Caminho do mar
Nasci e vivi 27 anos da minha vida em São Paulo, quase todos eles na Vila Dalila, Zona Leste da cidade.
Em 2018, fui a passeio pela primeira vez para o Rio de Janeiro e o curioso é que, durante a viagem, um amigo me perguntou despretensiosamente: e aí, você moraria aqui? Olhei para a paisagem e era impossível dizer outra coisa - Sim, adoraria passar uns tempos neste lugar.
Corta a cena. Em 2019, pouco menos de um ano depois, recebo uma ligação do ex-diretor de criação, Rafael Conde, que me fez uma proposta para ir trabalhar com ele na Cidade Maravilhosa.
Confesso que, a princípio, não foi fácil pensar em sair da minha cidade, ficar longe dos meus familiares e amigos. Fiquei dias refletindo e a conversa acabou avançando. Decidi me mudar e estava certo de que seria uma experiência única e passageira, mas com algo eu não contava: que iria me apaixonar pela cidade e pelo seu estilo de vida.
Morar próximo ao mar, para quem passou boa parte da vida fazendo trajetos de mais de uma hora e meia de casa ao trabalho, foi um verdadeiro presente. São Paulo é incrível, mas também desgastante, principalmente quando é preciso pegar a linha vermelha do metrô abarrotada às 7h.
Colocar meu barquinho no mar e remar sentido a outro estado era uma mudança pessoal que fazia muito sentido também na profissional, pois na verdade eu estava exausto e mal sabia que precisava de novos ares e rumos. Apesar das grandes agências e estúdios estarem na capital paulista, nesse momento só fiz duas coisas: arrumar as malas e escutar meu coração.
E a grande verdade é que foi morando no Rio que eu pude colocar um portfólio na rua que foi bem recebido pelas pessoas.
Consegui mostrar um pouco da evolução do meu craft e a partir daí ter conversas ótimas e oportunidades que eu jamais imaginaria.
Foi uma grata surpresa ver profissionais que eu conhecia e admirava interessados em trabalhar comigo e isso reforça o meu pensamento de que, quando a gente está feliz, esse sentimento se expande para todos os aspectos da nossa vida.
Fiz um trabalho de introspecção, mergulhei para dentro de mim para entender o que realmente importava, quais eram as minhas prioridades, perdas e ganhos e quais os reflexos das minhas decisões.
Nem tudo se resume a dinheiro e a belos cargos no LinkedIn, e poder fazer essa nova escolha é honrar o meu compromisso de aproveitar ao máximo as oportunidades que a vida tem me dado.
O que você está disposto a abrir mão e o que é inegociável? Descobri que estar próximo ao mar e ter um modo de vida menos caótico é o que me realiza, bem diferente do que o neoliberalismo afirma, de que nós podemos ter tudo se de fato quisermos.
Essa afirmativa é totalmente ingênua em pensar que seria realmente possível ter tudo, sem abrir mão de absolutamente nada. O próprio apontar de uma direção carrega em si a recusa de outras tantas possibilidades.
Perdas sempre vão existir e o que é possível fazer é a análise dos benefícios e prejuízos para uma tomada de decisão muito mais coerente com aquilo que somos, assumindo todas as responsabilidades do que queremos e estamos buscando.
Estar ao lado do mar é encontrar espaço para o respiro. É valorizar o contraste. É enxergar linhas, formas e cores. É perceber os movimentos, ritmo e harmonia. É se encontrar em unidade com o todo. É escutar os ruídos.
Aprender seus dialetos. Aguçar a sensibilidade. É contemplar. Se isso não tem tudo a ver com o meu ofício diário, eu não sei o que poderia ser. E como já dizia Amyr Klink...
“O mar não é um obstáculo. É um caminho”.
Cezar Arai é designer lead da Magma