massa.
A empresa tem planos para vender cerveja pelo e-commerce?
Na verdade, acabamos de criar uma plataforma, que, além de souvenires interessantes para os nossos consumidores como bolsas térmicas, baldes e porta-cervejas que mantêm o produto gelado, vendemos a própria cerveja das nossas marcas especiais. O comportamento de consumo de cerveja está migrando bastante para o lar. A questão do consumo responsável, por exemplo, tem levado o movimento de se beber cerveja em casa com os amigos. Quando isso ocorre, a comodidade de ter um e-commerce é bastante grande. É algo que vem crescendo muito, inclusive pegando carona no próprio crescimento do e-commerce para todas as outras categorias de produtos.
Está se aproximando o verão. Qual a estratégia para enfrentar a forte concorrência do setor?
O grande arranque que a gente dá para este verão é a repaginação dos nossos principais produtos. Na verdade, para 2016, nós estamos revendo a estratégia em todas as marcas, mas ainda não posso revelar tudo. A questão é que, não só olhando para o verão especificamente, estamos remodelando algumas coisas. Primeiramente, a regionalização da nossa estratégia. Estamos olhando para os mercados de forma mais regional e identificando o potencial que temos em cada região do Brasil. Renovamos a cara da nossa linha de produtos. Para a Schin, por exemplo, rejuvenescemos os rótulos e as embalagens. Saímos do laranja e retomamos o branco, que é o código da categoria, e implantamos o sinal de joinha. Com a assinatura das campanhas “do jeito que o povo gosta”, estamos olhando muito para a classe C e assumindo, com muito orgulho, que a Schin é a cerveja do povo.
A comunicação das cervejas no verão costuma utilizar de maneira deselegante a imagem de mulheres bonitas. Podemos imaginar alguma mudança depois das manifestações contra essa prática nas redes sociais?
O universo cervejeiro é alegre e o público masculino ainda é muito presente. A presença da mulher na propaganda tem o intuito de abrilhantar, mas a gente foca muito mais na ideia e é nisso que nós vamos trabalhar daqui para frente. Vamos focar em mostrar o que significa a mensagem “do jeito que o povo gosta”. Nossa comunicação vai focar na mensagem e na ideia, que é o que valoriza.
Recentemente a Schin foi criticada por um comercial considerado ofensivo contra as mulheres de Santa Catarina…
No caso de Blumenau, foi uma comunicação focada para o Oktober Fest, em que fizemos uma brincadeira, mas o objetivo, de maneira alguma, foi botar a mulher como objeto de desejo. De qualquer maneira, acatando aos pedidos dos consumidores, alteramos a propaganda. Agora, uma coisa é verdade: as redes sociais funcionam como um termômetro do conteúdo da mensagem para saber se funciona ou não. É uma forma de a gente ter um feedback imediatamente caso uma determinada ação esteja infringindo algum código moral, racial ou mesmo sexual.
Qual é o briefing ideal para que as agências não criem campanhas que possam gerar novos constrangimentos?
A ideia é usar o humor sem colocar a mulher como figura de objeto, até porque elas são cada vez mais representativas no mercado cervejeiro. É uma linha tênue. O direcionamento é que a mensagem não poderá ofender nenhum público. Até pela mensagem atual da Schin, “do jeito que o povo gosta”, não posso segregar nenhum público. Obviamente é comum usar uma mulher bonita, ou mesmo um homem bonito, que a gente sempre escolhe porque isso representa qualidade, apesar de não ser algo percebido diretamente, mas reforço que o foco principal estará no conteúdo da mensagem e não especificamente na imagem de uma mulher ou uma figura única, até porque, no final das contas, acaba se tornando uma estratégia muito perigosa. Portanto, preferimos trabalhar de uma forma mais segura.
O que é mais importante para vender cerveja, propaganda ou uma boa estratégia no ponto de venda?
Entendo que seja 60% para a distribuição e 40% para a publicidade. O produto precisa estar bem distribuído e presente. A embalagem é outro fator importantíssimo, pois transmite a personalidade do produto, inclusive porque a embalagem muda o sabor do psicologicamente – não efetivamente. Portanto, o trabalho realizado no ponto de venda ainda é muito importante. Por exemplo, é fundamental que a cerveja esteja gelada. No ponto de venda é o consumidor sozinho com a marca. Já o papel da propaganda é criar, de forma lúdica, uma maneira de o consumidor se identificar com aquela marca. Saber qual mensagem queremos passar e como a gente quer que o consumidor se sinta quando consuma.
As cervejarias estão sempre entre os maiores anunciantes…
Comunicação tem papel relevante, mas, se o produto não estiver bem posicionado no ponto de venda, acaba sendo um desperdício de budget. Por outro lado, um produto estando bem posicionado no ponto de venda, com uma comunicação que pode até não ter um orçamento grande, desde que seja assertiva, oferece resultados melhores. Inclusive, existem muitas marcas regionais que fazem bem a construção de marca a partir do ponto de venda, que não usa quase nada de mídia, mas consegue estar presente no dia a dia das pessoas.
A Schin tem forte rejeição em São Paulo ao mesmo tempo que é líder no Nordeste. Qual o plano para a marca?
É potencializar onde a marca tem bom desempenho. Temos feito estudos para entender essa rejeição, porque muitas vezes isso está mais relacionado com a imagem do produto do que com a qualidade da cerveja em si. Em testes cegos nós não vemos essa rejeição. Mas o ponto central é que o Brasil tem dimensões continentais e cada região do país tem peculiaridades. Neste contexto, é normal que cada vez mais haja marcas com aceitação maior ou menor em algumas áreas. A própria líder de mercado tem marcas com desempenho alto em áreas focadas e nem aparece em outras. Em regiões onde a Schin não tem bom desempenho, a estratégia é atacar com outras marcas. Essa é a vantagem de ter um portfólio amplo.
Como anunciante, como você vê o modelo de remuneração da publicidade no Brasil, baseado no chamado BV (Bonificação por Volume)?
É um modelo que vem sendo bastante questionado, não é? Como cliente, nossa busca é sempre ter o menor custo ou como fazer mais com a mesma verba. O pagamento de BV acaba sendo uma relação muito mais entre agência e veículo. Acho que é um assunto que pode evoluir. Talvez não seja possível chegar ao modelo de mercados em que não há BV, mas acredito que seja necessário chegar a um meio- -termo com um modelo mais competitivo. A gente não gosta muito de se meter nessa relação, mas gostaríamos de ter um maior poder de compra quando falamos em mídia.